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A figura do bicheiro está há décadas ligada ao Carnaval. Os donos do jogo considerado ilegal no Brasil – mas que, mesmo assim, é apreciado e jogado por milhões de pessoas – costumam se transformar em patronos das escolas de samba e financiadores dos desfiles. O universo desses personagens e da maior festa popular brasileira, que já foi tema de diversas produções artísticas tanto na literatura, teatro, cinema e televisão, é retomado pela série "Filhos do Carnaval", que estréia no próximo domingo no canal de tevê pago HBO.

A atração dirigida por Cao Hamburguer – mais conhecido por seus trabalhos na área infantil, como o filme e a série televisiva "Castelo Rá-Tim-Bum" – tem como protagonista o veterano ator Jece Valadão. Ele vive o bicheiro Anésio Gebara, uma espécie de poderoso chefão do Rio de Janeiro, patrono (fictício) da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. "Acho que já fiz mais de dez bicheiros na minha carreira, desde as minhas primeiras participações nos filmes da Atlântida, passando pelos filmes Boca de Ouro e Águia na Cabeça, até chegar agora na série. Por isso, senti-me muito à vontade no papel", contou o ator em coletiva de imprensa de lançamento de Filhos do Carnaval, realizada na semana passada em São Paulo.

Apesar de ser um contraventor, Gebara é daqueles personagens capazes de conquistar facilmente a simpatia do público. "A partir do momento em que o personagem transmite uma autenticidade, há uma tendência do espectador de se identificar com ele, mesmo sendo carregado de maldade e uma série de coisas, um homem de submundo, capaz de mandar matar", explica Valadão, que construiu sua carreira no cinema baseado em personagens semelhantes ao da série.

Mas, há alguns anos, o ator se converteu à religião evangélica, mudando sua perspectiva de vida e a maneira como encara os novos trabalhos que aceita na profissão. "Eu congrego uma igreja muito light, evoluída, o meu pastor é um cara que tem os pés no chão e uma visão muito ampla das coisas, não tem preconceitos. A igreja não pega no meu pé por causa dos meus trabalhos. Mas na minha posição, não posso fazer personagens que tenham alguma implicação espiritual. Coisas do mundo, posso fazer, mas até um certo limite", explica, revelando que teve que conversar com Cao Hamburguer para acertar determinadas coisas que seu personagem poderia ou não realizar. "O Cao me deu muita oportunidade de discutir vários assuntos e foi muito compreensivo, entendeu. E isso não desvalorizou ou empobreceu o personagem", continua.

O mesmo tipo de discussão aconteceu para aceitar participar de "Cinco Frações de um Quase História", longa-metragem em cinco partes realizado por uma produtora mineira, que será filmado no próximo mês. Jece vai interpretar o personagem principal do episódio da produção dirigido por Armando Mendes, vivendo um juiz criminoso e devasso. "O diretor concordou em amenizar uma série de coisas, por isso vou fazer. Havia uma cena em que o juiz cheirava cocaína que eu jamais faria, outra de fotos eróticas que nem tenho mais idade para fazer. O personagem é tão rico dramaticamente que não são necessárias apelações, não é preciso falar palavrão para ser forte, o nu é dispensável. Posso fazer um mau-cárater, mas não posso exarcebar", lembra.

Valadão diz que hoje existe uma diferença na sua interpretação. Na época em que estrelou filmes como "Boca de Ouro", "Os Cafajestes", "Mineirinho", "Vivo ou Morto", "Paraíba – Vida e Morte de um Bandido" e "Memórias de um Gigolô", seus valores eram outros. "Fazia descompromissado de tudo, porque era ateu por convicção intelectual, materialista até a medula e machista. Depois que os valores da minha vida mudaram, passei a ter um compromisso com algo mais sério", revela o ator, hoje com 75 anos.

Dentro dessa nova visão das coisas, Valadão prepara-se para filmar a vida do apóstolo Paulo, mas atualizando a história para os dias de hoje. "Decidi fazer depois da minha conversão. Paulo de Tarso é um personagem biblíco que tem uma história linda. Ele começou perseguindo os cristãos depois da morte de Jesus, em nome da religião judaica e do poder bélico romano. Mas teve um encontro com um poder maior e mudou, passando a defender Jesus e a ser perseguido", observa. No roteiro escrito pelo próprio Jece, Paulo é um promotor público que pensa que é o dono do mundo, mas sua trajetória sofre um grande revés. Diretor e produtor, Valadão ainda busca captar recursos para realização do longa.

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