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Estamos com três netos na chácara: Caetano, orgulhoso de mais um dente bambeando, Pietro, que veio dos Estados Unidos contando que o avião é tão grande que dá p-ra correr no corredor, e Lucca, que veio de São Paulo e diz que o avião tem bala, bolo e bola (uma bolinha de chocolate).

Tomam o café da manhã e já vão para o quintal, fazer casinha de tijolos, trepar em árvores, chupar jaboticaba no pé, enfiar graveto em formigueiro, infernizar caramujo, todas essas coisas fascinantes quando a gente tem menos anos que os dedos das mãos.

No meio da manhã, tomam suco escorrendo pelos cantos da boca, tal a ânsia de voltar logo a brincar. No almoço, mostram que já viraram moços, comendo de tudo, menos, claro, cebola e chuchu, mas eu digo que tudo terá seu tempo e eles fazem cara de nojo: cebola, jamais!

Passam a tarde brincando incansavelmente, até Dalva intimar para o banho. A água morna relaxa tanto que jantam com as colheres pesadas de cansaço, escovam os dentes com as escovas mais cansadas ainda, aí Dalva chama para a historinha na cama, com abajur na cabeceira, eles com os olhos piscando de imaginação.

Mesmo bocejando, pedem mais uma história, mais outra e outra, então desligo o abajur, revolta geral. Digo que é para lembrar minha Tia Ana, que apagava a luz para a gente ver no escuro. No escuro não dá pra ver, diz Caetano, e eu digo que só no escuro vemos direito as estrelas, cintilando ali na janela. Eles olham, olham, até Pietro dizer que estrela não tem graça. Mas já-já vai subir a lua, digo, e Lucca diz que a lua também não tem graça.

Bem, retruco, só no escuro podemos ver as fadas e os fantasmas. Caetano pergunta cadê as fadas, Pietro choraminga que não quer fantasmas, Lucca mata a charada:

– O vô quer fazer a gente dormir...

Revolta geral. Caetano garante que não vai dormir, Pietro diz que também não, e Lucca radicaliza:

– Eu nunca mais vou dormir!

Que bom, digo, uma vez existiu um menino que disse que nunca mais ia dormir, e ficou olhando pela janela do quarto as estrelas, viu como elas piscam, perguntou por que, elas disseram ué, nós piscamos pra você. E a lua levantou, tão clara e bonita que o menino perguntou porque você é bonita assim, lua, e ela respondeu sou bonita pra você, ué.

Mas, continuou a lua, no escuro é que você me vê melhor, e vê também o luar, que é a luz do meu olhar. Olha lá o luar prateando as folhas do coqueiro, está vendo?

Ninguém responde. Apenas se ouve um coro suave de três meninos e uma fada ressonando, porque Dalva também dormiu. Saio pisando macio, para não pisar em nenhum brinquedo, e no terraço agradeço a graça de viver neste planeta e ter netos para continuar esta viagem entre lua e estrelas.

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