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A pequena cidade de Vera Cruz, interior de São Paulo, em breve deve começar a disputar com Curitiba as honras de ser o berço do escritor Paulo Sandrini. Radicado na capital paranaense há 11 anos, idade exata de sua produção literária, Sandrini já figura na seleta lista da nova geração de escritores da literatura brasileira contemporânea, com três livros de contos publicados. O mais recente, Códice d’Incríveis Objetos & Histórias de Lebensraum (Travessa dos Editores, 168 págs), foi lançado há uma semana.

Nascido em Vera Cruz, em 1971, Paulo mudou-se ainda bebê para a vizinha Bauru, onde permaneceu até os 23 anos. Às voltas com o curso de Design – Desenho Industrial, que cursava na Universidade Estadual Paulista (Unesp), Paulo precisava de uma mudança de ares, proporcionada por uma visita a Curitiba, em 1991. "Gostei da cidade, estava querendo sair de Bauru, mas não sabia se ia para São Paulo. Queria largar o curso, fazer outra coisa ou transferi-lo", lembra o autor.

Entre as indecisões típicas da chamada "crise dos vinte e poucos anos", Sandrini seguiu os passos de um colega e transferiu sua graduação em Design para a UFPR, já trazendo alguns escritos na bagagem. E foi aqui, na terra dos pinheirais, que ele se assumiu escritor e consolidou sua produção literária, que teve início quando ainda era garoto, em Bauru. "Sempre tínhamos de escrever redações, que, na época, eram chamadas de composições. Apesar de ser um pouco tímido para a maioria das coisas, eu gostava de ler o que escrevia. Assim, comecei a notar que as pessoas gostavam e riam em momentos que eu nem estava tentando ser engraçado", conta.

Porém, a vocação literária de Sandrini acabou sendo, de certa forma, adiada por uma outra vontade: ser músico. Mesmo sem tocar nenhum instrumento, Sandrini, com a ajuda do irmão, Marco, passou a compor melodias de cabeça, para as quais sempre elaborava versos. Aos 12 anos, o amontoado de letras chegou a ter quase a sua altura, com temáticas que iam de Joseph Mengueli (nazista exilado no Brasil) a interpretações satíricas de histórias bíblicas como a de Adão e Eva. Alguns anos depois, já dominando a técnica da guitarra, Sandrini formou a banda My Sweet Lord Vader, apostando em uma sonoridade industrial.

Mas o grupo acabou extinto com a mudança de Sandrini para Curitiba, onde o rapaz decidiu enveredar por outro caminho. "Queria escrever roteiros de cinema. Comecei a cursar algumas disciplinas com o Hugo Mengarelli, na UFPR, e cheguei a ir para Buenos Aires para estudar mais", explica. Mas a saudade da namorada curitibana – hoje esposa e mãe do vindouro primeiro filho – falou mais alto e Sandrini acabou voltando antes do tempo.

A viagem para a Argentina e o Uruguai, no entanto, acabou servindo como uma busca por referências originais que poderiam ser utilizadas em sua mais nova empreitada, a retomada da escrita. "Li muitos autores contemporâneos e procurava descobrir onde meu trabalho poderia se encaixar. Fui influenciado por escritores como Horácio Quiroga e Roberto Alt e resgatei essas referências como uma espécie de homenagem", revela.

Transformando idéias para roteiros cinematográficos em contos, Sandrini participou de prêmios importantes para a consolidação de seu trabalho como escritor, entre eles o Concurso de Contos Paulo Leminski, em 1997, no qual conquistou a segunda colocação.

Pupilo do escritor Jamil Snege (1939 – 2003) – Sandrini costumava deixar seus contos na portaria da agência de publicidade do "mestre" –, Paulo logo despertou o interesse da editora local Travessa dos Editores, com uma forcinha do veterano escritor. Em 2003, com a publicação de O Estranho Hábito de Dormir em Pé – o primeiro trabalho de Sandrini, Vai Ter Que Engolir, de 2001, foi uma iniciativa independente –, o talento do escritor rendeu uma boa recepção de público e crítica, além de ter sido um dos destaques da literatura produzida naquele ano. "Este livro representou uma virada. Graças a ele fui inserido no meio literário brasileiro e na nova geração de escritores", avalia.

Além da literatura, o design continua fazendo parte da trajetória de Sandrini, que é responsável pela edição de arte da revista Idéias, além de fazer parte do conselho editorial da revista Et Cetera e manter o site de literatura Cronópios (www.cronopios.com.br).

Com o recém-lançado Códice d’Incríveis Objetos & Histórias de Lebensraum, Sandrini espera consolidar ainda mais seu espaço no meio literário nacional – porém, sem precisar deixar sua terra-natal adotiva. "Me considero um escritor paranaense e até gosto bastante deste rótulo. Se não estivesse aqui, não sei se estaria escrevendo literatura. Depois de dez anos, posso dizer que essa cidade também é minha. Posso dizer que é um lugar onde pretendo passar o resto da vida ou, se tiver de me mudar, vou embora falando da boa experiência que tive", ressalta, lembrando ainda de seu filho, que, daqui há seis meses, nascerá curitibano. Foi mal, Vera Cruz...

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