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Análise

Franco Iacomini, colunista de Finanças Pessoais

Em jogo, a confiabilidade

Não é pouco dinheiro. O megaempréstimo feito ontem pelo Banco Central Europeu a 800 instituições do continente equivale a todas as riquezas geradas em um ano por um país do porte da Indonésia, dono do 18º PIB do mundo, segundo o ranking do FMI. Ou duas vezes o PIB da Argentina. Mas por que emprestar esse dinheiro aos bancos, quando quem está quebrando são governos, como os da Grécia, de Portugal e da Itália?

O BCE (e o pensamento econômico em geral) sabe que emprestar dinheiro para quem está quebrado só serve para aumentar o problema. Para resolver a iminente insolvência dos gregos, a solução foi a moratória negociada em curso – os credores do país estão tendo de aceitar, queiram ou não, receber pouco menos da metade do valor devido, e num prazo mais longo. Assim, a autoridade monetária voltou seu olhar para o sistema financeiro.

Em geral se costuma dizer que há uma diferença essencial entre uma crise e uma catástrofe financeira: na catástrofe sempre há bancos quebrados. Foi assim em 2008, quando a quebra do Lehman Brothers acelerou o derretimento da economia americana. Esse é o cenário que os europeus querem evitar.

Por isso a amplitude do socorro de ontem é importante. A injeção de ânimo atingiu bancos pequenos e médios, que estão na base da pirâmide financeira e que poderiam causar grande prejuízo a investidores e correntistas caso fechassem as portas. Além disso, uma ocorrência dessas lançaria dúvidas sobre a segurança dos recursos guardados em outros bancos. E confiabilidade, mais do que depósitos, é o maior patrimônio do sistema financeiro.

Os bancos tomaram 530 bilhões de euros na segunda oferta de financiamentos de três anos do Banco Central Europeu (BCE) ontem, aumentando as esperanças de que, com mais crédito fluindo para empresas e governos, os custos dos empréstimos diminuam ainda mais e governos possam se financiar pagando juros um pouco menores que os exigidos pelo mercado até agora. "Os títulos italianos e espanhóis devem se beneficiar disso, assim como os mercados de ações", estima Luca Cazzulani, do UniCredit.

O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, disse que o BCE reduziu o risco de uma crise de crédito. "Uma das questões principais é a confiança, por isso eu quero que a discussão sobre o crescimento seja mais concreta possível", disse Barroso, acrescentando estar "confiante" de que haverá proteção apropriada para a zona do euro nas próximas semanas, e que a cúpula da União Europeia que começa hoje terá "menos drama" que a última reunião.

Os empréstimos de três anos são a última tentativa do BCE para combater a crise da zona do euro. O presidente da instituição, Mario Draghi – cujo país natal, a Itália, estava no epicentro da crise quando o banco anunciou a medida no fim do ano passado –, disse que após a primeira das operações, conhecidas como LTROs, "uma grande, grande crise de crédito" havia sido revertida. Os bancos usaram grande parte dos 489 bilhões de euros que pegaram emprestado em dezembro para cobrir dívidas que estavam vencendo. Draghi os incentivou a emprestar o dinheiro que pegaram na operação de ontem para famílias e empresas, ajudando a melhorar o crescimento da economia.

Autoridades do BCE esperam que os bancos também usem o dinheiro para comprar títulos de alto rendimento mais agressivamente, especialmente os da Itália. A evidência preliminar sugere que os bancos, especialmente na Espanha e na Itália, usaram o primeiro LTRO para fazer mais da "operação Sarkozy" – termo adotado pelos mercados após o presidente da França sugerir que os governos olhassem para o vigor dos bancos com o dinheiro do BCE para comprar os seus títulos. Os bancos espanhóis compraram 23,1 bilhões de euros de títulos do governo no mês passado e os italianos, 20,6 bilhões de euros – em ambos os casos, volumes recordes.

Câmbio

Analistas acreditam que, contra a vontade do BCE, os bancos direcionem parte dos recursos emprestados para mercados emergentes atrás dos juros. A expectativa de o Brasil receber uma parcela deste dinheiro forçou uma rodada dupla de intervenções do BC brasileiro ontem no mercado de câmbio local. A operação feita na Europa fez com que o dólar abrisse o dia em firme tendência de queda. Com a moeda na casa de R$ 1,68, o BC voltou a agir. As operações de­­ram resultado e a moeda encerrou os negócios em alta de 0,82%, a R$ 1,7160, maior valor em duas semanas.

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