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Se a pergunta for qual a "melhor" obra da literatura brasileira, as respostas podem variar, mas dificilmente serão citados livros de contos.

Na hipotética enquete, haveria muita chance de serem mencionados os romances Dom Casmurro (Machado de Assis), Grande Sertão: Veredas (Guimarães Rosa), Perto do Coração Selvagem (Clarice Lispector), As Meninas (Lygia Fagundes Telles) e O Caso Morel (Rubem Fonseca).

Todos os autores das obras, que poderiam vir a citadas em uma eventual pesquisa, também se aventuraram pelo conto, com não pouca desenvoltura.

Machado de Assis e Guimarães Rosa são apontados por inúmeros estudiosos, e pela professora Salma Ferraz, da UFSC, como os dois dos maiores contistas brasileiros, por terem escrito, individualmente, peças ficcionais magistrais. "Esses dois gênios foram ao mesmo tempo os melhores contistas e romancistas do Brasil", analisa Salma.

Mas nem só de Machado e Rosa se faz a excelência do conto nacional. Clarice Lispector, Lygia Fagundes Telles e Rubem Fonseca também são referências do gênero.

Jane Tutikian, da UFRGS, entende que Clarice revolucionou a história curta pela instrospecção; Lygia, pela denúncia da desintegração ética e social, e Rubem Fonseca, por ter problematizado o desamparo amoroso.

Motes e Trevisan

Alcir Pécora, da Unicamp, observa que o conto brasileiro, pelo menos o contemporâneo, se não tem uma temática comum, traz nos enredos violência urbana, costumes suburbanos, intimidade burguesa, paranóia e o esvaziamento da existência.

Pécora, leitor atento e crítico, reconhece que Rubem Fonseca, que estreou em 1963 com Os Prisioneiros, é um contista relevante, mas encontra-se completamente fora de forma. "Com obras que mais parecem pré-roteiros, esquetes de genero", diz.

O professor da Unicamp verbaliza algo que também é dito por muitos leitores, críticos, escritores e por Luciana Villas-Boas, da Record: "Dalton Trevisan é o grande contista brasileiro".

"Dalton ainda produz obras surpreendentes, como esse último, Violetas e Pavões, menos vampiresco, anedótico, e mais criminal, absurdo, ainda mais niilista do que antes", analisa Pécora.

Trevisan, diferentemente de Machado de Assis e Guimarães Rosa, que foram romancistas, é e sempre foi, desde sempre, apenas contista. Desde 1959, data de sua estreia oficial, com Novelas Nada Exemplares, ele vem escrevendo continuamente contos, longos ou extensos, sempre intensos.

A década de 1970, em pleno regime militar, foi o período, dizem os estudiosos de literatura, de maior efervescência do gênero no Brasil. Curiosa e coincidentemene, a mesma época em em que Trevisan e Fonsesa se firmaram como os grandes.

Naqueles anos, o crítico literário Temístocles Linhares afirmou que o conto era o gênero nobre, e não mais o romance, que desde 1930 "reinava".

Atualmente, há inúmeros autores publicando conto, e Pécora chama a atenção para a produção de João Gilberto Noll, Wilson Bueno, Rubens Figueiredo e Beatriz Bracher.

Salma Ferraz, da UFSC, lembra do curitibano Jamil Snege (1939-2003), hoje com os livros fora do comércio e esgotados, merece destaque, sobretudo pelo livro de contos Os Verões da Grande Leitoa Branca.

Já a professora Jane Tutikian, da UFRGS, com uma cuia na mão, observa que o Rio Grande do Sul também é celeiro de contistas, de Simões Lopes Neto a Daniel Galera, incluindo autores reconhecidos pela crítica, como Sergio Faraco, Caio Fernando Abreu e Charles Kiefer.

Luciana Villas-Boas, diretora editorial da Record, lembra que conto rima como perfeição, e isso vale para os autores nacionais. "O romance sempre terá uma digressão, algo que não poderia constar. Já os contos são perfeitos, com aquele potencial de apresentar um personagem rico e complexo em poucas linhas, que sua leitura pode ter o efeito de um soco de surpresa", diz Luciana.

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