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 | Henry Milleo / Gazeta do Povo
| Foto: Henry Milleo / Gazeta do Povo

As medidas do ajuste fiscal, anunciadas pelo governo federal, são insatisfatórias, já que em linhas gerais, o pacote se baseia no aumento de impostos – principalmente na volta da CPMF – para aumentar receitas. O governo deveria focar na venda de participações acionárias de empresas públicas e também em viabilizar parte do programa de concessões. Esta é a avaliação do doutor em economia pela Universidade da Califórnia e ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Gesner Oliveira, hoje sócio da consultoria Go Associados. Em entrevista à Gazeta do Povo, Oliveira defende também que o Brasil precisa rever as regras da Previdência.

Como o senhor avalia as medidas de ajuste fiscal anunciadas pelo governo?

O aspecto positivo é que houve uma ação rápida depois do rebaixamento do risco de crédito do Brasil pela Standard & Poor’s. O aspecto negativo é que o conjunto de medidas está baseado no aumento de impostos e não no corte de gastos. Além disso, as propostas têm caráter muito emergencial e não tocam em nada nas questões estruturais. É um pacote ainda insatisfatório, mas abre a negociação em torno de algo que precisa ser feito rapidamente.

E a escolha da CPMF para ajudar no rombo da Previdência?

Eu acho que o país já tem uma carga tributária que é maior que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e também é uma das maiores da América Latina. Além disso, está completamente fora da curva, dado o nível de PIB per capita do Brasil. A CPMF é um imposto que retira a competitividade da economia e não guarda relação com lógica econômica. Também é um imposto regressivo, que trata igualmente desiguais. Então, sob todos os pontos de vista, a CPMF não é adequada.

O que precisaria ser feito?

Há pelo menos duas áreas que o governo deveria olhar com muita atenção. Primeiro, o tamanho do estado está exagerado. Então acho que o governo deveria considerar a venda de ativos. O segundo é olhar seriamente para as mudanças estruturais na Previdência, em particular, para a elevação para a idade mínima da aposentadoria.

Quais estatais o senhor acha que a venda de ativos traria bons resultados neste momento?

Eu não acho que seria a hora de vender grandes empresas, mas é um bom momento de vender participações acionárias de empresas. O programa de desestatização da Petrobras deveria ser acelerado. A abertura de capital da BR Distribuidora seria muito oportuna. Certamente a Caixa também tem participações que poderiam abrir capital. Isso tudo é algo que tem que respeitar todas as regras de governança, mas que não depende da aprovação do Congresso.

Como o senhor avalia a participação do Congresso na aprovação das medidas?

Eu acho que está colocado um desafio agora para o Congresso. E acho também que eles deveriam reagir de uma forma responsável e pensar em melhorar as medidas. Ou até mesmo em propor outras medidas que tenham o efeito de eliminar o déficit e superar essa dificuldade de curto prazo. Quer dizer, o Congresso não pode se furtar a se colocar como corresponsável no enfrentamento da crise.

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O senhor acredita no caráter provisório da CPMF?

Não acredito em imposto temporário. Minha experiência mostra que aquilo que é tido como imposto temporário em geral dura muito tempo. O rombo da Previdência não será resolvido sem uma reforma profunda no sistema e sem a mudança das regras que hoje colidem com a realidade demográfica. É impossível ter uma idade de aposentadoria tão precoce no Brasil. É um luxo que acaba refletindo negativamente sobre a situação fiscal e consequentemente prejudica os mais pobres.

Há alguma expectativa para que ocorram essas mudanças estruturais que a Previdência precisa?

Eu torço para que isso aconteça, mas francamente acho um debate difícil. Acho que a apresentação do pacote já é um avanço. Chegamos no estágio em que o paciente reconhece que precisa de tratamento. Agora só falta o outro passo, que é procurar o tratamento. As pessoas falam em medidas amargas, medidas duras, mas o mais duro é ficar como está. Porque como está o custo de capital vai ser brutal, o investimento vai para baixo e a economia vai afundar.

O que acontece se a CPMF não passar?

Ninguém tem bola de cristal, mas acho que nesse momento estamos na disjuntiva. Devemos tomar o caminho de negociação entre o Executivo e o Legislativo em torno das medidas que nos evitem um novo rebaixamento de risco. Acredito que a combinação desse pacote aprimorado e o programa de concessões nos leva para uma rota de retomada. O outro cenário é um desastre econômico. Se não conseguirmos reativar em nada o investimento e não eliminarmos o rombo nas contas públicas, aprofundaremos muito a recessão com um desempenho sem precedentes na história economia.

As medidas apresentadas tornam a perspectiva de curto prazo do Brasil mais positiva, mas pode-se dizer que são suficientes para controlar o aumento do endividamento público?

A economia brasileira é como um acidentado na beira da estrada. O ajuste é o torniquete para levar para o pronto-socorro. O próximo passo são os primeiros socorros como a eliminação de uns desperdícios mais evidentes. O corte de 39 para 20 ministérios seria um efeito simbólico importante. Além disso, o país precisa de um programa de redução de quadros e despesas, um cronograma de venda de ativos e também as mudanças nas regras da Previdência.

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