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O escritor volta à origem da palavra daimon, inspiração artística em grego | Irene Santos/Divulgação
O escritor volta à origem da palavra daimon, inspiração artística em grego| Foto: Irene Santos/Divulgação

A zona cinzenta entre a vida pessoal e o desejo de expressão artística é o ambiente de trabalho do escritor Nelson Rego em Daimon Junto à Porta. Em uma coletânea de dez contos, variados em tamanho e narrador, o autor e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) volta à origem etimológica da palavra grega daimon – que, na transposição para o latim, deu origem à palavra demônio. No livro de Rego, "Daimon" é a inspiração e a força artística que se expressa dentro de cada personagem de suas histórias.

Logo no primeiro conto, o es­­critor dá uma amostra da unidade temática de Daimon Junto à Porta. Com um narrador em primeira pessoa, que só depois se revela também personagem, "Platero e o Mar" conta a história de um grupo de amigos – duas mulheres e um homem – que passam uma temporada na casa de praia de uma artista plástica. Enquanto uma das mulheres, Inocência, vai sendo, aos poucos, seduzida por crianças que pedem para vê-la nua, os outros posam em cenas de sexo explícito para serem pintadas pela artista, provavelmente na linha das telas do austríaco Egon Schiele. Os personagens de "Platero e o Mar" são retomados no último conto "Um Pedacinho do Tempo Diante dos Olhos", em que são registrados pela câmera de uma fotógrafa, em uma história mais branda. Mas as cenas eróticas e a expressão artística extrema dão a tônica do livro.

O demônio propriamente dito aparece em apenas um dos textos, "A Tecelagem do Mal". Nele, um padre exorcista é seduzido por uma garota possuída, e o diabo, que age por vias escusas, leva o religioso-narrador a questionar sua vocação e sua existência en­­quanto homem santo e pecador. Já em relação a possessões espirituais, o Daimon também está presente em "O Recital dos Mortos", no qual uma garota narra a história de Seu Seis, inquilino de sua casa com poderes mediúnicos, que um dia passa a recitar o nome de mortos que acabaram de deixar o plano material.

Enredos

Em todos esses enredos, prevalece a capacidade de Nelson Rego em prender o leitor, embora algumas vezes demonstre pouca destreza com jogos de palavras e imagens pouco convencionais, além de inaptidão para o discurso informal, demonstrado no conto "Na Verdade É Isso Aí, Ó" – um grande diálogo permeado por muitos vícios de linguagem que termina por soar completamente artificial. Ainda assim, em Daimon Junto à Porta prevalece a vontade de contar bem boas histórias, algo de que muitos escritores contemporâneos às vezes se esquecem.

Serviço:

Daimon Junto à Porta, de Nelson Rego. Dublinense, 128 págs., R$ 27. Contos.

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