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Indústrias que necessitam de energia à pronta entrega pagam agora R$ 681,36 o MW/h | André Rodrigues/ Gazeta do Povo
Indústrias que necessitam de energia à pronta entrega pagam agora R$ 681,36 o MW/h| Foto: André Rodrigues/ Gazeta do Povo

Bom negócio

Empresas autossuficientes em energia estão vendendo o excedente

Se o risco de racionamento e o custo da energia têm tirado o sono de parte do setor industrial, algumas empresas estão rindo à toa com a venda do excedente da energia que produzem. É o caso da Ibema, fabricante de papel-cartão com sede em Turvo, na Região Central do Paraná.

Dona de duas pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que juntas somam quase dez megawatts (MW), a empresa é autossuficiente na produção da energia que precisa. O que sobra – cerca de dois MW – é vendido no mercado livre. "Se tivéssemos que comprar energia pelo preço praticado hoje no mercado livre seria melhor parar a fábrica. O preço está tão alto que tem empresa diminuindo a produção para vender energia", diz Clécio Chiamulera, diretor financeiro da Ibema.

A crise do setor elétrico não impactou as finanças da empresa, mas acabou limitando um investimento que tem potencial para aumentar em cinco vezes a capacidade de geração de energia da Ibema. Segundo Chiamulera, o projeto estimado em R$ 240 milhões foi engavetado. "A MP 579 [que baixou o preço da energia] bagunçou o mercado de energia e assustou os investidores. Não vamos investir porque não sabemos as regras do jogo daqui para frente", diz.

Exemplos

Enquanto algumas empresas temem o racionamento de energia, outras comemoram contratos de fornecimento de longo prazo:

• Preocupação

Na Incepa, em Campo Largo, o gasto com energia corresponde a um quarto do custo total de produção. A empresa trabalha com 20% de gás natural e 6% de energia elétrica para movimentar a fábrica. "A nossa preocupação não é apenas em relação ao preço, impactado pelo custo das térmicas, mas também em relação à falta de energia", diz Celso Cavalli, presidente da Incepa. Até agora, o governo subsidiou as distribuidoras com aportes altíssimos, mas essa conta vai chegar ao consumidor. "A energia está na nossa lista de preocupações, mas não podemos comprometer nossos investimentos por conta desse cenário", afirma Cavalli.

• Contrato

Desde março deste ano, a Brafer Construções Metálicas, de Araucária, compra energia no mercado livre. A empresa conseguiu negociar um contrato de cinco anos antes de o preço disparar. "Estávamos estudando a viabilidade há quatro anos. O mercado livre não tem horário de ponta", afirma Aldy Marcelo Pacheco, diretor de expansão da Brafer. As duas plantas, uma em Araucária e a outra no Rio de Janeiro, vão operar com energia do mercado livre. A outra fábrica, que está sendo implantada em Juiz de Fora, vai funcionar inicialmente com energia do mercado cativo.

A disparada dos preços da energia por causa da escassez de chuvas e do funcionamento das usinas térmicas já causa impacto nos planos da indústria brasileira, que está revendo e até adiando investimentos. Grandes empresas que compram energia no mercado livre – espécie de bolsa que comercializa energia diretamente do gerador em contratos de curto (até seis meses) e longo prazo (acima de seis meses) – estão pagando valores exorbitantes.

INFOGRÁFICO: Veja informações sobre os preços cobrados pela energia no mercado

Para fornecimento nos próximos dois anos, por exemplo, os contratos de compra e venda estão sendo negociados na casa dos R$ 300 o megawatt/hora (MWh), o dobro do preço médio pago há cerca de oito meses. A situação é ainda mais crítica para quem precisa de energia no curto prazo, como é o caso de indústrias que têm parte da sua demanda contratada (com garantia de fornecimento) e parte descoberta (sem contrato fixo).

Com base no cenário da última semana de maio, a projeção de preços futuros de energia no mercado livre para o próximo trimestre, de junho a agosto, é de R$ 681,36 por MWh. Os dados são da consultoria Dcide, que reúne semanalmente informações sobre preços da energia elétrica que servem como referência para comercialização no mercado livre.

Baixa oferta

A contratação de longo prazo, para os próximos quatro anos (2015 a 2018), tem preços mais confortáveis, R$ 194,56 por MWh, segundo o levantamento da Dcide, mas vem esbarrando em outro problema. Hoje, a maior dificuldade das empresas é a oferta. Muitas empresas estão com dificuldades para fechar contratos mais longos, afirma Robson Luiz Rossetin, presidente da comercializadora Electra Energy, de Curitiba.

Com chuvas escassas, atrasos nas obras de geração e recusa do governo em adotar uma política de redução do consumo, a oferta de energia no mercado livre encolheu. "Os próprios geradores estão tendo que restringir a oferta. Isso tira a liquidez do mercado", afirma Patrício Hansen, diretor-geral da Dcide. Na avaliação do presidente da Trade Energy, Walfrido Avila, quem não vendeu energia no último leilão do governo, a R$ 270 o MWh até 2019, está preferindo comercializar o excedente no curto prazo, cujo preço é mais lucrativo.

Sem uma política de racionalização do consumo por parte do governo, uma parcela da indústria acendeu o sinal amarelo. As empresas estão mais cautelosas, repensando suas estratégias de investimento e, em alguns casos, até mesmo freando a produção. "Não queremos ser alarmistas, mas estamos acompanhando este cenário com grande preocupação. Racionamento implica em corte de produção. Por enquanto, as empresas estão se virando como podem, tentando racionalizar o consumo e minimizar o impacto", diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Edson Luiz Campagnolo.

Tarifa cara também afeta setor regulado

A crise do setor elétrico também vai deixar mais cara a conta de luz de empresas do mercado cativo, que recebem energia das distribuidoras (como qualquer outro consumidor) e estão sujeitas às tarifas determinadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O socorro financeiro ao setor via aporte do Tesouro Nacional e empréstimos bancários será repassado ao consumidor final nos próximos anos.

A projeção é de um aumento de 60% no custo da energia para a indústria até 2015. Segundo estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), até o final deste ano o setor industrial estará pagando R$ 342,70 por MWh pela energia elétrica, valor que poderá alcançar R$ 420,20 por MWh em 2015 com os reajustes das distribuidoras. Em janeiro do ano passado, o custo era de R$ 263 o MWh, impactado pelo desconto concedido pelo governo federal por meio da Medida Provisória nº 579.

Se a estimativa se confirmar, o Brasil deve passar do 11.º para o 4.º lugar no ranking dos países com a energia mais cara do mundo para a indústria. "A projeção inclui o sistema de bandeiras tarifárias [que repassará os custos de geração], que deve entrar em vigor no ano que vem", explica a especialista em Competitividade Industrial e Investimentos do Sistema Firjan, Tatiana Lauria.

Para Victor Alfredo Hogan, diretor do Sindimetal-PR e representante da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) junto ao Conselho de Consumidores da Copel, o impacto para a indústria do custo maior da energia poderia ser pior se a economia estivesse em um bom momento. Nos três primeiros meses deste ano, o consumo de energia do setor se manteve praticamente estável.

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