Jack Torrance (Jack Nicholson): aparições enlouquecem escritor| Foto: Divulgação
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Forças sobrenaturais manifestadas em forma de um documentário – que vem devorando prêmios nesta temporada pré-Oscar – estão fazendo Hollywood descobrir segredos e teorias conspiratórias acerca de um dos filmes mais cultuados da história do horror: O Iluminado (The Shining, 1980), de Stanley Kubrick (1928-1999). Recém-lançado nos EUA, sem data de estreia no Brasil, Room 237, de Rodney Ascher, vem causando sensação ao garimpar interpretações filosóficas sobre a adaptação do romance homônimo publicado por Stephen King em 1977. E para chegar a teses como a de que o longa-metragem estrelado por Jack Nicholson seria uma metáfora para o Holocausto, Ascher provou serem verdades histórias folclóricas de bastidores de filmagem. Entre elas estão um incêndio que teria sido causado pela alta temperatura dos refletores e a opção de Kubrick por exibir Eraserhead, de David Lynch, aos atores, para fazer o elenco entender (e incorporar) o mal.

"Existem relatos de que o local das filmagens (os estúdios Elstree, em Borehamwood, na Inglaterra) ficou sob o efeito de energias ocultas, despertadas pelo tema fantasmagórico do longa, que demorou quase um ano para sair do papel devido ao cuidado de Kubrick. O fogo que atingiu uma das alas do set, sem causa comprovada, é um dos indícios do mistério na filmagem", diz Rodney.

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Conta-se, por exemplo, que, antes de Kubrick fechar com Nicholson, os produtores ofereceram o roteiro a Robert De Niro, que disse não após ser acometido por uma série de pesadelos nas noites em que leu o roteiro. Técnicos convocados por Kubrick para a produção de US$ 19 milhões (cuja bilheteria nos EUA chegou a US$ 44 milhões) falam de vultos que apareciam nos espelhos distribuídos pelo cenário. Causos assim hoje espalham-se pela internet, indo desde portais especializados como o Metacritic a sites pipoca como Hugo Nebula, passando pelo jornal The Guardian, fazendo as supostas maldições de O Iluminado ultrapassarem as lendas urbanas em torno de filmes também rodeados de mitos, como O Exorcista (1973). Ascher tentou ir além delas em Room 237, cujo título evoca um dos quartos do Overlook Hotel, onde a trama se passa. Lá, o escritor alcoólatra Jack Torrance (Nicholson) se instala com a mulher, Wendy (Shelley Duvall), e o filho paranormal, Danny (Danny Lloyd), e começa a ver aparições que o enlouquecem.

"Um dia, li uma teoria louca sobre O Iluminado e percebi o quanto um conjunto de imagens é capaz de gerar interpretações muito além do que os cineastas poderiam prever. No caso, estamos olhando para um filme que, ao lado de O Bebê de Rosemary e O Exorcista, modernizou os parâmetros do terror ao fazer uma abordagem realista do sobrenatural. Room 237 junta uma série de leituras psicanalíticas e sociais da história de Torrance", afirma Ascher, que não não quis ouvir King – o escritor é avesso ao longa de Kubrick, por considerá-lo distante de seu livro.

Room 237 levanta a hipótese de que, em O Iluminado, a cascata de sangue que brota de um elevador e a montanha de malas abandonadas pelos hóspedes seriam alusões veladas ao extermínio de judeus em mãos nazistas. Exibido em Cannes e Sundance, o documentário fala ainda que a imagem de uma lata com um índio no rótulo, focalizada várias vezes pela câmera, seria uma reflexão sobre o extermínio de tribos. Há também indícios de que o filme seria uma denúncia cifrada pelo próprio Kubrick de seu envolvimento no que teria sido a farsa armada por Hollywood do pouso da Apolo 11 na Lua em 1969 (quando o homem pisou pela primeira vez no satélite terrestre e que para alguns nunca aconteceu). Ascher só não apurou o envolvimento do diretor brasileiro Nelson Pereira dos Santos no projeto. Em 1980, Kubrick chamou Nelson, que à época lecionava nos EUA, para dirigir a dublagem do longa para o português. O diretor de Vidas Secas pôs Allan Lima para fazer a voz de Nicholson e Betina Vianny para dublar Shelley.

"Falávamo-nos por telefone, e ele me proibiu de aliviar os palavrões e palavras fortes na dublagem", lembra Nelson. "Kubrick sabia que o texto tinha uma força única, que deveria ser preservada se vertida a outras línguas. E, embora ele tivesse fama de severo, comigo sempre foi um cavalheiro."