
Ele costuma dar autógrafos quando entra em algum dos pontos que vendem cafezinho na Rua XV. Também é reconhecido ao sentar em uma cadeira do Hermes Bar, nas noites em que a banda Blindagem é a atração. Do Passeio Público ao Alto da Glória, mesmo em ruas com pouquíssimo movimento, quando passa, algum trauseunte deve se perguntar: "Daonde que eu conheço esse sujeito?" Detalhe relevante: não se trata de nenhum ator de novela, apesar de não serem poucas as mulheres que suspiram por ele e o consideram tão charmoso quanto um galã de cinema. Ele é Alessandro Sangiorgi, 48 anos, o maestro titular e diretor artístico da Orquestra Sinfônica do Paraná (OSP).
Desde 2002 em Curitiba, onde já morou em dois bairros (antes de se estabelecer no Bacacheri), o regente acabou estabelecendo laços com a cidade. Em primeiro lugar, porque está casado com uma curitibana. "De adoção: ela é londrinense." Mais do que isso. Gosta daqui. Compara Curitiba a Paris: lá e cá sente que há espaço, e é possível respirar diferentemente de uma "opressora" São Paulo. Quando não está na, segunto ele, "melhor cidade ao sul do planeta", retorna ao Velho Mundo, onde estão as suas origens e também a sua filha. "A mãe dela é outra brasileira. Desde que conheci o Brasil, me apaixonei pelas brasileiras."
De raízes
Nascido em uma família sem tradição musical, Sangiorgi foi "descoberto" aos 4 anos, em meio aos primeiros jogos, entre o escorregador e a gangorra no jardim de infância. "Alguém percebeu que eu tinha musicalidade." Aos 7 anos, foi estudar piano. "Mas eu não tinha o instrumento em casa. A professora me ensinava e, na aula seguinte, eu conseguia tocar. Comecei a chamar atenção." Cinco anos depois, estaria formado em piano pelo Conservatório de Milão. Em breve, ganhar concursos, mesmo internacionais, seria tão natural como a nota "fá" vir imediatamente após ao "mi".
Nascido em Migliarino, norte da Itália, Sangiorgi não tem a fala em volume de caixa de som de trio elétrico, como o clichê tenta identificar todos os italianos. Mas, mesmo em voz baixa, apresenta aquele gestual marcante que tão bem caracteriza muitos dos nascidos no país de Dante. Uma cena: quando tinha 20 e poucos anos, um professor pediu para ele reger um coral. "Para reger tem de ter dom, é algo que não se aprende." Desde então, tornou-se maestro. Fez até cursos para se aprimorar. Sangiorgi, de certa maneira, corrige o que a vida fez com a sua mãe: se ela não teve oportunidades para desenvolver a própria musicalidade, o filho aproveitaria qualquer acaso para, mais do que improvisar, construir uma trajetória.
Tocar a aldeia
Sangiorgi já assinou pelo menos 150 apresentações como maestro do Teatro Guaíra. A apresentação de hoje da OSP, que tem no programa Aaron Copland, Camargo Guarnieri, Villa-Lobos e Jaime Zenamon, traz a marca do italiano. De Beethoven a Brahms, de Tchaikovsky a Carmina Burana, um dos repertórios que teve mais ressonância foi o encontro da orquestra com a banda Blindagem.
Desde que Sangiorgi viu os Scorpions ao lado da Filarmônica de Berlim, teve vontade de fazer algo similar. Quando conheceu o repertório dos roqueiros paranaenses, não hesitou. Rendeu até um DVD, incluindo apresentações ao ar livre, na Praça Santos Andrade, espaço público onde o maestro gosta de estar quando encontra tempo livre.
Curitiba é assunto que invade, e mesmo atropela, outros temas em meio a um bate-papo com o maestro. Ele busca, e encontra, referências. O tempo todo. Das opções gastronômicas, como churrascarias e culinária japonesa, ao azul do céu. "Diferentemente do Hemisfério Norte, aqui parece que o céu está mais próximo. E é bem mais lindo, sem dúvida."
Outras idiossincrasias
Ele também gosta do cheiro de Curitiba. "Apesar de alguns bueiros do centro da cidade desmentirem isso." Admira o público curitibano, que passou a ocupar praticamente todas as 2.173 cadeiras do Guairão para ver, ouvir e sorver o repertório da orquestra, inclusive nas manhãs dominicais, dentro do projeto Teatro para o Povo.
Aqui, diz ele, tem prazer em usar a batuta, essa espécie de prolongamento da mão do maestro. "Com a ela, é possível induzir os músicos, os bons músicos, a tocar como você quer." Com isso, Sangiorgi estende um elogio aos mais de 60 integrantes da OSP, "ótimos profissionais".
Da Rússia ao Japão, incluindo o Leste Europeu (onde passa a metade do ano devido a compromissos profissionais), Sangiorgi sabe que o reger não é refém de idiomas, antes se faz pelo gestual (aquilo que, nas palavras dele, não se aprende). Um colega sugeriu que ele tentasse exercer a regência sem os braços. Utopia? Talvez não. A receita para se fazer um regente inclui ingredientes como liderança, vocação artística, desejo de estar diante do público, uma inegável musicalidade e, acima de tudo, a capacidade de comunicação. "Você faz um gesto e todos entendem. Entendeu?"
Serviço:
Orquestra Sinfônica do Paraná, sob a regência de Alessandro Sangiorgi. Obras de Aaron Copland, Camargo Guarniere, Villa-Lobos e Jaime Zenamon. Teatro Guaíra (R. XV de Novembro, 971), (41) 3304-7982. Dia 15 (hoje), às 10h30. R$ 30 (platéia) e R$ 20 (1º e 2º balcões). Estudantes, idosos e portadores do cartão Teatro Guaíra pagam meia-entrada.



