Biografia traz profundo apanhado teórico da vida-obra de Patrícia Galvão| Foto: Reprodução

Reedição

Pagu – Vida-obra

Augusto de Campos. Companhia das Letras, 472 págs. R$ 59,50. Biografia.

CARREGANDO :)
CARREGANDO :)

O roteiro é conhecido: mulher, talentosa, iconoclasta, carregada de amarguras por conta de uma vida repleta de tristezas, boicotes e sanhas do mercado cultural. Por isso – e a favor do reconhecimento de uma condição histórica – o relançamento de Pagu – Vida-Obra, do poeta, tradutor, ensaísta e crítico Augusto de Campos, é dos mais relevantes acontecimentos literários de 2014.

Lançado originalmente em 1982, pela saudosa Brasiliense, e há muito tempo esgotado nas livrarias, Pagu é uma das biografias mais originais feitas no Brasil, espécie de linha do tempo em fragmentos, que realça e aprofunda a trajetória intelectual de uma figura múltipla.

Publicidade

O livro narra, ao seu modo peculiar, o caminho impressionante de Patrícia Rehder Galvão, conhecida, infelizmente, por muitos como a "musa" do Movimento Antropofágico e esposa do modernista Oswald de Andrade. Logo de cara, Campos dispara: "quem resgatará pagu?/ patrícia galvão (1910-1962)/ que quase não consta das histórias literárias/ e das pomposas enciclopédias provincianas/ uma sombra cai sobre a vida/ dessa grande mulher/ talvez a primeira mulher nova do brasil/ da safra desse século/ na linhagem de artistas revolucionárias/ como anita malfatti e tarsila/ mas mais revolucionária/ como mulher."

Vanguarda

Versátil, Pagu foi desenhista, poeta, tradutora, diretora de teatro e jornalista cultural. Suas críticas literárias são aulas de transgressão e liberdade de pensamento, de quem estava sempre disposta a questionar os alicerces. Veja o que ela diz sobre o engajamento ideológico na literatura:

"Aí está, para os literatos do Partido que querem desfraldar a bandeira da literatura progressista, um punhado de observações que penso que os ajudarão. [...] É verdade que me esqueci de mencionar o caráter nacionalista daquela literatura nova. Será pontilhada de estrelinhas de me-ufanismo, cantará Volta redonda e o petróleo de Lobato, assim como os fartos bigodes do generalismo."

Sobre as críticas nacionalistas do compositor Camargo Guarnieri às práticas dodecafônicas: "Qualquer imbecil a serviço da propaganda staliniana conhece bem o emprego dessa terminologia".

Publicidade

Os méritos do escritor de Viva Vaia (1979) são muitos. Da extensa pesquisa biobibliográfica, como ele mesmo diz, ao resgate dos contornos plásticos de Pagu sob a visão de outros críticos e testemunhos, Campos entrega um registro ancestral que merece ser consultado para além de sua importância atual de resgate. Estamos aqui, ao primeiro plano, diante de um panorama das dificuldades de ser mulher e artista. Em última instância, as agruras de ter espírito crítico e independente.