| Foto: Robson Vilalba/Ilustração

Homenagens

Jovem escritor brasileiro participa de conferência sobre Roth nos EUA

Os 80 anos de Philip Roth serão celebrados ao redor do mundo com debates, leituras e eventos dedicados à obra do escritor. Iniciada ontem em Newark, no Estados Unidos, cidade onde nasceu o autor, a conferência Roth@80, organizada pela Philip Roth Society, contou com a participação do escritor Felipe Franco Munhoz, 23 anos, paulistano que viveu em Curitiba por alguns anos.

Além de mediar uma mesa de debates entre professores, Munhoz leu trechos de seu romance Mentiras, inspirado na obra homônima de Roth, e composto exclusivamente por diálogos. O livro de Munhoz, que ainda não foi publicado, foi produzido a partir de uma bolsa de R$ 30 mil que o escritor recebeu da Fundação Nacional de Artes (Funarte) em 2010.

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Lançamentos

A Companhia das Letras acaba de publicar uma nova tradução de O Professor do Desejo (256 págs., R$ 39,50), de 1977, e lançou em formato de bolso O Complexo de Portnoy (240 págs., R$ 25), de 1969.

Philip Roth, de 31 romances e 2 livros de não ficção, o maior escritor vivo dos Estados Unidos (você pode discordar, sem problema), faz 80 anos nesta terça-feira. Não é o caso de desejar felicidades porque, para Roth, "a velhice é um massacre".

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A última repórter que arriscou falar na idade do autor foi Tina Brown, no Daily Beast. A entrevista é de três anos atrás e ela pergunta, depois de se enrolar um pouquinho: "Como é ter 70 anos?".

Roth dá um sorriso irônico, aperta os olhos e responde: "Hum... Eles são ótimos!". Os dois começam a rir. "Mal posso esperar pelos 80". Gargalhadas...

Ele fez piada porque, àquela altura, já havia escrito alguns livros que tratam do "massacre". Homem Comum, Fantasma Sai de Cena e A Humilhação falam do tema que apareceu na obra de Roth violentamente em 1991, quando ele descreveu o fim da vida do pai em Patrimônio.

A questão é que Philip Roth parou de escrever. Algumas notícias afirmaram que ele "decidiu se aposentar", mas não foi bem isso.

Foi durante uma entrevista para a revista francesa Les inRocks, em outubro de 2012, dois anos depois de Nêmesis, seu último livro, e o que ele disse tinha um tom mais contundente que o de um anúncio simples. E, pensando bem, seria estranho se Roth viesse a público para "anunciar sua aposentadoria" numa mera formalidade. O que ele disse foi: "I’m done". Algo como: "Para mim, chega".

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Quando pediram para ele elaborar, como fez Charles McGrath, do New York Times, ele contou que colou um post-it no computador que diz: "A luta com o ato de escrever terminou". E que olhar para essa anotação todo dia de manhã o fortalece.

O mundo literário se empenhou em discutir os motivos de Roth, num embate que mobilizou até Elizabeth Gilbert, autora de Comer, Rezar, Amar. Uma tentativa de resumir a história: um escritor estreante abordou Roth num café (o rapaz é garçom do lugar) para entregar um exemplar de seu primeiro livro àquele que considera seu herói.

Diplomático, Roth aceitou a edição e disse para o estreante: "Desista [de escrever] enquanto é tempo". O sujeito relatou o encontro e o conselho que recebeu em um texto no blog da Paris Review. Elizabeth Gilbert, indignada com a postura de Roth, de que escrever é um tipo de tormento, produziu um texto dizendo que era muito feliz e satisfeita por se dedicar à literatura.

O rapaz fez então uma carta aberta pedindo desculpas a Roth por ter armado um circo. Na confusão toda, Roth não se pronunciou. (Estranho, porque ele costumava gostar de um bom embate. Ficou famosa a carta que ele escreveu para a Wikipedia depois que o site não aceitou que ele corrigisse um erro publicado na página a respeito de seu romance A Marca Humana.)

A ironia na saída de cena de Roth, apontada por Adam Gopnik na New Yorker, é que a decisão de parar de escrever atraiu mais atenção que o lançamento de um livro novo poderia ter. O enredo parece ter saído de um livro de Roth – a relevância da obra de um escritor ganha novo fôlego pela recusa em publicar.

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Ainda mais irônico é ler que Roth parece feliz com a decisão que tomou. Na mesma reportagem do New York Times, ele conta que arranjou uma cozinheira e passou a receber pessoas em casa para jantar, algo que não fazia nunca. Até comprou um iPhone para se entreter. Não é exatamente o cenário de um "massacre".

* * * * *

Capítulo "Sétimo Diálogo, de Mentiras, livro de Felipe Franco Munhoz, inspirado na obra homônima de Philip Roth.

– Remoendo bastante?

– Sim, mas ainda carrego dúvidas. São detalhes. Sobre cores, o fio de costura; quando penso no travesseiro que venho fazendo.

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– Detalhes?

– Lugares-comuns, Fazer a festa, Corpo escultural, são aceitáveis? Quais são e em quais situações? Eu sempre costumei evitá-los. Sinto que talvez eu possa fazer a festa, mas se feita em um corpo escultural extrapola. Pequenos detalhes. A linguagem oral, por exemplo. Me chame de Felipe, apresentei-me; ignorando a colocação pronominal adequada e tentando lembrar qual livro começava assim. Isso jamais poderia ser uma fala verossímil. Artificialismo puro. Como ser fiel à linguagem oral?

– É isso o que você quer? Trocar artificialismo por coloquialismo?

– Não sei.

– Quer fidelidade? Primeiro, você deve ter em mente que somos apenas vozes. O fluxo deve ser diferente.

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– Mas Thaís

– Não importa

– Nunca entenderia

– Não importa. Você está excluindo a pontuação final

– Estou

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– E agora? E com esta interrogação?

– Ela pode ficar

– Exclamação também?

– Ainda não pensei o ponto de exclamação

– Resolve? Apagar a pontuação final

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– Teríamos uma fala sobre a outra. Não é assim que as pessoas conversam?

– Teríamos? E as devidas pausas?

– Quando a pausa for maior, fica o ponto mesmo.

– Esqueça. Deixe para o leitor discernir

– Será? E o uso de contrações? Devemos falar como J. Steinbeck, por exemplo? Eu ainda

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– É isso o que você quer?

– Não. Gosto dele, mas.

– Está respondido. Você pode fazer o que quiser. Os personagens de Steinbeck estavam trabalhando

– E estou com as pernas cruzadas sobre a escrivaninha, por acaso?

– Mas temos consciência de que você trabalha em um livro.

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– Entendo.

– Eles têm consciência de estar no mundo.