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Da esq. para a direita: Loz Colbert (bateria), Andy Bell (guitarra), Mark Gardener (guitarra e voz) e Steve Queralt (baixo), juntos após 20 anos | Divulgação
Da esq. para a direita: Loz Colbert (bateria), Andy Bell (guitarra), Mark Gardener (guitarra e voz) e Steve Queralt (baixo), juntos após 20 anos| Foto: Divulgação

Na ativa

O shoegaze pode até ter esmorecido, mas jamais desapareceu. O legado de bandas como Ride e Slowdive é vivo e transparece em grupos que se utilizam daquelas referências noventistas para criar sua própria cena.

De Austin, nos Estados Unidos, há a Ringo Deathstarr, que exala My Bloody Valentine. O trio formado em 2007 fez uma ótima apresentação em Curitiba em 2012, com destaque para a presença (e a voz) da baixista Alex Gehring. O Ringo Deathstarr tem três discos na carreira – o último é Mauve, de 2012.

De Londres, vem a Cheatahs, banda que acabou de lançar seu primeiro disco. O som é um pouco mais entusiasmado, mais vigoroso, do que as bandas clássicas do gênero, embora algumas músicas ressoem um Ride típico.

E Curitiba também tem seus representantes, como o Sonora Coisa. A banda formada em 2010 lançou Lon G, seu segundo disco, na última sexta-feira. E veja como são as coisas: o primeiro álbum dos caras foi produzido por Mark Krammer, sujeito que trabalhou com o Galaxie 500, banda norte-americana que nos anos 1990 costumava dividir palco com o... Ride. O Sonora Coisa toca no dia 21 de dezembro, no Dama Dame.

Para entender o ride

Quatro discos e uma história:

• Nowhere (1990)

Que estreia! Um disco primoroso, que te joga na parede com a força de um Moby Dick alucinado já em "Seagull", a primeira faixa. O álbum chacoalhou a Inglaterra, que ainda ouvia deliberadamente o pós-punk (e isso não era ruim).

• Going Blank Again (1992)

Produzido por Alan Moulder (Depeche Mode, My Bloody Valentine e Interpol). Estão lá as guitarras lancinantes e o baixo hipnótico ("Leave Them All Behind"), e os vocais melancólicos e cíclicos ("Not Fazed").

• Carnival of Light (1994)

Marca a transição do shoegaze para algo diferente que não se sabe bem o que é, e também a tensão no grupo. Não foi bem recebido pela crítica, tão pouco pela banda, que se refere ao disco como "carnaval de merda."

• Tarantula (1996)

Foi deletado do catálogo da Creation Records uma semana depois de seu lançamento. O Ride tenta soar mais contemporâneo. "Castle on the Hill", composta por Bell, faz referência à ausência e ao isolamento de Mark Gardener durante as gravações.

Na estrada

A banda britânica anunicou uma turnê em sete países para 2015:

• Maio

22: Glasgow (Escócia); 23: Manchester (Inglaterra); 24: Londres (Inglaterra); 26: Amsterdam (Holanda); 27: Paris (França); 29: Primavera Sound, Barcelona (Espanha)

• Junho

2: Toronto (Canadá); 4: Nova York (Estados Unidos); 7: Londres (Inglaterra)

  • Os mesmos músicos 20 anos atrás, quando o Ride chacoalhou a Inglaterra com o lançamento de discos-ícones do shoegaze

Holy Yoda! Isso está mesmo acontecendo?", perguntou um sujeito chamado Christopher Cline há alguns dias no Facebook após a Creation Records, um dos selos mais bacanas da Inglaterra, publicar uma foto em sua página na rede social. A imagem era a de um imenso banner – ele cobria vários andares de um prédio – em que se lia "Ride". Significados? 1) A banda inglesa estava confirmada no Primavera Sound, importante festival de música que acontece anualmente em Barcelona. 2) Mark Gardener, Andy Bell, Loz Colbert e Steve Queralt estavam novamente juntos depois de 20 anos, quatro discos e um legado.

A reunião do Ride foi a cereja do bolo no revival definitivo do shoegaze, estilo musical que peleou com o grunge nos anos 1990 e que, basicamente, alia uma barulheira instrumental (há muitos pedais, e então os músicos miram o chão, por isso o "olhar indulgente aos sapatos", na tradução literal) a melodias fantásticas. Porque antes do renascimento da banda de Oxford, outros grupos da mesma laia resolveram se reencontrar, para fazer um dinheiro ou gravar algumas coisinhas. My Bloody Valentine, há pouco mais de um ano, lançou m b v, o tão aguardado álbum sucessor do lindamente barulhento Loveless (1991). O Slowdive, outra banda singular nessa micro-história, anunciou que sairia em turnê neste ano. Pouco antes do Ride, o Swervedriver também avisou que estava na área novamente. 2014, eis um bom ano para comprar um amplificador, um protetor de ouvidos ou um discman.

Por quê?

Bem, no caso do Ride, um fator decisivo para a volta da banda foi a saída de Andy Bell do Beady Eye, projeto de Liam Gallagher (ex-Oasis). Sabe-se que os músicos andavam às turras. Por mais que o cenário não seja tão diferente agora, ao reencontrar o passado o espírito é outro.

Em julho de 2012, Andy Bell (guitarrista do Ride) e Mark Gardener (vocalista e guitarrista), concederam entrevista à Gazeta do Povo, por causa dos 20 anos do disco Going Blank Again, o segundo da carreira do grupo. Foram questionados sobre um possível retorno. "Sinto falta de ter 20 anos e de ser um cara que faz shows com uma banda como o Ride. Mas não é tanta falta assim. Estou feliz aqui e agora", respondeu Mark, citando "Here and Now", música de Nowhere, o primeiro e irretocável disco do grupo. "Nós não estávamos mais caminhando na mesma direção e com as mesma forças. Aquele não era mais um ambiente saudável," finalizou o músico, deixando claras as diferenças entre os dois compositores de uma banda, segundo os próprios, de carreira "curta e doce, autodestrutiva e perfeita."

É dinheiro, mas não só. Há uma clara diferença entre o revival de grupos importantes, mas nem tão conhecidos, caso do Ride, e os que se amontoam de supetão para celebrar uma efeméride ou ganhar uma grana fácil em turnês nem tão boas assim. Talvez, e este é o sentimento compartilhado por fãs, o que mova o Ride hoje, apesar das diferenças, é a mesma coisa que fez com que esses quatro sujeitos alcançassem o verdadeiro sucesso de músicos e artistas: atravessar gerações sem soar anacrônico, o que pode ser resumido em ser honesto consigo mesmo, inclusive na hora de parar. "Somos uma banda muito obsessiva", disse Mark em entrevista à revista New Musical Express dia desses. "Dá muito trabalho gravar e tocar do jeito que consideramos bom o suficiente."

Para quem?

O Ride foi formado em 1988, em meio a bandas como Talulah Gosh, The Anyways e Shake Appeal (a futura Swervedriver). Eram muitas as qualidades. Mesmo antes do britpop de Oasis e Blur, por exemplo, o Ride já tinha "Twisterella" na manga. Guitarras ácidas, um baixo reconfortante e um baterista definido como o Keith Moon do shoegaze (imagine!) davam asas a letras precisas. O Ride, enfim, tinha (tem) a capacidade de cingir poder e sensibilidade. Um caso raro.

O resultado foi não só a influência em grupos como Supergrass – também de Oxford – e até Radiohead, mas declarações espontâneas que fazem esse reencontro ser ainda mais importante. "Naquele período, de 1991 a 1993, Ride era a minha banda favorita. Quer dizer, uma das minhas bandas favoritas de todos os tempos", afirma Robert Smith, vocalista do The Cure, no documentário Beautiful Noise, dedicado ao shoegaze. Mais: o primeiro minuto de "In My Place", hit do Coldplay em 2002, é, digamos, descaradamente "chupado" de "In a Different Place", terceira música de Nowhere.

No anúncio de retorno, há alguns dias, a banda citou David Crosby (The Byrds, Crosby, Stills & Nash), que um dia disse: "A primeira banda é como o primeiro amor; você nunca esquece, e você nunca se sente do mesmo jeito em outra banda." A explicação para a reunião pode ser essa. Para além dos caça-níqueis e problemas pessoais, uma vontade simplesmente incontrolável de fazer o que se gosta.

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