O leitor da Gazeta do Povo já deve ter percebido que a vida privada das celebridades não costuma pautar nossas reportagens. E não será hoje, em que a recente separação de Brad Pitt e Angelina Jolie ainda mobiliza a cobertura da mídia internacional, que vamos começar a esmiuçar esse tipo de assunto. O que abordaremos, e pedimos desculpas a quem veio até aqui em busca dessas novidades, é por que essas notícias nos afetam.
Primeiro, uma necessária contextualização. O casal permaneceu junto por 12 anos e tem seis filhos. O fim da era ‘Brangelina’, anunciado na manhã de terça-feira, foi uma avassaladora onda midiática. Muitos confessaram sua tristeza e uma “desilusão com o amor”, já que a união parecia ser a mais significativa em Hollywood. Outros reforçaram que era evidente que o relacionamento jamais vingaria. Os mais criativos, não importa de que lado estivessem, expressaram seu posicionamento por meio de uma profusão de memes.
“A partir da segunda metade do século 20, as pessoas começaram a falar sobre intimidades que eram preservadas até então. O cinema e, mais tarde, a televisão, passaram a vender os atores junto com os filmes e programas”
Houve também os que se sentiram vingados. Explica-se: Angelina teria sido o motivo do primeiro divórcio de Pitt. Jennifer Aniston, a ex, virou o principal ‘rosto’ dos memes. O jornal New York Post usou em sua capa uma foto da atriz, às gargalhadas, para fazer deboche de um acontecimento que, normalmente, seria tratado de maneira íntima.
Em “Vida: O Filme”, livro lançado em 1998, o jornalista e historiador Neal Gabler já apontava o que ficou ainda mais claro com redes sociais e a explosão de reality shows como “Big Brother” a partir da década seguinte: a vida, por si só, virou uma mídia tão completa quanto televisão, rádio e cinema. “Todos nós nos tornamos artistas em um programa mais complexo e instigante do que qualquer coisa imaginada para uma mídia convencional”, diz trecho. Algo como o argumento que Andrew Niccol escreveu para “O Show de Truman”, filme que também estreou em 1998.
Plateia
Jovem, rico, lindo e morto
As regras de Richard Stolley, que fundou a revista People, para uma capa de sucesso: “Jovem é melhor que velho; bonito é melhor que feio; rico é melhor que pobre, TV é melhor que música, música é melhor que cinema, cinema é melhor que esporte, qualquer coisa é melhor que política e nada é melhor do que uma celebridade que acaba de morrer”.
Como plateia de um relacionamento tão público, somos encorajados a tomar partido, em um fenômeno comportamental que não é novo, mas ganha contornos ainda mais intensos com a força das redes sociais. “A partir da segunda metade do século 20, as pessoas começaram a falar sobre intimidades que eram preservadas até então. O cinema e, mais tarde, a televisão, passaram a vender os atores junto com os filmes e programas”, analisa Neuzi Barbarini, professora de Psicologia Social da PUC-PR.
Brangelina, portanto, é mais rentável por quebrar esse limite de vida pública e privada do que por qualquer grande filme em que suas partes possam atuar.
A aparência irretocável do ex-casal também conta na manutenção do interesse por esse ‘programa’. Em “Vida: O Filme”, Gabler detalha as regras que Richard Stolley, que fundou a revista People, elencou para uma capa de sucesso: “Jovem é melhor que velho; bonito é melhor que feio; rico é melhor que pobre, TV é melhor que música, música é melhor que cinema, cinema é melhor que esporte, qualquer coisa é melhor que política e nada é melhor do que uma celebridade que acaba de morrer”.
A ideia de ter uma vida pacata, como qualquer pessoa comum leva, passou a ser desvalorizada a medida que esse tipo de culto cresceu. “O que vale é a cultura da emoção e da performance. E a maneira de trazer isso para a rotina da maioria, que não é estrela, é consumir a vida do ator, do músico, do atleta”, completa Neuzi Barbarini.
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