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McCarthy: autor de "A Estrada" vendeu a máquina de escrever que comprou em 1963 por 50 dólares. | Divulgação
McCarthy: autor de "A Estrada" vendeu a máquina de escrever que comprou em 1963 por 50 dólares.| Foto: Divulgação
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A imagem da capa do terceiro livro de Lucius de Mello, Travessia da Terra Vermelha – Uma Saga dos Refugiados Judeus no Brasil, é um tributo à estrada de ferro brasileira, que salvou a vida de centenas de judeus fugidos do extermínio nazista na Alemanha.

Sem dinheiro para deixar o país devido à restrição da evasão de divisas estipulada por Hitler, mesmo as famílias judias abastadas não conseguiriam sair da Alemanha nazista. A solução foi encontrada por Otto Proustel, um ex-deputado do partido católico perseguido pelo führer, já são e salvo no Brasil.

Ciente de que a companhia ferroviária inglesa Paraná Plantation comprava equipamentos na Alemanha, armou o que foi apelidado de "operação triangular": os judeus na Alemanha compravam os produtos e, em troca, a companhia concedia títulos de terras localizadas no município de Rolândia, norte do Paraná. De posse das terras, famílias judias da elite intelectual alemã mudaram-se, de mala e cuia, para o município, que, na década de 30, era território de matas virgens, pouco explorado.

O romance histórico sobre a vida da comunidade judia no norte do Paraná foi lançado recentemente em Rolândia, Londrina, São Paulo e durante a Festa Literária de Parati (Flip). No dia 4 de setembro, às 19 horas, o autor lança o livro em Curitiba, nas Livrarias Curitiba do Shopping Park Barigüi.

História de cinema

Nascido em Bariri, interior de São Paulo, o escritor Lucius de Mello viveu oito anos em Curitiba, onde se formou jornalista e trabalhou em emissoras de TV. Nesse período, não ouviu falar de Rolândia, quanto mais da história de seus colonizadores judeus. Ex-repórter da Rede Globo, onde trabalhou por 14 anos, Lucius estava em busca de uma história para um novo livro, em 2003, quando uma amiga lhe indicou "a saga cinematográfica" dos imigrantes judeus. "Ela me falou sobre uma soprano que dava aulas de piano na mata. Isso foi suficiente para me atrair", conta o autor, apaixonado por música.

A produção do romance histórico levou quatro anos para ser concluída. Nos três primeiros, Lucius viajou sete vezes à Rolândia, onde realizou cerca de 50 entrevistas, e uma vez à Frankfurt, na Alemanha, no rastro de alguns poucos refugiados que retornaram à Alemanha. Também vasculhou cartas, fotos, diários, partituras musicais e livros de seus personagens.

Durante a escrita, que levou um ano para finalizar, procurou se cercar de objetos que o ligavam afetivamente à história contada, como um vaso com terra vermelha de uma das fazendas de Rolândia, e presentes que "herdou" de seus entrevistados (agora amigos, após quatro anos de convívio), como a coleção completa da obra de Proust, que ganhou do filho da soprano. "Persegui a memória destas pessoas para tentar chegar em suas almas", explica.

Os presentes, livros em sua maioria, sinalizam o valor que esta comunidade, formada por pessoas cultas e cosmopolitas, dava à cultura e ao conhecimento em geral. Mesmo pouco afeitas à vida no campo, esforçavam-se para se adaptar às novas condições. A soprano, por exemplo, cantava trechos da ópera Madame Butterfly enquanto ordenhava a vaca Berenice.

Outra personagem feminina, a física Agathe, estava de passagem comprada para os Estados Unidos, onde trabalharia na equipe de Einstein, mas, ao passar por Rolândia para uma visita rápida aos parentes, acabou se apaixonando e ficando por ali.

O jornalista poderia ter optado pelo livro-reportagem para contar a histórias dessas famílias. Preferiu o romance porque considera a literatura superior à ciência e à filosofia "para tratar de temas subjetivos e de verdades cada vez mais provisórias".

Não poderia ter encontrado forma mais acertada do que o romance para falar da vida de pessoas que aprenderam a falar português lendo Machado de Assis e Fernando Pessoa. "Com muitas dificuldades, ele trouxeram ao Brasil bibliotecas, obras de arte e até um piano de cauda", conta o escritor.

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Serviço: Travessia da Terra Vermelha – Uma Saga dos Refugiados Judeus no Brasil (Novo Século, 424 págs., R$45).

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