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Carros mexicanos da Nissan em São José dos Pinhais: marca seria a mais afetada | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Carros mexicanos da Nissan em São José dos Pinhais: marca seria a mais afetada| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Medida afetaria 55% das vendas da Nissan

Pelo menos 17 modelos de carros vendidos no Brasil ficarão mais caros se o acordo automotivo com o México for suspenso. A maioria desses veículos, fabricados por sete montadoras, é considerada de luxo no Brasil – muitos custam mais de R$ 80 mil.

A empresa mais prejudicada seria a Nissan, que tem sua fábrica brasileira em São José dos Pinhais (Região Metropolitana de Curitiba). Ela importa do México os modelos March, Tiida, Sentra e Versa. Com 36,7 mil unidades vendidas, esses veículos representaram 55% das vendas da empresa no Brasil em 2011. Os outros 45% se referem às 30,4 mil unidades comercializadas das famílias Livina e Frontier, ambas fabricadas em São José.

A tendência é de que a fatia dos carros mexicanos cresça neste ano, já que o Versa e o March chegaram há pouco tempo ao mercado. No ano pssado, os importados ajudaram a Nissan a elevar suas vendas em 88% e a subir uma posição no ranking brasileiro dos carros mais vendidos, para o sétimo lugar, com uma fatia de 3,6% do mercado – a meta é chegar a 5% até 2014. Procurada para comentar a questão do acordo automotivo, a Nissan informou que não iria se manifestar, uma vez que o governo brasileiro não se pronunciou oficialmente sobre o assunto.

Mexicanos

Pelo menos 17 modelos fabricados no México são vendidos no Brasil.

Chrysler: PT Cruiser, Dodge Journey, Dodge Ram

Fiat: 500, Freemont

Ford: Fusion, New Fiesta sedã, New Fiesta hatch

General Motors: Chevrolet Captiva

Honda: CR-V

Nissan: March, Sentra, Tiida,Tiida Sedan,Versa

Volkswagen: Jetta, Jetta Variant

Mexicanos travam pacto mais amplo

Brasil e México deram início à ne­­gociação do chamado Acordo Es­­tra­­tégico de Integração Econô­mica (AEIE) em novembro de 2010. Seu escopo é amplo: ele tratará de acesso a mercados, aduanas, serviços, investimentos, compras go­­ver­namentais e propriedade intelectual, entre outros tópicos.

Hoje o Brasil tem dois Acordos de Complementação Econômica (ACEs) com o México: o automotivo e um outro, mais geral, que prevê reduções de tarifas sobre alguns produtos. Além de querer renegociar o regime automotivo, o governo brasileiro nunca escondeu a in­­tenção de celebrar um acordo mais amplo com os mexicanos.

O problema é que o AEIE não interessa a alguns setores da economia mexicana, em especial o agropecuário, o que travou as negociações. Alguns industriais, que temem a concorrência brasileira, também são contra.

Além da intenção de reequilibrar o comércio entre os dois países, dois objetivos podem estar por trás da ameaça do governo brasileiro de romper o acordo automotivo com o México. O primeiro, segundo especialistas ouvidos pela Gaze­ta do Povo, seria forçar o parceiro a renegociar alguns pontos do tratado, cujos resultados têm sido cada vez mais favoráveis aos mexicanos. O segundo objetivo seria estimular a retomada das conversas sobre um acordo mais amplo de integração comercial entre os dois países, que está parado desde o anúncio, no fim de 2010.

A decisão de suspender ("de­­nunciar", no jargão diplomático) o acordo automotivo, divulgada pelos jornais O Estado de S.Paulo e Valor Econômico, não é confirmada oficialmente pelo governo. Mas a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), admite que o assunto "está em discussão".

Ontem pela manhã, a Agência Brasil, portal de notícias mantido pelo Executivo federal, informou que o governo "estuda a possibilidade de rever e até suspender" o acordo, mas que "ainda não há uma definição". A mesma agência afirmou que "autoridades mexicanas sinalizaram interesse em renegociar os termos do acordo".

O principal resultado da suspensão seria a cobrança de 35% de Imposto de Importação sobre os carros mexicanos, que assim ficariam mais caros no mercado brasileiro – hoje eles são isentos do tributo. No entanto, isso ocorreria apenas 14 meses após o anúncio do rompimento unilateral, conforme estabelece o próprio acordo. Ou seja, o consumidor sentiria os efeitos a partir de abril de 2013, no mínimo.

O eventual rompimento reforçaria a atuação de caráter protecionista do atual governo, que há cinco meses decidiu aumentar em 30 pontos porcentuais as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de importados. Só carros do Mercosul e do México escaparam desse reajuste.

Termos

Pelo acordo com o México, firmado em 2002, o comércio de automóveis, peças e partes de veículos entre os dois países é isento de tarifas alfandegárias. O acordo foi vantajoso para o Brasil em seus primeiros anos, mas, a partir de 2009, o país passou a ter um déficit crescente nas transações com o México. O saldo negativo se aprofundou à medida que o real se valorizou e os custos de produção no Brasil aumentaram.

O regime automotivo que o Brasil mantém com a Argentina e os demais sócios do Mercosul é semelhante ao firmado com o México. Mas há uma diferença importante na exigência de conteúdo nacional (ou regional) dos veículos: carros do Mercosul têm de ter ao menos 45% de componentes fabricados no bloco comercial, enquanto os montados no México precisam ter apenas 35% de conteúdo "mexicano" para entrar no Brasil sem pagar imposto. Esse seria um dos principais pontos que o governo brasileiro gostaria de modificar.

Rompimento prejudica os dois países, dizem especialistas

Especialistas em mercado automotivo e comércio exterior consideram difícil que o acordo automotivo entre Brasil e Mé­­xico seja rompido. O mais provável, segundo eles, seria uma revisão de seus termos – representantes dos dois países já estariam discutindo a formação de comitês para estudar eventuais mudanças.

"Não acredito que vá ocorrer, de fato, um rompimento. Acho que a ameaça brasileira pode, sim, render alguma discussão", avalia o consultor David Wong, diretor da Kaiser Associates. Para ele, seria um erro anular o acordo. "Romper não é a forma de buscar parceiros comerciais, não é a atitude diplomática que se espera de um país que busca ser um líder."

Para Welber Barral, que foi secretário de Comércio Exte­rior no governo Lula, "os dois países perderiam" com um rom­­pi­men­to. "São as duas grandes economias da América Latina. Precisamos de uma maior integração econômica, e não de no­vas limitações", diz.

O engenheiro Roberto Marx, professor da Escola Politécnica da USP e pesquisador da área automotiva da Fundação Van­zolini, avalia que encarecer os carros mexicanos "é muito pouco" se a intenção do governo é fortalecer a indústria local.

"O papel do governo é dar condições para que as montadoras fabriquem aqui carros a preços tão competitivos quanto os feitos no México", diz. "Cancelar o acordo pode minimizar problemas na balança de pagamentos do país, mas não resolve seus problemas estruturais."

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