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Leila Diniz: comportamento livre, despudorado. Em todos os sentidos | Divulgação
Leila Diniz: comportamento livre, despudorado. Em todos os sentidos| Foto: Divulgação

Nos estúdios

Confira algumas curiosidades sobre a carreira de Leila Diniz:

> O título mais importante na filmografia de Leila Diniz foi a comédia romântica Todas as Mulheres do Mundo, de Domingos de Oliveira (1966), com quem a atriz havia namorado e vivido. Quando o longa, descaradamente autobiográfico, foi rodado, Leila e Domingos não estavam mais juntos. Mas o diretor tentava uma reaproximação. Não obteve sucesso. Os dois, no entanto, permaneceram amigos até o fim da breve vida da estrela.

> Leila fez várias novelas, entre elas o sucesso O Sheik de Agadir (1966), na recém-criada Rede Globo. Janete Clair, no entanto, a vetou quando seu nome foi cogitado para o folhetim Véu de Noiva (1969). Disse que não havia espaço na produção "para uma vagabunda, prostituta" como Leila Diniz.

> O experimental Mãos Vazias (1971), filme do seu grande amigo Luiz Carlos Lacerda, levou Leila ao Festival de Adelaide, na Austrália. Na volta para ao Brasil, a atriz pegou um vôo de Bangcoc (Tailândia) para Nova Délhi (Índia). O avião caiu e explodiu durante o procedimento de aterrissagem, matando Leila aos 27 anos. Sua filha com o cineasta moçambicano Ruy Guerra, Janaína, não tinha completado um ano.

Uma das passagens mais emblemáticas de Leila Diniz, biografia da atriz carioca assinada pelo jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, lançada pela Cia. das Letras dentro da série Perfis Brasileiros, tem como cenário o Aeroporto Afonso Pena, em São José dos Pinhais. Depois de uma rápida visita de negócios a Curitiba, em 1971, a estrela, grávida de sua única filha, Janaína, e a ex-modelo internacional Vera Barreto Leite, sua sócia na grife Doze, também nome de uma butique que tinham recém-aberto em Ipanema, se viram em uma situação potencialmente complicada no saguão de embarque.

Em depoimento a Ferreira dos Santos, Vera conta que Leila, com seu já famoso barrigão, estava com um "vestidinho da Doze, bem micro, golinha de renda, bem ingênuo". As duas entraram em pânico ao se darem conta que "todos os militares graduados do Brasil" pareciam ter marcado encontro no aeroporto. Pior: estavam acompanhados de suas mulheres, que não tiravam os olhos de Leila. "E, aí, aquele silêncio, a gente pensando o que fazer, aquelas senhoras com o olhar fixo na Leila, os homens com cara severíssima", relata a ex-modelo da Maison Chanel, então integrante do Teatro Oficina, do anárquico Zé Celso Martinez Corrêa.

À época, auge do governo do presidente linha-dura Emílio Garrastazú Médici, os militares prefeririam ver o diabo de frente a tropeçar com Leila Diniz. A ditadura a via como "inimiga pública nº 1", sobretudo depois da desbocada e sincera entrevista concedida pela atriz ao jornal O Pasquim, em 1969, na qual desfiou um rosário de palavrões ao falar, abertamente, de sua vida sexual. O Ministério da Justiça chegara a decretar sua prisão, forçando-a a se esconder na casa da família do apresentador de tevê Tupi Flávio Cavalcânti, em cujo programa foi jurada até ser forçada a fugir em plena gravação ao vivo.

Para surpresa de Vera, a saia-justa enfrentada no aeroporto de Curitiba teve um desfecho feliz – e inesperado. De repente, Leila jogou os braços para cima e gritou "Oooooba!!!", um bordão muito utlilizado pela atriz em seus espetáculos de teatro de revista, sensação no Rio de Janeiro no início da década de 70. Para surpresa de todos, as mulheres começaram a aplaudi-la e se aproximaram para dizer que era um prazer conhecê-la e elogiar sua roupa, sem saber que o modelo, um tanto ousado para uma gestante segundo os padrões da época, era fruto da sua imaginação criativa.

Esse episódio, apesar de ocupar apenas uma página e meia da ótima biografia escrita por Joaquim Ferreira dos Santos, colunista do jornal O Globo, é uma breve, porém, exemplar, demonstração do espírito ao mesmo tempo corajoso, espontâneo e impulsivo de Leila, que morreu, aos 27 anos, em 1971, num desatre de avião na Índia. Ela é tratada pelo livro como uma das mulheres mais relevantes na história do país. Alguém que, apesar de filha de pai comunista e muito próxima da militância de esquerda, preferiu fazer sua revolução particular por meio de seu comportamento livre, despudorado. Em todos os sentidos.

Mito

O livro de Ferreira dos Santos, apesar de não ser a primeira biografia de Leila publicada no país, é a mais completa. Dedica-se a, sem se desfazer completamente do mito, emprestar-lhe humanidade, distanciando-a da caricatura. O autor fala da infância e da adolescência da futura estrela, dando especial atenção ao fato de que Leila cresceu acreditando ser filha da madrasta, a severa Isaura, enquanto a mãe, uma mulher frágil, de nome Ernestina, percorreu uma verdadeira via-crúcis após a separação de seu pai, o bancário militante Newton: caiu em depressão e depois contraiu tuberculose, saindo de cena por vários anos.

Na Leila adolescente, o biógrafo encontra indícios da explosão feminina que ela viria a ser. Embora fosse inteligente, não era boa aluna. Preferia o mundo, a praia, aos bancos escolares. O irônico é que se tornaria professora – e das boas e dedicadas – antes de descobrir as artes cênicas. E também já gostava de namorar. Tanto que só não perdeu a virgindade com o primeiro namorado porque o rapaz tinha pudores e fugia do verdadeiro fogo-fátuo e anunciado de seu "broto". A primeira vez (com o compositor Sérgio Ricardo, autor da trilha sonora de Deus e o Diabo na Terra do Sol) aconteceria quando ela tinha 15 para 16 anos.

A iniciação sexual de Leila seria um dos assuntos bombásticos da histórica entrevista dada em 1969 a O Pasquim, episódio descrito em saborosos detalhes num dos melhores capítulos do livro, uma verdadeira lição de história do jornalismo brasileiro que deveria ser obrigatória nos cursos de Comunicação Social brasileiros.

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