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Gal Costa gravou uma canção dele em seu último CD, "Hoje". Maria Rita também se interessou por suas composições, e uma delas quase entrou no seu recém-lançado "Segundo". Caetano Veloso é outro que ouviu e gostou. Lenine é fã e amigo. Comenta-se que Ana Carolina e Maria Bethânia já encomendaram músicas dele. Ao lado de um excelente CD de estréia, lançado em 2004, estas são as credenciais do cantor e compositor pernambucano Junio Barreto - que faz show no Rio de Janeiro, neste sábado, junto com Mombojó e Sebosos Postizos. Aos 41 anos, mais de 20 de carreira, o artista começa a chamar a atenção de estrelas da MPB e se consolida como uma espécie de "novo xodó" com seu estilo personalíssimo, uma espécie de samba pós-mangue bit. Ou, como ele prefere, simplesmente música brasileira.

- Quando estou gravando, penso "vamos botar um pianinho aqui, um moog ali". Mas o que faço é música brasileira - diz. - A música brasileira sempre foi assim, cada um acrescenta uma coisa, mas ela continua com sua essência. Pixinguinha veio com seus sopros, sua orquestração, a bossa nova trouxe as informações do jazz, a tropicália adicionou a guitarra e por aí vai.

Gal conheceu o trabalho de Barreto quando pesquisava o repertório para "Hoje", calcado em compositores novos. Já Maria Rita chegou a ele por meio de Lenine, produtor de "Segundo". Ambas escolheram a mesma música, "Santana", e, por isso, Maria Rita acabou não gravando. O músico arrisca uma explicação para o interesse das cantoras em suas composições.

- É difícil falar disso, mas acredito que minha música tem algo que elas procuravam, uma delicadeza e, sobretudo, o cuidado com a palavra - explica. - A palavra é fundamental para mim. Às vezes gosto de uma palavra e faço uma música a partir dela. Cada uma delas tem um ritmo, um significado e uma beleza própria. Passo seis meses fazendo uma letra, leio uns dez livros para concluir uma canção. A inspiração pode vir num instante, mas depois vem muito trabalho. Acho que falta isso na música brasileira, quem escreve lê muito pouco.

Não por acaso, Barreto lista escritores como suas principais influências. Entre eles, Guimarães Rosa, Vladimir Nabokov, Manoel de Barros e William Faulkner. Mas nomes como Patativa do Assaré e Luiz Gonzaga também são referências, apesar de atuarem em outro universo.

- Não sei o quanto eles liam para escrever. Mas eles tinham uma proximidade com algo que nós, na cidade, perdemos.

Nascido em Caruaru, o músico começou a carreira com a banda gótica Uzzo, no início dos anos 80. Segundo ele, faltava uma "identidade nacional" no grupo. A partir do nascimento do mangue bit, que ele viu de perto quando morava em Recife, passou a prestar mais atenção na música brasileira.

- Chico Science retomou essa referência brasileira nos anos 90. A década de 80 foi terrível nesse sentido. O Paralamas trazia algo dessas informações, mas era só - avalia. - Ali eu voltei a respeitar nossa música. Eu tinha uma relação esquisita com o Brasil, porque meu pai era comunista, tinha sido preso na ditadura. Eu sentia uma certa vergonha do país.

Hoje, ele vê com bons olhos o que se produz no cenário nacional, listando nomes como Black Alien, BNegão, Otto, Pedro Luis, Lula Queiroga, Lenine e Vanessa da Matta. Sem contar a novíssima geração:

- É maravilhosa, com artistas como Mombojó, Los Hermanos e Cidadão Instigado buscando uma identidade brasileira.

Em dezembro, o músico entra em estúdio para preparar seu segundo CD, ainda sem gravadora - um contrato com a Trama chegou a ser anunciado na imprensa, mas ele conta que não passou de boato. Nos palcos de São Paulo, onde mora há sete anos, o artista não pára de se apresentar, em casas como o Blen Blen. No Rio, a oportunidade de vê-lo em ação é rara - depois do show do Circo Voador, ele deve voltar apenas em janeiro.

Assim, Barreto segue construindo sua carreira, sem se deixar empolgar pela badalação em torno do "novo xodó da MPB".

- Esse tipo de reconhecimento é algo muito carinhoso, mas significa pouco para quem faz música. Tenho que trabalhar se quiser algo de verdade.

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