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Ewald Filho e o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab: smoking a pedido de Leon Cakoff e únicas vaias da noite | Tiago Queiroz/Agência Estado
Ewald Filho e o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab: smoking a pedido de Leon Cakoff e únicas vaias da noite| Foto: Tiago Queiroz/Agência Estado

A sessão de abertura da 35.ª Mostra Internacional de Cinema, realizada na noite de anteontem no Auditório Ibirapuera, em São Paulo, foi marcada pelo tom da emoção. Antes da cerimônia, foi exibido um vídeo de sete minutos com trechos de entrevistas concedidas ao longo da vida por Leon Cakoff, criador do evento, morto no último dia 14 em decorrência de um câncer. No documentário, editado em poucos dias, há depoimentos do crítico sobre como, na década de 1970, quando era funcionário do Museu de Arte de São Paulo (Masp), ele desafiou a ditadura militar ao entrar com uma ação na Justiça com o objetivo de que os filmes que pretendia exibir nas primeiras edições da Mostra não tivessem de passar pelo crivo da censura. Dessa forma, criou jurisprudência, um oásis criativo e de liberdade de expressão na capital paulista e ajudou a pavimentar a estrada da democratização cultural no país.

Após a exibição do vídeo, aplaudido de pé pelo público que lotou o auditório, a diretora da Mostra, Renata de Almeida, viúva de Cakoff, subiu ao palco com o apresentador Serginho Groisman – amigo do casal e por muitas vezes mestre de cerimônia das sessões –, e falou brevemente em agradecimento ao apoio recebido. Disse que, embora este último ano tenha sido muito difícil para ela, sua família e para equipe de organização do evento, sentia orgulho do resultado, que reúne até dia 3 de novembro cerca de 250 filmes em duas dezenas de espaços espalhados por toda a capital paulista. Garantiu que o evento seguirá o seu caminho, como desejava o marido.

Groisman, por sua vez, falou das dificuldades enfrentadas por Cakoff nas primeiras edições e de como o crítico, "um sujeito teimoso, idealista e durão", havia feito de São Paulo, que antes não tinha acesso a produções de tantos países distintos, um dos maiores polos de cinefilia do mundo, uma cidade com paladar audiovisual refinado. "Sempre tivemos confiança na Mostra, apesar das dificuldades com a censura e para levantar recursos, porque o Leon não fazia concessões, que sempre procurou trazer o novo, o inusitado, o diferente. O cinema era o seu vício, e ele nunca teve que passar por abstinência."

Em seguida, subiram ao palco o crítico Rubens Ewald Filho, também amigo pessoal de Cakoff, e a jornalista e cineasta Marina Person. Ewald vestia um smoking, a pedido do crítico. "Há algumas semanas, estive no hospital para visitá-lo, e Leon olhou para mim e disse: ‘Quero você com o smoking do Oscar para apresentar a Mostra dos 35 anos’. Como eu podia negar esse pedido?"

Embaraço

O tom de emoção e de pesar que permeou toda a cerimônia, entretanto, também teve, em alguns poucos momentos, de dividir a cena com o constrangimento e o embaraço. Visivelmente desconfortável, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, subiu ao palco e fez um discurso confuso. Disse que não queria estar ali, e só estava presente à cerimônia em decorrência da morte de Cakoff. Caso contrário, como de costume, seria representado pelo atual secretário municipal de Cultura, Carlos Augusto Calil, que também discursaria minutos mais tarde. Mesmo se dizendo um apoiador incondicional da Mostra, e afirmando que, enquanto estiver no cargo, a prefeitura continuará ao lado do evento, Kassab teve de ouvir as únicas vaias de uma noite repleta de aplausos emocionados.

A cerimônia foi seguida pela exibição de dois filmes. O primeiro foi uma versão restaurada do curta-metragem clássico Viagem à Lua, rodado em 1902 pelo francês George Méliès, um dos pioneiros do cinema no mundo. A versão foi recuperada a partir de uma das cópias originais colorizadas a mão, encontrada na Catalunha, na Espanha, na década de 1990. Foram necessários mais de dez anos para que se chegasse ao espetacular resultado, que tem trilha sonora do duo francês de música eletrônica Air.

Em seguida, foi projetado o belo filme O Garoto da Bicicleta, dos cineastas belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne, premiado com o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes deste ano e muito aplaudido pelo público na noite de abertura da Mostra.

O jornalista viajou a convite da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

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