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Desde o início da era dos blockbusters, cujo marco incial é o estrondoso sucesso de Star Wars (então batizado no Brasil de Guerra nas Estrelas), que o chamado cinemão norte-americano vem se infantilizando. Quase tudo produzido em Hollywood tem a missão de atingir o maior público possível, principalmente os jovens. Como conseqüência desse processo, é possível contar nos dedos o número de filmes adultos que conseguem discutir com profundidade temas sérios e pertinentes.

Houve um tempo, no entanto, em que ainda parecia haver interesse por enredos complexos, dispostos a discutir a condição humana. O subestimado O Pecado de Todos Nós, dirigido em 1967 por John Huston (de O Falcão Maltês e O Tesouro da Serra Madre), é uma prova de que, em algum lugar do passado, Hollywood se ocupou de temáticas espinhosas e incômodas.

Quando digo que o longa de Huston é subestimado, refiro-me ao certo esquecimento ao qual o filme foi condenado nas últimas décadas. Estrelado por Marlon Brando e Elizabeth Taylor, duas das maiores estrelas que o cinema já teve, O Pecado de Todos Nós não costuma ser lembrado entre os principais trabalhos dos atores, vencedores, cada um, de dois Oscars (leia quadro). Esse certo descaso, calculo, deve ter a ver com o fato de o tema central da trama ser um assunto ainda tabu no cinema norte-americano: sexo.

Baseado no romance polêmico de Carson McCullers, durante os 108 minutos do filme não se fala de outro assunto, ainda que seja nas entrelinhas. Quando foi a última vez que você viu um filme norte-americano sério que abordasse essa temática? Pois é, faz tempo.

Exemplar tardio do cinema noir, do qual Huston foi um dos maiores expoentes, O Pecado de Todos Nós guarda do gênero surgido na ressaca do pós-Guerra o pessimismo – em relação às instituições, no caso as Forças Armadas, e ao poder dos indivíduos de reagir contra uma ordem social repressora e limitante.

Embora tenha sido rodado em Roma, na Itália, a ação do filme se passa em um quartel do exército no estado da Geórgia, sul dos Estados Unidos, durante a segunda metade da década de 40. Os personagens centrais são o major Weldon Penderton (Brando, em um dos seus desempenhos mais contidos e interessantes), um homem sensível e sofisticado que esconde sua homossexualidade a sete chaves, e sua esposa, a fogosa Leonora (Liz Taylor), uma jovem mimada e voluntariosa, criada no mundo militar e afeita a peraltices extraconjugais. Os dois vivem um casamento de fachada, conveniente para a carreira de Penderton, mas frustrante para ambos.

O Pecado de Todos Nós, logo na seqüência inicial, cita um trecho do romance que lhe deu origem: "Há um quartel no Sul, onde, há alguns anos, um assassinato foi cometido". Essa informação, diante dos dilemas enfrentados pelos protagonistas, é aparentemente esquecida ao longo da narrativa, para ser resgatada no desfecho da história, dando-lhe um arremate surpreendente. É quase como se toda a trama servisse como uma explicação para o tal crime.

Intenso e perturbador, O Pecado de Todos Nós não é um filme de fácil digestão – afinal, estamos acostumados com o cinema-lazer, que não é feito para incomodar ou mesmo fazer pensar –, mas o longa está entre os títulos mais surpreendentes nas filmografias tanto de Huston como de Brando e Liz Taylor. É importante conhecê-lo. GGGG

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