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| Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo/Arquivo

Há pouco tempo era impossível imaginar que as ruas de Curitiba se encheriam de purpurina, serpentina e samba logo nas primeiras semanas do ano. Porém, mesmo com a fama de cidade que não gosta de carnaval, os tempos estão mudando. Quem é de folia, sabe: o pré-carnaval da capital não deixa a desejar. E a programação animada que antecede um dos feriados mais aguardados do ano pode ser remontada a um bloco, o Garibaldis e Sacis, que comemora 20 anos de uma história colorida em 2019.

As celebrações começaram com um ensaio especial no Terreiro Pai Maneco, com direito à presença do maranhense fundador do bloco, Itaércio Rocha. Dessa turma inicial, o único que ainda está envolvido na diretoria do grupo é Pedro Solac, presidente e mestre da bateria. A ideia nasceu durante uma conversa entre amigos sobre a lendária inexistência do carnaval curitibano. “Curitiba tem carnaval. Só não é comparável ao do Rio de Janeiro, mas acontece”, aponta Solac. “Nós decidimos continuar brincando que Curitiba não tem carnaval e fazer um bloco que não sai no carnaval”.

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As primeiras saídas ocorriam aos domingos, logo depois do final da Feira do Largo da Ordem, para atrair o público que já estava por ali. “No começo a gente saiu só na voz. Aí, no outro ano, teve megafone. No outro, fizemos em cima de um carrinho de supermercado, com uma bateria de caminhão. No outro ano, uma Fiorino com a porta de trás aberta. No ano seguinte, uma Kombi. Em alguns domingos eram 200 pessoas, 500 pessoas, até chegar a alguns que tinha 10 mil, 15 mil pessoas”, diz ele.

Ao longo do tempo, a fama do bloco chega a trazer pessoas do interior do estado para aproveitar o pré-carnaval na cidade. “Há seis anos, a gente está com esse desenho do trio elétrico na Avenida Marechal Deodoro e no Sítio Cercado – é uma conquista para a gente não fazer só no Centro, descentralizar a festa”, conta o músico e arte-educador. Além dos grandes desfiles, o bloco também tem saídas menores, que não são divulgadas com antecedência justamente para não juntar multidões.

Ofegante epidemia

Marcelo Andrade/Gazeta do Povo/Arquivo

Mesmo começando sem muita parafernalha além da vontade de fazer música e brincar, o Garibaldis e Sacis mudou a cara da cidade. Hoje, a festa de rua toma quase todos os finais de semana que precedem o carnaval, com diversos blocos – todos, de uma forma ou de outra, herdeiros do Garibaldis.

Um exemplo é o do relações públicas Pedro de Oliveira. Encantado com percussão desde criança, juntou a experiência de ex-integrante de bateria universitária com a vocação de folião e procurou Itaercio Rocha. “Em outubro de 2016, eu entrava pro Garibaldis e Sacis. Hoje, além do GeS toco nos blocos 10afinados & Daí, Burlesco Cachorras e Brasilidades”, diz o percussionista. “Percebi nesses dois carnavais passados que o número de blocos na cidade tem crescido e, consequentemente, aumenta o número de foliões. São blocos com inúmeras bandeiras, cores e formas de resistência. A defesa pela cultura que acontece nas ruas, com os blocos é linda!”

O próprio Pedro Solac participa de mais quatro blocos e Marcel Cruz, o cantor do Garibaldis há dez anos, de mais um. “A gente desfaz essa falácia de que Curitiba não tem carnaval, prova que tem e sempre teve, e as pessoas vão ficando mais engajadas com a festa. Agora têm pelo menos mais dez blocos na cidade. Isso significa um trabalho que germinou e está dando frutos”, opina Cruz. “A gente está muito feliz com esse movimento e quer que tenha muito mais blocos na cidade”.

“Tudo isso de que o Garibaldis faz parte é a construção de uma nova cultura”, explica Solac. “A cidade aprendeu a ir pra rua e o Garibaldis fez parte desse movimento para entender que a rua é o lugar do cidadão”.

Em 2019, até mesmo o desfile das escolas de samba de Curitiba será maior, dividido em dois dias, 2 (sábado) e 3 (domingo) de março. “Isso já demonstra que o carnaval de Curitiba não é vazio, está cada vez mais cheio e que não comporta mais [o desfile] em um dia só”.

Um pierrot apaixonado

E de avenida cheia Solac entende bem. Uma das maiores saídas do Garibaldis ocorreu há três anos, lotando a Avenida Marechal Deodoro com aproximadamente 35 mil pessoas para celebrar o casamento de Pedro e Nathalie Cunha Solac. Os dois, que se conheceram no Garibaldis, tiveram essa ideia meio de brincadeira e resolveram perguntar se os outros integrantes do grupo topavam. A aprovação foi geral e assim começava a organização de um evento que ficou para a história do pré-carnaval curitibano.

Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Ele foi fantasiado de maestro, ela de bailarina. Ele de vermelho, ela de amarelo - as cores do Garibaldis. Os pais da noiva foram vestidos de rei e rainha. Os pais do noivo, de cigana e pirata. As madrinhas viraram fadas madrinhas e os padrinhos tinham cartola e cravo colorido na camisa. O juiz de paz oficializou a união em cima do trio elétrico. “Foi o casamento com mais convidados da história”, brinca Cruz, que lembra a data como um dos momentos mais marcantes de sua passagem pelo bloco. “Foi bem bonito”.

Pedro e Nathalie não tiveram a recepção tradicional, com jantar e bolo com bonequinhos vestidos de branco no topo. Mas não dá para dizer que não tiveram uma festa e tanto. “Depois do ‘sim’ fui apitar [à frente da bateria], porque teve desfile normalmente”, conta o presidente do bloco.

Me dá um dinheiro aí

Ainda não existe a conta de quanto dinheiro todos os finais de semana de pré-carnaval movimentam em Curitiba, mas não é pouco. Uma caminhada pelas lojas do Centro da cidade mostra que a folia cresceu mesmo, com cada vez mais fantasias, adereços e tecidos brilhantes tomando as vitrines – cena que não era tão frequente quatro ou cinco anos atrás. “Alguns nichos, como os bares, sabem que [os blocos] dão lucro”, diz Solac. Mas a geração de renda não para por aí. “Tem uma quantidade de gente que faz camiseta [dos blocos], tem as costureiras e os tecidos [das fantasias]. Tudo isso gera lucro. Têm ainda as vendas de glitter, confete, serpentina, perucas – isso sem contar técnicos de som, equipamento, pneu, borracharia, combustível”, enumera.

Os instrumentos usados pela bateria também precisam de manutenção e reposição, que, no passado, ocorria uma vez por ano - agora, já são três. “As baquetas vivem quebrando! Há 20 anos, a gente tocava três ou quatro surdos, duas ou três caixas e um chocalho. Hoje a bateria tem 70 pessoas”.

Henry Milleo/Gazeta do Povo

O canto da cidade

Nessas duas décadas, o Garibaldis e Sacis mostrou que é possível fazer festa para qualquer pessoa. Os desfiles em avenidas se revezam com eventos menores e temáticos: tem o dia dos heróis, de ir à praia, de ser quem você quiser, das fantasias tradicionais, dos bebês, o Garibaldinhos para as crianças e a Garibanda para eventos privados. “É para todo mundo: família, criança, vovó, vovô, titia. Quem quiser estar com a gente, é só chegar”, convida o cantor Marcel Cruz. Ao longo do ano, o grupo também faz o Arraiá da Anita, durante as festas de São João, e do Sarau do Saci, celebrando a primavera.

Isso tudo deixa uma marca na capital. “O Garibaldis representa a possibilidade de brincar na rua e mostra que a preparação para o carnaval é uma grande festa”, analisa Solac. “O bloco é uma peça que se tornou parte da cidade e faz ela pulsar. Então, acho que ele é uma espécie de segundo coração. Uma Curitiba sem Garibaldis tem menos graça”, diz Cruz.

As comemorações do aniversário do bloco ainda vão longe. O Garibaldinhos fará duas festas, uma no dia 25 de janeiro, a partir das 18h30, no Memorial de Curitiba, outra na tarde de 3 de fevereiro, na Praça João Cândido. No dia 17 de fevereiro, o trio elétrico do Garibaldis e Sacis desfila na Avenida São José, na regional do Bairro Novo, e, no dia 24 de fevereiro, é a vez da Avenida Marechal Deodoro, no Centro. Também há uma apresentação a ser agendada na Vila Torres, junto do Bloco Afro Pretinhosidade e das meninas da Bloca Ela Pode, Ela Vai.

Além dos blocos de rua, o carnaval de Curitiba tem programação para todos os gostos. Para quem é de assistir, tem desfile das escolas de samba. Para quem é de rock, tem o Psycho Carnival. Para quem é do terror, tem a Zombie Walk. É só escolher a sua tribo e aproveitar a folia.

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