Scliar será velado na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul| Foto: Antonio Paz / Palácio Piratini/Governo do RS

O escritor Moacyr Scliar, que havia sofrido um acidente vascular cerebral isquêmico (AVC) e estava internado no Centro de Tratamento Intensivo (CTI) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre desde 17 de janeiro, faleceu à 1 hora da madrugada deste domingo (27). Segundo boletim médico, Scliar, 73 anos, morreu de falência múltipla de órgãos.

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Internado desde 11 de janeiro para uma cirurgia de extração de tumores no intestino, Scliar sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico no dia 16 de janeiro e foi encaminhado à unidade intensiva. No dia seguinte, sofreu uma cirurgia para retirada de coágulo decorrente do AVC, passando a ser mantido com um mínimo de sedação necessária. O escritor passava pela retirada gradual da sedação quando, no dia 9 de fevereiro, apresentou um quadro de infecção respiratória, voltando então a ser sedado e a respirar por aparelhos.

O velório será neste domingo, a partir das 14 horas, no salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. O sepultamento ocorrerá segunda-feira, em local e horário ainda indefinidos. A cerimônia será apenas para familiares e amigos.

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Trajetória

"Não preciso de silêncio, não preciso de solidão, não preciso de condições especiais. Preciso só de um teclado." Em meio a dezenas de depoimentos de autores sobre as mais diferentes manias no momento de escrever, publicados desde o início do ano passado no blog do escritor Michel Laub, o do gaúcho Moacyr Scliar se destacou pelo pragmatismo: para o criador prolífico e naturalmente inspirado, o único impedimento para a escrita seria a falta da ferramenta com a qual levá-la a cabo.

Tanto era assim que, em quase 50 anos de carreira literária, ele publicou mais de 80 livros. O primeiro - Histórias de um Médico em Formação foi publicado em 1962, mesmo ano em que concluiu a faculdade de medicina na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O mais recente foi o romance Eu Vos Abraço, Milhões, que saiu em setembro do ano passado. Entre um e outro escreveu romances e livros de crônicas, contos, literatura infantil e ensaios, numa média de mais de um livro por ano, com destaque para O Ciclo das Águas, A Estranha Nação de Rafael Mendes, O Exército de um Homem Só e O Centauro no Jardim.

Tudo isso mantendo os critérios que o tornaram um dos mais reconhecidos autores brasileiros contemporâneos em solo nacional com uma cadeira na Academia Brasileira de Letras desde 2003 e três Jabutis (1988, 1993 e 2009) entre prêmios recebidos, e também no exterior, com obras publicadas em 20 países e honrarias como o Casa de Las Americas, em 1989.

Scliar não deixou de lado a carreira na medicina. Na área, destacou-se desde 1969 em cargos como chefe da equipe de Educação em Saúde da Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul e como diretor do Departamento de Saúde Pública. Entre o lançamento do livro de contos que Scliar preferia considerar como sua primeira obra profissional, O Carnaval dos Animais, em 1969, e o primeiro romance, A Guerra no Bonfim, em 1971, encontrou tempo para cursar pós-graduação em medicina comunitária em Israel. Ainda no início da década passada, em 2002, concluiu doutorado em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública, com a tese Da Bíblia à Psicanálise: Saúde, Doença e Medicina na Cultura Judaica.

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A tradição judaica o acompanhou em toda a carreira literária, assim como o imaginário fantástico. Nascido em 23 de março de 1937 no bairro do Bom Fim, que até hoje reúne a comunidade judaica de Porto Alegre, e alfabetizado pela mãe, Sara, que era professora primária, Scliar chegou a ter o romance O Centauro no Jardim incluído numa lista com os cem melhores livros relacionados à história dos judeus dos últimos dois séculos, elaborada pelo National Yiddish Book Center. Também se tornou um grande porta-voz do País sobre temas relativos ao judaísmo, mantendo laços de amizade com alguns dos maiores autores israelenses no mundo contemporâneo, como David Grossman, A.B. Yehoshua e Amos Oz.

A especialização em saúde pública, por sua vez, deu a Scliar a oportunidade de vivenciar temas como a doença, o sofrimento e a morte - características que podem ser percebidas tanto em sua ficção, em obras como A Majestade do Xingu, quando na não ficção caso em que A Paixão Transformada: História da Medicina na Literatura é um dos exemplos mais claros. Ele pôde também conhecer de perto a realidade brasileira, o que fez da vida de classe média, sempre em textos leves e bem-humorados, outro de seus assuntos centrais.

Casado desde 1965 com Judith Vivien Oliven e pai de Roberto, nascido em 1979, Scliar também dedicou atenção especial às obras infanto-juvenis. Costumava dizer que escrevendo para os jovens reencontrava o jovem leitor que havia sido. Boa parte de sua produção nessa área foi considerada "altamente recomendável" pela Fundação Biblioteca Nacional.

Além de produzir textos para vários jornais e revistas, o autor também teve trabalhos adaptados para o cinema. Caso do romance Um Sonho no Caroço do Abacate, adaptado em 1998 por Luca Amberg sob o título Caminho dos Sonhos, em cujo elenco apareceram atores como Taís Araújo, Caio Blat e Mariana Ximenes. Em 2002, o romance Sonhos Tropicais virou filme, sob direção de André Sturm com Carolina Kasting, Ingra Liberato e Cecil Thiré entre os atores.

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