Para conseguir retomar projetos ousados feitos no passado, o Guaíra necessita pelo menos do dobro de dinheiro que recebe hoje do estado| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo
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A maior parte da produção cultural brasileira que merece ser vista sobre um palco, os paranaenses viram no Guaíra. A preparação de bailarinos, de atores e de músicos do estado, passa pelo Guaíra. A formação de plateia para a música clássica e para a ópera sempre dependeu do Guaíra. O espaço cultural mais importante e tradicional do estado está às vésperas de celebrar algumas datas importantes: em 2014 se verá os aniversários de 130 anos do Theatro São Teodoro, embrião do espaço atual; 60 anos do Guairinha (Auditório Salvador de Ferrante) e 40 anos do Guairão (Auditório Bento Munhoz da Rocha Netto). O Guaíra já teve dias melhores, mas continua sendo fundamental para o Paraná. Por isso, a Gazeta do Povo publica a partir de hoje e ao longo do ano reportagens sobre a realidade atual, os problemas, a rica história e os projetos deste espaço público tão especial. Viva o Guaíra.

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Quem sobe ao palco do Teatro Guaíra mesmo com as mais de 2.100 cadeiras vazias se emociona com o local, respeitado e adorado por quem lá trabalha e tem o privilégio de atravessar, todos os dias, o imenso palco de 54 metros de largura para iniciar o expediente. Responsável por montagens que marcaram época, como O Grande Circo Místico, de 1983, uma das mais conhecidas coreografias do balé do teatro, que teve músicas especialmente compostas na ocasião por Edu Lobo e Chico Buarque, além de peças como Galileu Galilei, de 1989, com Paulo Autran, o centro cultural passa hoje por uma situação delicada.

Entre os principais problemas está a falta de recursos, o que dificulta a retomada dessas grandes produções do passado. Hoje, o espaço, que é uma autarquia, recebe do governo do estado, segundo a diretora presidente Monica Rischbieter, R$ 1 milhão para fazer toda a programação cultural do Balé Guaíra, Orquestra Sinfônica do Paraná (OSP) e a G2 Cia. de Dança.

Outros R$ 500 mil (que podem atingir R$ 1 milhão) são fontes próprias do teatro, como a bilheteria e o aluguel para shows e formaturas. Em outras épocas, o orçamento já foi mais generoso: em 2006 era de R$ 4 milhões, mas, naquele mesmo ano, parte do dinheiro foi redirecionado para a construção de bibliotecas cidadãs. O aceitável hoje, comenta Mônica, seria um repasse de R$ 2,5 milhões (fora a arrecadação própria). "Não seria o ideal, mas daria para fazer muito mais bagunça e festa."

Caso o desejo se torne realidade, há projetos elaborados por Mônica e pela diretora artística Mara Moron, além da intenção de retomar ações como o Teatro de Comédia do Paraná, montagens próprias (a última foi em 2000, quando Felipe Hirsch dirigiu Os Incendiários) e o Comboio Cultural, com ônibus que levavam apresentações da OSP e do Balé para o interior. "A gente tem um centro cultural com condições para montar o que quiser. Mas as coisas param quando para o dinheiro", frisa a diretora presidente.

Burocracia

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Por ser autarquia e ter de se submeter a todas as exigências de qualquer outro órgão público, alguns processos acabam engessados, o que vai contra a dinâmica da área cultural, que requer mais agilidade. Além da falta de funcionários (em 1992 eram 494, hoje, são cerca de 180), que não foram repostos em novos concursos públicos – algo fora de cogitação por conta da Lei de Responsabilidade Fiscal, que determina que o Executivo comprometa no máximo 49% da receita líquida corrente com gastos de pessoal; o Paraná está no teto máximo –, os espetáculos precisam seguir o que exige a lei de licitações. "O balé da escola fez uma apresentação com as crianças, e elas tinham uma tiara de joaninhas. Na 25 de Março [rua de comércio popular em São Paulo] custa R$ 1,50. Mas não podemos ir lá e comprar, temos de licitar e a empresa precisa ter todas as certidões negativas exigidas. A gente acabou pagando R$ 22 cada tiara", conta Mônica. Hospedar a OSP em cidades do interior é outra tarefa árdua, porque somente algumas cidades têm hotéis com a documentação exigida. "Aí, os músicos precisam ficar em Londrina, por exemplo, e fazer a região, viajando e voltando todos os dias", diz Mara Moron.

Uma das saídas é a gestão feita por Organizações Sociais (OSs), associações privadas sem fins lucrativos que firmam um contrato de gestão com o governo do estado. Com isso, há flexibilidade maior na contratação (por CLT), facilidade para captação de recursos via Lei Rouanet e menos burocracia. A intenção, segundo o secretário de Cultura Paulino Viapiana é que Balé e Orquestra sejam geridos por OS (um edital para qualificar entidades como OS está aberto pela secretaria). "Não pretendemos terceirizar o Guaíra, ele continuará com as mesmas atribuições. É um equipamento público e assim deve permanecer. Nossa intenção é fazer contratos de gestão para administrar os corpos estáveis."

Modelo

A administração por OS na área cultural é mais moderna, salienta a coordenadora de extensão cultural da Escola São Paulo de Teatro, Lúcia Camargo. Ela já foi conselheira e diretora do Teatro Guaíra, secretária estadual da cultura do Paraná e diretora artística do Theatro Municipal de São Paulo. "Com OS você tem mais condições de fazer parcerias, conseguir recursos e até contratar músicos de outro país." Porém, a OS, segundo ela, só é válida quando há programação própria sólida. "Tem de tomar cuidado para que o Guaíra não vire uma casa de aluguel, precisa de equilíbrio."

Colaborou Rafael Rodrigues Costa

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