Brasília – A audiência pública realizada ontem pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para discutir quatro variedades de algodão geneticamente modificadas se transformou em uma manifestação pró-transgênicos. Além de estarem em minoria, os participantes contrários à liberação comercial de sementes geneticamente modificadas enfrentaram ataques e vaias da platéia, dominada por pequenos produtores de algodão do Centro-Oeste. Dos 943 inscritos, só 590 puderam entrar no auditório do Senado reservado à reunião, por falta de espaço.

CARREGANDO :)

Os dois representantes do Ministério Público Federal convidados pela CTNBio foram acusados de agir com parcialidade ao apresentar um vídeo que mostra produtores da Índia frustrados com o algodão Bollgard, da Monsanto. Para o grupo que reagiu, deveriam ter sido mostradas também lavouras que usam biotecnologia e produzem até dez vezes mais que no Brasil, caso da Austrália, onde a produtividade chega a 1,6 mil arrobas por hectare.

O procurador Marcellus Barbosa Lima se defendeu dizendo que o vídeo era uma tentativa de mostrar que o pior pode acontecer. Para ele, "a discussão deve seguir o princípio da precaução e não a lógica do lucro fácil", alegou. A procuradora Maria Soares Cordiolli disse que as liberações estão ocorrendo sem discussão e que o direito dos consumidores não é respeitado. Em sua avaliação, o direito dos produtores que preferem o algodão convencional está em risco.

Publicidade

A realização de audiência pública é considerada dispensável pelo presidente da CTNBio, Walter Colli, que coordenou os trabalhos. À imprensa, ele argumentou que os 27 membros da comissão tomam decisões baseadas em estudos técnicos. "Entraram na Justiça para exigir que fosse feita uma audiência sobre o milho (realizada em março). Para não ter que passar por isso de novo, fizemos a audiência do algodão."

Entre os 14 convidados da CTNBio, 8 defenderam e 6 colocaram os transgênicos em xeque. Aplaudido de pé, o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), João Carlos Rodrigues, alegou que os produtores que plantaram Bollgard no Brasil (a variedade foi liberada em 2005 e legalmente cultivada pela primeira vez no ano passado) sabem que a semente não traz risco à saúde ou ao ambiente. "Nenhum bezerro, nenhuma vaca morreu até hoje por comer algodão transgênico."

Ele garantiu que o transgênico não impede que parte dos produtores optem pelo convencional e ironizou o argumento de que as sementes modificadas tornam o produtor dependente das indústrias. "Nós já estamos nas mãos das multinacionais; chegamos aqui em carros importados."

A audiência serviu mais para que cada grupo marcasse sua posição ideológica do que para o avanço da discussão científica. Os pequenos produtores do Centro-Oeste contaram que defendem o algodão transgênico porque ele representa uma oportunidade de recuperação de regiões pobres, como o Norte de Minas Gerais, onde o PIB per capita é de R$ 3,5 mil, um quarto do verificado no Sudeste. "Com o transgênico, vou plantar uma safra a mais", disse o agricultor Francisco Correia, que cultiva milho e feijão em Catuti (MG).

Ele sustenta três filhos com a renda de 4 hectares (quatro campos de futebol) e alega que deixou de plantar algodão nos últimos anos porque a semente convencional se tornou inviável. Os produtores e seu município lotaram oito ônibus para participar da audiência.

Publicidade