Entre os rumos da política nacional, os pequenos grandes problemas da vida doméstica e os maus humores do clima, existe um assunto que se faz presente em nove de cada dez conversas em família, no trabalho ou nas mesas de bar: séries. Já viu “Stranger Things”? Que achou da última temporada de “Black Mirror”? Não me venha com spoilers de “Game of Thrones”! Difícil encontrar alguém que não acompanhe com afinco pelo menos um desses programas.
Os números estão aí para comprovar a extensão desse vício compartilhado por cada vez mais pessoas. Segundo a FX Networks, que faz o acompanhamento da produção desses programas, 2016 termina com aproximadamente 450 produções do gênero, distribuídas entre emissoras de TV e serviços de streaming (como Neflix e Amazon). Para 2017, a previsão é que esse número chegue a 500. O grande hit de 2016, a sexta temporada de “Game of Thrones”, teve nada menos que 23 milhões de espectadores (de forma legal ou não) ao redor do planeta.
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Emplacar um blockbuster, porém, não é tarefa para amadores. Se no cinema a responsabilidade maior está nas mãos do diretor, nas séries o toque de Midas fica a cargo dos roteiristas. São eles os responsáveis por aquele sentimento a cada final de episódio, de querer passar diretamente para o próximo, ou de escolher outra coisa para assistir. Parte das artimanhas desses profissionais é revelada no livro “Na Sala de Roteiristas”, de Christina Kallay, em que ela entrevista os autores de algumas das séries americanas de maior sucesso.
O foco de Christina, na verdade, são os showrunners, profissionais que comandam o time de roteiristas responsável por escrever as séries. Cada um tem seu método, mas o trabalho é o mesmo: acompanhar a produção de todos os roteiros, escrever, revisar, apresentar e colher ideias, de modo que os episódios mantenham a unidade. Nas palavras da autora, fazer com que “a série tenha uma voz, que transmita a impressão de que foi escrita por uma pessoa”.
“Toda a edição é minha. Reescrevo todos os episódios também, sempre faço a revisão final de cada um deles. Um showrunner pode reescrever de 10% a 100% de um episódio. Depende do que recebi, de como o rascunho chegou, do grau de exaustão do roteirista, do tipo de pressão que estou sofrendo”, explica no livro Warren Leight, produtor, roteirista e showrunner de “Law & Order”.
São os showrunners que comandam as chamadas salas de roteiristas, procedimento comum às séries americanas. Nada mais são do que reuniões periódicas em que os autores discutem ideias para a série antes de elas irem para o papel. A quantidade de roteiristas que trabalham em uma produção pode variar de cinco até 15. A forma como são conduzidas e a frequência com que acontecem as salas também mudam conforme o programa. Bem como as opiniões sobre sua eficácia.
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“O que funciona para mim é eu me sentar com cada roteirista que vai escrever determinado episódio, só ele e eu”, opina Tom Fontana, produtor de “Os Bórgias”, que diz nunca fazer uma sala de roteiristas “típica”. Já Janey Leahy, roteirista de “Gilmore Girls”, acredita que a sala de roteiristas “é tudo”. “Não apenas pelas histórias individuais que cada roteirista traz, mas pela explosão de narrativas que acontece em resultado da reunião dessas pessoas”.
Charlie Rubin, que foi roteirista-produtor de “Seinfeld”, resume a polêmica: “Sem dúvida há boas salas de roteiristas e bons programas de salas, mas nunca há apenas uma maneira de fazer um programa”.
Seis passos para fazer uma série cair nas graças dos espectadores
Nada de enrolação
Não é porque uma série tem vários episódios e temporadas que é permitido se alongar na narrativa. Pelo contrário. Alguns minutos mal aproveitados já são suficientes para diminuir o interesse do espectador pela história, como observa Robert Carlock, que tem no currículo “Friends” e “Unbreakable Kimmy Schmidt” . “Não há espaço ou tempo para o luxo de cenas que não fazem a história avançar. Se uma cena não lhe está dando informação nova e as pessoas nela não têm atitudes claras, há algo errado. Talvez a estrutura da cena esteja errada ou talvez as pessoas erradas estejam conversando umas com as outras”.
Cada um no seu quadrado
Como no reino das séries quem dá as cartas são os roteiristas, o perfil dos escolhidos pesa bastante na hora de formar o time. Jenny Bicks, roteirista e produtora executiva de “Sex and the City”, cita um programa em que a ideia era fugir do lugar-comum. “Será que iríamos querer, por exemplo, dramaturgos, pessoas que não têm muita experiência com TV, mas trabalham bem com personagens? Porque, quando você é treinado dentro de certo sistema por tempo demais, adquire alguns hábitos ruins. Se você é bom em sitcom, não é necessariamente capaz de fazer um ótimo programa baseado em personagens.””
Liberte sua mente
É quando os roteiristas ainda estão trabalhando no esboço dos episódios que a narrativa começa a ganhar corpo. Esse é o momento para soltar a imaginação. “Eu não digo ‘isto é o que quero’, porque, se você diz a outro roteirista ‘isto é o que eu quero’, é aquilo que você terá, e não quero que me entreguem de volta cenas que eu mesmo poderia ter escrito. Quero que alguém me dê algo que me faça dizer: ‘nunca pensei nisso, essa abordagem é sensacional para a cena, aquele diálogo está simplesmente genial, um assombro’”, diz Tom Fontana, produtor de “Os Bórgias”.
Estrutura cinematográfica
Tanto em termos de episódio quanto de temporada, tem sido comum aos roteiristas das séries pensá-las na estrutura cinematográfica, de três atos. Isso ajuda a estabelecer uma linha narrativa coesa. “A história não começa antes da metade do caminho. Temos muito pouca informação. Ela é satisfatória em termos narrativos e criativos? Há surpresas, temos uma complicação no segundo ato – que frequentemente é o segundo comercial, se você está fazendo três atos... Se você está no segundo de dois atos e nada está acontecendo, há alguma coisa errada”, observa Robert Carlock.”
Ter uma voz
Jenny Bicks conta que de uns anos para cá foi adotada a figura do diretor principal, que dirige mais episódios que os outros e orienta os demais. “Você não quer que ele [o programa] pareça completamente diferente a cada semana”, argumenta. Para isso, é fundamental ter “a mesma voz contando a história”, como diz Terence Winter, produtor executivo de “Família Soprano”. “A razão pela qual eu filtro pela minha lente é a necessidade de que pareça a mesma série de televisão do começo ao fim. Serão histórias diferentes e diferentes temas, mas precisam parecer coerentes na maneira como são contadas e na voz com que são contadas.”
Respeito aos personagens
Um dos pilares que sustentam uma série é o apego dos espectadores aos personagens. Por isso, é preciso que, tanto quanto a história, eles sejam respeitados, sem parecerem pessoas diferentes. Para Margaret Nagle, roteirista e produtora de “Boardwalk Empire”, isso inclui saber a hora de colocá-los ou não em determinadas situações. “Criamos as histórias de cada personagem. E depois você quer ter uma ideia de como esses personagens se ajustam uns aos outros. Assim, podemos remover uma trama que não funciona em certo episódio, e guardá-la para outro, porque é uma história sobre ela que realmente queremos contar.”
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