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"O Brasil está no triplo B, tem um mercado interno forte, uma indústria diversificada, exporta e hoje é pouco sensível aos problemas que vêm de fora. O país está fazendo um bom esforço fiscal e hoje está mais bem preparado para lidar com a crise do que em 2008 e 2009", diz a diretora-gerente e presidente da agência Standard & Poor’s no Brasil, Regina Nunes. Na semana seguinte ao anúncio da elevação da nota do Brasil de "BBB-" para "BBB", Regina -- que entrou na agência em 1998 e tem 24 anos de experiência nos mercados financeiro e de capitais no Brasil e Estados Unidos, passando por Citibank e Chase Manhattan -- esteve em Curitiba e falou com a Gazeta do Povo sobre os desafios do Brasil para passar para a categoria da "elite" dos países classificados com a nota "A".

Quais os impactos positivos dessa revisão da nota da para a economia brasileira?

Em um primeiro momento, o impacto tem mais a ver com o investidor do que com a economia brasileira propriamente dita. Com o rating saindo de uma categoria para um nível acima, os investidores tendem a ter mais apetite pelos papéis brasileiros. A condição do Brasil melhora aos olhos do mercado e o país começa a ter acesso a investidores que procuram um papel não tão vulnerável. Mas a nota indica as condições e faz a precificação -- investir ou não depende do investidor. O grande passo é que a elevação da nota atrai investidores de mais longo prazo, o que é saudável. Quando uma economia não é vulnerável, ela está menos susceptível às dinâmicas que vêm de fora na sua economia. E o Brasil tem se mostrado bem diante dos problemas externos.

Ao elevar a nota do Brasil, a S&P elogiou a política fiscal do país. Mesmo assim, o rating BBB é apenas o segundo nível de "grau de investimento". Quais os desafios do país para entrar no clube do rating "A"? Quanto tempo isso pode levar?

A migração não é muito fácil de ser prevista em tempo. A elevação da nota para o triplo B por si só já é um feito bastante forte. O que é perceptível é que houve uma sensível melhora do país. Hoje é possível ver um compromisso com a austeridade fiscal e mesmo monetária. Mesmo assim, 48% da dívida do país tem prazo de 36 meses, o que ainda é um índice alto. A evolução da parte fiscal do país é muito grande, mas ainda há um stress que limita o perfil de endividamento de curto prazo. Espera-se que o país mantenha políticas prudentes como tem feito.

Qual a "lição de casa" para o Brasil ganhar uma nota de risco melhor?

O Brasil tem características muito singulares: é um dos países mais complexos em relação ao pagamento de tributos. A complexidade da carga tributária faz com que as empresas tenham uma despesa desnecessária para o pagamento de seus impostos. Essa burocracia cria entraves que diminuem a competitividade e afastam o investimento do setor privado. Chega-se a uma situação em que as exigências para pagar os tributos são tão caras quanto os próprios impostos.

Há ainda a questão das taxas de juros...

O país também evoluiu muito na parte fiscal, mas continua com uma complexidade muito alta também nessa área. Discute-se muito por que a taxa de juros não cai. O Brasil paga uma das maiores taxas de juros do mundo, mas tem entraves para tornar flexível o custo desse endividamento. A poupança, por exemplo, paga TR mais 6%. Existem problemas que têm de ser atacados de frente pelos políticos e pela sociedade. É preciso parar de discutir a taxa Selic e discutir a poupança. A Selic não pode cair abaixo da poupança em um país que tem quase 50% da dívida de curto prazo.

Isso passa pela discussão do tamanho do Estado?

O que fortalece o Brasil é o fato de ele ser pouco dependente do mercado externo e ter melhorado em função do mercado interno. O governo tem feito um sacrifício fiscal. É preciso aprofundar e avançar nas reformas. A questão não é discutir o tamanho da máquina pública. Ela pode até pode se manter do tamanho que é, desde que seja eficiente.

Quais são os principais entraves para o país deslanchar?

O crescimento do país está limitado pela necessidade de investimentos em infraestrutura. Hoje o país investe 19% do PIB, um índice extremamente baixo para um país em desenvolvimento. Assim, limita-se o crescimento porque não há o investimento em infraestrutura necessária.

Com o reposicionamento da nota e avanço no ranking global para 6ª economia, pode-se dizer que o Brasil passou de economia "emergente" para "emergida"?

O que caracteriza o fato de ser emergente é estar na categoria de países que ainda têm problemas: a população segue crescendo, existem a necessidade de investir e há desafios em questões como educação, saúde e segurança pública. Isso tudo ainda está presente no Brasil, que é um país em desenvolvimento com características únicas.

Quais são essas características?

Aqui há um sistema financeiro sólido, controles rígidos, parque industrial moderno e diversificado, o sistema privado funciona. O país tem competitividade em setores estratégicos apesar da enorme carga tributária, tem recursos recursos energéticos abundantes, em especial em fontes com a melhor relação custo/impacto ambiental. É um país que está amadurecendo relações comerciais com outros emergentes e que vem crescendo por meio da inclusão social. Soma-se a isso o fato de ser um país democrático, com instituições fortes: tem todas as características para a continuar crescendo. A velocidade com que isso vai ocorrer, entretanto, depende da sua capacidade de lidar com seus próprios desafios.

O país está bem preparado para enfrentar esse novo ciclo da crise?

É um dos mais bem preparados. O Brasil está mais forte que em 2008. Antes de divulgarmos a elevação do rating, quisemos esperar alguns meses do novo governo que se instalava. E o que se tem visto até agora é uma economia melhor, mais forte, o governo dá sinais de que vai usar instrumentos contracíclicos extremamente domésticos, como gastar menos para economizar. Por estar mais bem preparado, até do ponto de vista da regulamentação, o país não corre agora os riscos que corria em 2008.

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