O professor Gerd Sparovek, da USP; o jornalista José Rocher, da Gazeta do Povo; e o advogado Leonardo Papp (da esquerda para a direita) discutiram ontem, no Papo de Mercado, as novidades previstas para o Código Ambiental| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo

Reservas

Compensação anima setor florestal

Breno Baldrati

Empresas de base florestal estão animadas com a possibilidade da criação de um mercado de reservas ambientais caso o novo Código Florestal seja aprovado. Em geral, segundo a lei vigente, o agricultor paranaense deve manter 20% de sua fazenda coberta com floresta nativa. O novo código vai ampliar a possibilidade de compensação, por arrendamento de cota de reserva ambiental. A obrigação de manter reservas em território próprio deixa de existir. Assim, um agricultor do Paraná poderá usar os 20% da terra antes destinada a floresta nativa para cultivo, e comprar cotas numa outra região, onde a produtividade não seja tão grande.

"Esse vai ser um avanço muito grande. Surge uma oportunidade de mercado importante, e que é de interesse de todos. Vai valorizar o ativo, a reserva, que antes era só ônus para o proprietário", diz Carlos Mendes, diretor-executivo da Associação Paranaense das Empresas de Base Florestal (Apre), que esteve no Papo de Mercado.

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Polêmicas

Confira as opiniões dos convidados do Papo de Mercado sobre alguns temas relativos ao novo Código Florestal:

Déficit ambiental

"Para recompor 87 milhões de hectares de vegetação, como prevê o Código atual, seria necessário gastar um valor que equivale ao dobro do PIB agropecuário. Isso é ficção, esse passivo ambiental não é resgatável", segundo Gerd Sparovek. "Hoje o Brasil tem 63,18% de seu território preservados. O Código atual, se colocado em prática, preservaria 62,58%. Existem 104 milhões de hectares preservados sem exigência legal", lembra Papp.

Estadualização

"A tentativa de Santa Catarina de legislar na área ambiental foi como um grito de basta. A própria Constituição prevê que o governo federal defina apenas normas gerais", opina Papp. "Os estados que têm estoque de vegetação são os estados mais pobres. Minha preocupação é que eles afrouxem a legislação para atrair investimentos do setor agropecuário", afirma Sparovek.

O Brasil tem a chance de reverter seu déficit de preservação ambiental com a reforma do Código Florestal. A avaliação parte dos especialistas Leonardo Papp e Gerd Sparovek, que integram os grupos de discussão sobre o assunto em Brasília e participaram ontem da 2.ª edição Papo de Mercado, promovido pela Gazeta do Povo, que reuniu cerca de 150 pessoas em Curitiba. Eles consideram que, se a legislação atual fosse aplicada, o país teria de recompor 87 milhões de hectares devastados. Porém, há 104 milhões de hectares de vegetação nativa desprotegidos que podem ser preservados a partir de mudanças na legislação.Os dados fazem parte de um estudo da Universidade de São Paulo (USP) – Vegetação Natural e Dinâmica da Agropecuária: Efeitos de Alterações do Código Florestal. Gerd Sparovek, pós-doutor em Agrono­mia e um dos autores da pesquisa, relatou que o déficit ambiental brasileiro soma 44 milhões de hectares de áreas de preservação permanente não conservadas e 43 milhões de hectares de reservas legais ainda não instituídas pelos proprietários das terras. O total de 87 milhões de hectares equivale a 21 vezes a área de soja do Paraná.

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"O eixo central do novo código florestal é a moratória prevista no artigo 47, que diz que, por cinco anos, não pode haver supressão da vegetação nativa", destacou o mestre em Direito Ambiental Leonardo Papp, que assessora a Organização das Cooperativas do Brasil (OCB) e é professor universitário em Santa Catarina. "A legislação atual torna área produtivas ilegais e não protege áreas preservadas", pontuou.

A proteção dos 104 milhões de hectares preservados dependem não só da legislação federal. A expectativa é de que, durante a moratória ao desmatamento, os estados formulem Planos de Regularização Ambiental (PRAs) regionais. Para Sparovek, o prazo de cinco anos é curto para a tarefa. Em sua avaliação, a moratória deveria ser estendida a 15 anos. A modificação depende de discussão no Congresso Nacional.

As discussões que vêm ocorrendo em todo o Brasil a respeito da reforma no Código Florestal devem contribuir para a definição de uma legislação mais realista, disseram os especialistas. O relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) aprovado na Comissão Especial da Câmara no início do mês é apenas um ponto de partida, disse Papp. O documento vai a plenário e depois para o Senado. Ao longo desse trajeto, os parlamentares podem sugerir modificações e só depois da votação dessas mudanças é que o texto, finalmente, segue para sanção presidencial.

Agricultura

A preservação das áreas de vegetação nativa desprotegidas não vai limitar a expansão da agropecuária, disseram os especialistas. Eles afirmaram que há 61 milhões de hectares de pastagens degradadas que podem ser aproveitados pela agricultura. A pecuária pode expandir suas atividades em área menor que a atual aumentando em 50% a taxa de ocupação, que hoje fica perto de uma cabeça de gado por hectare.

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Sparovek e Papp divergem a respeito da proposta que desobriga pequenos produtores rurais da recomposição da reserva legal. Para Papp, a mudança beneficia a agricultura familiar e é essencial para estados como Paraná e Santa Catarina. Sparovek frisa que as regiões onde predominam pequenas propriedades são grandes e podem se tornar corredores desprovidos de reserva verde.

O déficit de reserva legal é de 43 milhões de hectares, 17% do total previsto no Código Florestal em vigor. O índice é bem inferior ao déficit referente às APPs, que é de 43%, ou 44 milhões de hectares. Segundo os especialistas, o Paraná tem déficit de 1,5 milhão de hectares de APP e de 2,02 milhões de reserva legal. O estado ainda poderia ampliar a agricultura em 1,43 milhão de hectares na região do Arenito Caiuá (Noroeste).