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Wilde autorizou a versão censurada publicada em 1891 | Divulgação
Wilde autorizou a versão censurada publicada em 1891| Foto: Divulgação

Lançamento

O Retrato de Dorian Gray: Edição Anotada e Não Censurada

Oscar Wilde. Tradução de Jorio Dauster. Biblioteca Azul, Editora Globo, 352 págs., R$ 64,90. Romance.

Foi há mais de um século, mas dá para imaginar a expressão de espanto do editor da Lippincott’s Monthly Magazine ao receber a primeira versão dos originais de O Retrato de Dorian Gray. Nem mesmo a liberal revista americana, que em 1890 havia concordado em lançar o romance de Oscar Wilde, estava pronta para o homoerotismo explícito da obra. Tentando abrandar referências a um tema tabu para a época, foram cortadas nada menos do que 500 palavras do texto original. Ainda assim, a história escandalizou a Inglaterra vitoriana — a ponto de o próprio autor se autocensurar na publicação em forma de livro de 1891, excluindo em sua revisão diálogos e descrições mais gráficas.

Esquecido nas gavetas das academias, o "proibidão" de Wilde saiu do limbo apenas em 2011, pelas mãos do pesquisador inglês Nicholas Frankel. E só agora, 123 anos após ter sido retalhado em nome dos bons costumes, ganha seu primeiro lançamento em português, pela Biblioteca Azul (selo da Editora Globo). Trata-se do Dorian Gray inicialmente concebido por Wilde — e muito provavelmente aquele que o escritor inglês gostaria que conhecêssemos atualmente, se a sociedade de seu tempo tivesse permitido.

"Podemos apenas especular, mas tenho a impressão de que Wilde preferiria que lêssemos a versão não censurada", sugere Frankel, que também organiza a edição. "Ao autorizar a versão censurada de 1891, ele sabia que tinha comprometido sua visão original. Acredito firmemente que Wilde fez esses cortes com relutância, embora, do ponto de vista legal, a sua sabedoria tornou-se evidente, quatro anos mais tarde, quando foi acusado em tribunal de purgar o romance para obscurecer suas intenções originais."

Evidências

Mais ousada e explícita em seu conteúdo sexual, a nova edição deixa claro que os sentimentos entre Dorian e Lorde Henry iam muito além da amizade e da admiração intelectual. Como Frankel mostra na apresentação do livro, há diversas evidências de que os três personagens principais (Dorian, Henry e Hallward) praticam atos de "flagrante indecência".

Embora a natureza dos relacionamentos nunca seja revelada por inteiro, Hallward confessa a Dorian: "É bem verdade que o idolatrei com um sentimento afetivo muito maior do que qualquer homem deveria devotar a um amigo". Não menos escandalosos são os ataques de Wilde à instituição do casamento, disparando frases como "Há certos temperamentos que o matrimônio torna mais complexos" e "O único encanto do casamento é que as duas partes são obrigadas a viver um embuste".

Pela popularidade atual de O Retrato de Dorian Gray, é surpreendente que esse tesouro editorial tenha levado tanto tempo para ser publicado. Segundo Frankel, o longo purgatório se explica pela estigmatização sofrida por Wilde até os anos 1990. Embora estudiosos da literatura queer tenham se esforçado para redimi-lo como grande autor, a reavaliação demorou a chegar.

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