| Foto: Luiz Costa/ Gazeta do Povo

Homenagens

A Biblioteca Pública do Paraná abre na segunda-feira a Semana Helena Kolody. Confira a programação:

Segunda-feira (8)

9h – Inauguração da exposição Helena Kolody 100 Anos, com fotografias, poemas e depoimentos da autora.

15h – Diretor Edson Bueno e Grupo Delírio Cia. de Teatro apresentam peça inédita inspirada na obra da autora, no Auditório Paul Garfunkel.

Terça-feira (9)

10h às 11h30 – Exibição de A Babel da Luz, de Sylvio Back.

Quarta-feira (10)

15h às 17h – Exibições de A Babel da Luz.

Quinta-feira (11)

15h – Atriz Kaliupe Sachet apresenta um monólogo sobre a poeta.

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"Quem, entre os jovens, acreditará que fomos jovens também?". A pequena estrofe que encerra o poema "Levam o Amanhecer", da curitibana de sangue ucraniano Helena Kolody, parece antever a percepção de seus leitores sobre sua pessoa. Assim como o gaúcho Mário Quintana, por vezes considerado seu equivalente, pela candura de seus textos, Helena passa a impressão de ter sido a vida toda a simpática e doce senhorinha que arregimentava admiradores por onde passava. "Seus olhos transparentes e seu sorriso largo atraíam as pessoas como a um ímã", lembra a escritora Adélia Maria Woellner, que conviveu com Helena desde a década de 1980, quando a "padroeira da poesia em Curitiba", como escreveu o colega Paulo Leminski, ingressou na Academia Paranaense de Letras, até seu falecimento, em 2004.

Assim como Adélia, outros amigos e fãs que se aproximaram da escritora natural de Cruz Machado, são praticamente unânimes ao exaltar o fascínio por sua figura, segundo eles, indissociável de sua poesia. "É possível ver, em seus poemas, toda sua filosofia de vida", admira-se a escritora.

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Personagem

E, se Adélia Maria Woellner diz nunca ter ouvido da boca da poeta uma única palavra áspera, a recíproca do mundo em relação à Helena também é verdadeira. A personalidade humilde e acolhedora de Helena Kolody, que costumava tratar a todos por "meu filhinho" e "minha filhinha", dificultou o surgimento de detratores de sua obra e, pelo contrário, provocou comoções em diversos artistas. Nunca faltou quem a homenageasse.

Exemplo disso é o compositor curitibano Gerson Bientinez, que em 1992, escreveu a "Valsa para Helena Kolody". "Quis enaltecer esse ícone da literatura paranaense, e foi a melhor música que já fiz. Quando ela ouviu, ficou tão emocionada que passou a me ligar na véspera de cada show que fazia para agradecer a homenagem no repertório."

Registros em audiovisual de suas declamações também não faltaram. Entre os diversos documentários de curta ou média-metragem, estão A Babel da Luz, do cineasta Sylvio Back, feito também em 1992, em comemoração aos seus 80 anos, e Helena de Curitiba, de Josina Melo, que mistura depoimentos da escritora com cenas ficcionais de sua infância e juventude, gravado trinta dias antes de sua morte. "A cada instante, ela cortava o fluxo do diálogo, dizendo, sem afetação, versos inventados na hora ou de seu repertório. Ali me deu o estalo: Helena Kolody é a única e incontornável personagem de seus poemas", conclui Sylvio Back.

Dona Helena

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O escritor e professor Paulo Venturelli começou a conviver com Helena Kolody quando fez a primeira grande análise crítica de sua obra, publicada em 1995 pela Editora UFPR. Idosa e extremamente ativa, a poeta abria os arquivos pessoais e as portas de seu apartamento da Rua Voluntários da Pátria para Venturelli, que a ajudava com as compras e a acompanhava pelas ruas. Em um desses encontros, Dona Helena, como o professor a tratava, lhe fez uma revelação: "Ela havia me dito que só era escritora porque nunca havia se casado na vida. Se tivesse marido e filhos, teria se dedicado ao lar e jamais pensaria em escrever", conta Venturelli. "Eu fiquei chocado, mas também tive uma chave para entender essa poesia mais introspectiva que ela fazia. Percebi que, na obra dela, havia um caráter muito forte de sublimação da vida. Seus poemas eram os filhos que queria ter tido".

Talvez por isso, seus admiradores nunca deixaram de notar o instinto maternal da poeta, nunca explorado pela formação de um lar, mas aflorado por sua vocação como professora normalista – suas ex-alunas mantiveram-se a seu lado muitos anos depois de ter deixado a escola. "Ela amava o magistério, e tinha os alunos como os filhos. Levava o carinho que nutria por todo mundo para a poesia. O rigor de sua obra não é um rigor formal, é um rigor que demonstra essa leveza. Tem uma certa oralidade, uma conversa com o leitor, ela se dirigia a ele como se desse um conselho", explica Venturelli.

Cristalino fio d’água

Em uma obra de incontestável qualidade, feita por uma figura mais do que admirada, fica a pergunta: por que, afinal, Helena Kolody nunca ganhou projeção nacional e se tornou, majoritariamente, uma figura restrita da literatura paranaense? Paulo Venturelli arrisca apontar como culpada a famigerada autofagia curitibana, que não incentiva os potenciais da cidade. "Ela me disse que não se sentia muito valorizada, e que todo o reconhecimento de seu trabalho havia chegado muito tarde. Ninguém fez um esforço para projetá-la", lamenta.

Por outro lado, a própria escritora não buscou o reconhecimento por seus próprios meios. "Ela era uma pessoa muito humilde, e deixou de viajar várias vezes para não abdicar do cotidiano com seus alunos. Ela gostava de ter obras publicadas apenas para poder dar de presente a seus amigos e pessoas próximas de seu relacionamento cultural. Se não fosse pelo Leminski, ela não teria sido reconhecida por aqui", conta a cineasta Josina Melo.

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Talvez, no final das contas, Helena Kolody estivesse focada unicamente em sua produção poética, e não tenha guardado amargor de não ter atingido a representatividade de um Mário Quintana ou um Carlos Drummond de Andrade. Como disse uma vez em seu poema "Fio d’Água", "não quero ser o rio caudaloso que figura nos mapas. Quero ser o cristalino fio d’água que canta e murmura na mata silenciosa".

Helena, o tempo e a viagem

Roberto Gomes, especial para a Gazeta do Povo

O centenário de nascimento de Helena Kolody é uma boa ocasião para lembrarmos que sua obra ainda não foi estudada como merece. Não imagino que se deva fazer uma exaltação de seu valor como poeta, mas que se coloque parâmetros para a leitura de sua obra que, embora não seja muito extensa, é bastante complexa. Nesse texto desejo apenas indicar algumas pistas para seus futuros leitores e estudiosos.

Publicou o primeiro livro em 1941, Paisagem Interior, no qual predomina a busca da vivência subjetiva. Devemos lembrar que o poeta que a atraiu para a literatura foi Taras Shevchenko (1814-1861), considerado o fundador da literatura ucraniana moderna, que sua mãe lia para ela quando ainda menina.

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Em seu primeiro livro encontramos três haicais. Eis um deles:

Os olhos do amado.

Esqueceram-se nos teus

Perdidos em sonho.

Três haicais – o que, acho eu, deve ser considerado espantoso. Lembremos que até aquele momento raríssimos poetas brasileiros haviam se dedicado ao haicai, que passava por ser uma exclusividade e até mesmo uma esquisitice da poesia japonesa. Guilherme de Almeida (1890-1969) é citado como autor e divulgador do haicai na década de 1930. Fanny Dupré (1911-1996) teria sido a primeira poeta a publicar um livro de haicais, em fevereiro de 1949, intitulado Pétalas ao Vento. No entanto, Helena já os escrevia em 1941.

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É verdade que Helena escreveu haicais preciosos, no entanto, o mais importante é ter criado poemas que, embora sintéticos e fulminantes, não são haicais. Alguns têm dois versos, outros quatro ou cinco. O rigor da forma japonesa não foi obedecido. O espírito, sim.

Outro fato chama a atenção. Em 1966, ela publica Era Espacial, explorando uma temática quase jornalística, o que foi julgado, pelos vorazes olhos da província, como coisa não poética. Helena coloca em versos suas aflições e surpresas diante da técnica, das viagens espaciais e da mecanização. Por um lado, a poeta se sente encantada com o espetáculo técnico:

... quatro ...três ...dois

...um...

ignição ...partida!

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Sobe o foguete

Numa explosão súbita de chamas.

O mesmo tema retorna no poema "Motivo Cibernético", do livro Tempo:

Polimultiplurimáquinas

Estriam os nossos nervos

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Nos giros da exatidão.

Há outra característica que precisa ser revalorizada. Trata-se do humor, que tem nela uma forma refinada. Não o poema-piada, que seduziu modernistas, levando-os a algumas brincadeiras gratuitas. Trata-se do humor em sua melhor expressão, como forma de desvendar o mundo. É capaz de rir de si mesma, como em "Epigrama":

No círculo esotérico dos novíssimos, múmia não tem vez.

Ou em "Grafite":

Meu nome, desenho a giz no muro do tempo.

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Choveu, sumiu.

Como é sabido, Helena viveu uma grande desilusão amorosa. Algo que a marcou para sempre. Sobre essa temática organizei uma coletânea, Poemas do Amor Impossível, publicada em 2002, comemorando seus 90 anos. Lá está, em seus versos, o amor jamais realizado, aquele que não foi, que se perdeu no tempo. O quarto poema do livro diz:

Meu amor impossível

Eu sou, na dor que me avassala,

O transeunte solitário perdido na tormenta.

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Dedicou sessenta poemas ao tema, a reconstrução desse amor fracassado, terminando nesse verso que exprime tanto a vitória quanto a derrota final:

Riso, onde soluçam naufrágios.

Daí vem – mas não só daí – o outro lado de sua poesia: o tempo, a morte, o fracasso, e o registro de uma experiência existencial intensa e sofrida. A poeta que sugeria voos transcendentais e etéreos sofre com o tempo e de seu poder corrosivo, o que está presente ao longo de toda a sua obra.

Ferida pelo amor impossível, fez da poesia um caminho de sobrevivência e de autoafirmação, tanto no sentido dos temas que abordou quanto das formas que experimentou:

o poeta nasce no poema, inventa-se em palavras.

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Como consequência, pertence ao rol desses poetas que vivem e incorporam a própria poesia. Por isso conquistava admiradores tanto pelos seus versos quanto pela pessoa que era. O que – e digo isso com cuidado, esperando ser entendido – atrapalhou um pouco as leituras feitas de sua obra. Sua poesia não é o que alguns críticos ranzinzas e alguns admiradores eufóricos imaginam.

É o exercício de uma certa ascese – guiada pelo tempo e pela viagem. É a obra de uma mulher dotada de uma sensibilidade refinadíssima, com suas dores e suas virtudes, com suas contradições e perdas, que soube transformar aquilo que nela era carbono no mais puro diamante.