
BayCroc referência ao primeiro dono da rede McDonalds, Ray Croc é uma batata que, vendo seus amigos de classe serem aniquilados por grandes empresas de fast food, resolveu sair pelas ruas como guerrilheiro urbano. Cuidado ao virar as esquinas: ele pode estar à espreita munido de sua metralhadora.
"O personagem está sempre na surdina. Tem filosofia e pensamento próprios", diz seu criador, o grafiteiro e estudante de Desenho Industrial Caio*, de 22 anos. Com latas de spray a tiracolo em suas mochilas, ele e Marciel, de 20, também grafiteiro e estudante de Design o Insosso, que é como assina nos muros da cidade saíram pelas ruas com a reportagem da Gazeta do Povo para mostrar alguns de seus trabalhos.
Eles bateram à porta da proprietária da parede onde iriam retocar um grafite já existente para ser fotografado para o Caderno G Idéias. Como ninguém atendeu, puseram mãos à obra. Normalmente, Caio, o mais diplomático dos dois, pede autorização aos donos dos muros em branco que encontram em suas andanças para "pintar". "Tem gente que paga pizza e tem gente que expulsa a vassouradas", conta. Mas pedir muro não é uma prática que vai de acordo com a ideologia do grafite. "A gente prefere ocupar lugares públicos em ruínas, por exemplo", conta Marciel.
Ele e Caio, que quando não desenha o BayCroc assina como Fear (medo, em inglês), trabalham como ilustradores de madrugada. O horário alternativo permite a eles passar quase todas as tardes pelas ruas, à procura do muro ideal. "Que trabalho chato, não?", brinca Caio.
Os dois não pretendem se envolver com o grafite além da mera diversão, apesar de terem iniciado suas trajetórias como ilustradores pintando nas ruas. "Víamos o trabalho de amigos na rua e começamos a fazer também", lembram. No início, a mãe não gostava que Caio saísse "pichando" por aí, mas aos poucos percebeu que o grafite abriu portas ao filho, que quis estudar Desenho Industrial. "Na faculdade, percebo que tenho muito mais possibilidades de criação do que os outros. Mas expor em uma galeria não é meu objetivo, saio para esquecer os problemas."
Fãs da dupla OSGEMEOS, formada pelos irmãos paulistas Gustavo e Otávio Pandolfo, que, saídos do grafite, ganharam as galerias e museus de todo o mundo, Caio e Marciel não pensam em ser como eles. "Eles vêm da rua, seu sucesso é mais do que merecido. Mas o que eles fazem na galeria já não é grafite, é outra coisa", opina Marciel.
Há um senso muito forte de coletividade no universo do grafite. "Quando alguém conhece um muro legal, nunca vai pintar sozinho", diz Marciel. Ele eventualmente sai com um colega, como Caio, para pintar, mas nenhum deles pertence a uma crew (leia quadro). Gostam de sair sozinhos, escolher o local, sentar num canto por uma meia hora e bolar o desenho antes de pintá-lo, o que fazem diretamente com spray.
"O grafite sofre muita influência do lugar, é por isso que não esboço nada antes", explica Caio.
Caio criou seu BayCroc. Marcial desenha bodes e outros animais estilizados. Cada grafiteiro busca uma marca própria como forma de ser identificado pelo grupo e para tornar a pintura mais dinâmica. "Mesmo quando o grafite é autorizado, pode complicar. Até explicar que jacaré não tem pescoço...", conta Caio.
"Tento desenvolver uma linha de traço para ser mais rápido e economizar. Compro sempre as mesmas cores", explica Insosso. Eles reclamam que o spray em Curitiba ainda é muito caro em relação a São Paulo.
Os dois explicam que o que fazem não é o que as pessoas chamam de "piche" as tags retas, letras ponturas espalhadas por toda a cidade. Mas não condenam quem faz. "Cada um tem suas experiências e são elas que formam os diferentes critérios", explica Marciel. "Tudo é expressão na rua, não cabe a nós julgar. O dono da casa fica puto, mas se ele não quer ter o muro pichado, que vá morar em Alphaville", diz Caio.
Cansados de tanta conversa, a dupla se levanta da grama à sombra de uma árvore, no Centro Cívico, e vai encerrando a entrevista sem nenhuma cerimônia. Querem "pintar". Despedem-se e cruzam o canal por onde passa o rio Belém, vislumbrando o dia em que poderão preencher toda a extensão de suas laterais com desenhos.
* Os entrevistados preferem não ser identificados







