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Caetano Paulo com o “livro do poeta bigodudo” nas mãos | Arquivo pessoal
Caetano Paulo com o “livro do poeta bigodudo” nas mãos| Foto: Arquivo pessoal

Paulo Leminski completaria 70 anos hoje, 24 de agosto, ele que viveu apenas 44 anos e continua vivo como só.

Leminski não foi o escritor brasileiro precursor na construção duma lenda pessoal, como diz Paulo Coelho. Castro Alves, morrendo aos apenas 24 anos, já provocava admiração nacional pelo seu talento assombroso capaz até de vertiginosos improvisos em público. Olavo Bilac seria outro poeta a embasbacar conterrâneos e contemporâneos com sua poesia que, ora direis, hoje apenas vê estrelas. Drummond e Bandeira também ergueriam nomes legendários, sem ter consciência de que faziam isso com a preciosa embalagem da humildade e do recolhimento, que Dalton Trevisan adotou radicalmente.

Mas Leminski é quem projetou e praticou a arte de oferecer ao público o talento revestido com imagens e posturas simbólicas. Suas fotos revelam sempre um olhar atento ao fotógrafo, uma pose embutida na postura blasé, uma argúcia de detalhes, um charme desleixado, um caprichado relaxo. Se não tivesse talento, não se tornaria o poeta mais amado do Brasil hoje. Mas, se não cultivasse essa lenda pessoal, sua poesia não seria procurada por tanta gente. E tornou-se o maior best-seller de poesia em nossa história literária, igualando Augusto dos Anjos que, porém, levou 70 anos para vender o que Leminski, com Toda Poesia, vendeu em um ano, reabrindo canais editoriais para a poesia brasileira.

Além da imagem pública cultivada em fotos, o Polaco cultivou também a aura polissêmica, como ele gostaria de dizer, o brilho singular não só na poesia como nas traduções, na prosa, na crítica e na biografia. Sim, ele escreveu a própria biografia em vida, ao sempre ressaltar que era (na verdade, tinha sido) faixa-preta de judô, professor de cursinho, poliglota e polemista. Dizia para quem quisesse ouvir:

– Tenho inveja desses escritores que foram motorista de caminhão, garçom, lavador de pratos etc e tal!

Bem, Paulo, você conseguiu. Uma vez você me disse que tinha inveja de mim porque meus livros juvenis, já naqueles anos 80, vendiam tanto que passei a viver de literatura. Agora, tenho inveja de você não só por ter se tornado best-seller, mas por ver que até meu neto, de sete anos, está lendo Paulo Leminski! Aí está o Caetano, Paulo, na cama antes de dormir, com Toda Poesia nas mãos.

Minha filha Analu leu para ele uns poemas teus, em vez dos usuais livros infantis. E ele, como sempre, dormiu ouvindo. Na noite seguinte, ela pegou um livro infantil e ele falou "não, mãe, quero o livro das poesias". E agora toda noite ele quer... o livro do poeta bigodudo! E me perguntou outro dia:

– É verdade, vô, que você foi amigo dele?

Falei que sim, e ele ficou olhando tua foto de quimono, aí sussurrou:

– Mas ele era meio esquisito, né, pai?

Falei que não, que você era inteiro esquisito. Ele riu e perguntou porque eu estava chorando. Falei que era porque uma pedra tinha me entrado nos olhos.

– Uma pedra, vô?

É, Paulo, a pedra da saudade. E ficamos todos aqui, parananaenses com sotaque polaquês ou pé-vermelho, com orgulho de você, nosso moleque setentão.

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