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Pátio de contêineres no Porto de Paranaguá: produtos importados respondem por 22% do consumo nacional, e boa parte da indústria usa componentes feitos no exterior | Jonathan Campos/ Gazeta do Povo
Pátio de contêineres no Porto de Paranaguá: produtos importados respondem por 22% do consumo nacional, e boa parte da indústria usa componentes feitos no exterior| Foto: Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

Sobrou para a Petrobras

A alta do dólar encarece os combustíveis importados pela Petrobras, mas ela só poderá reajustar a gasolina e o diesel se o governo autorizar – o que, dada a persistência da inflação, pode não ocorrer. Segundo o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), com o dólar a R$ 2,15 a defasagem dos preços nacionais em relação à cotação internacional era de 20% para a gasolina e 17% para o diesel.

Entrevista

"Se o resto estivesse bem, dólar mais alto não seria problema"

O Brasil não se preparou bem para enfrentar a alta do dólar, o que elevou a chance de que ela contamine os preços. A opinião é de Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios. Para o economista, a desvalorização do real não seria uma ameaça caso as políticas fiscal (contas do governo) e monetária (taxa de juros) tivessem sido conduzidas com mais rigor. Como ambas estavam jogando a favor da inflação, o dólar transformou-se em uma terceira fonte de pressão.

A alta do dólar dificulta o combate à inflação?

Sim, porque o Brasil não se preparou suficientemente bem para isso.

O que faltou?

Faltou uma atuação mais firme do Banco Central contra a inflação, usando a taxa de juros. O custo dessa brincadeira é colossal, como o governo vê agora a duras penas. É uma lição que, por incrível que pareça, não tinha sido entendida. E faltou também uma política fiscal mais rigorosa. A relação entre as receitas e despesas do governo está completamente desregrada, fora do lugar. Não tem mais credibilidade. Nos últimos dois anos enveredamos por um caminho desastroso, com experimentalismos que pareciam ter ficado no passado.

Quando o dólar estava em queda, o Brasil se dizia vítima de guerra cambial. Agora, com o cenário inverso, o governo também reclama. Por quê?

Pelo jeito agora somos vítimas de um armistício cambial [risos]. O câmbio mais alto não seria um problema caso tivéssemos uma política fiscal rigorosa e uma política monetária adequada. Mas o que temos é uma indisciplina fiscal, que fortalece a inflação, com uma política monetária leniente, que deixou a inflação correr solta. Assim, o avanço do dólar virou uma terceira força a favor da inflação. Aí não há como segurar.

O avanço do dólar põe mais incertezas no caminho da inflação brasileira. A escalada da moeda – ontem cotada a R$ 2,23, com alta de 11% desde meados de maio – já teve impacto em parte da indústria e do atacado, e logo deve chegar ao consumidor. Fabricantes de eletrônicos, por exemplo, já prometem reajustes.

Em geral, o comércio sente o efeito de 30 a 45 dias depois do atacado. Alguns fatores, entre eles a desaceleração do varejo, podem inibir o repasse, mas o fato é que o risco cambial acrescentou insegurança a um cenário que já era nebuloso, tornando mais difícil a missão do Banco Central de manter os preços sob controle.

"Alguns estudos apontam que 10% de alta do dólar significam, em um ano, mais 0,4 ponto na inflação. Mas isso se o Banco Central não reagir. Se elevar os juros, o BC esfria um pouco a inflação, além do efeito paralelo de atrair dólares para o país", diz Antônio Madeira, economista da LCA Consultores.

Bancos e consultorias já ajustam suas planilhas. Em seis semanas, a estimativa para o dólar comercial ao fim do ano passou de R$ 2,02 para R$ 2,15, na média das instituições ouvidas pelo Banco Central. No mesmo intervalo, a projeção para a inflação medida pelo IPCA aumentou de 5,80% para 5,87%. A previsão para a Selic foi de 8,25% a 9,25% ao ano – hoje a taxa é de 8%.

A desvalorização do real preocupa, entre outras coisas, porque os produtos importados já respondem por 22% do consumo nacional, segundo cálculo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). É o maior índice desde 1996, quando a CNI começou a fazer as contas.

O encarecimento de parte significativa dos produtos à venda no país pode estimular um movimento paralelo igualmente negativo: os concorrentes locais se sentiriam mais à vontade para também reajustar seus preços.

Matérias-primas

Há outros canais de "contaminação". Um deles é o uso de matérias-primas importadas. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, os chamados "bens intermediários" já respondem por quase 40% das importações. "Nossa indústria depende de muitos componentes feitos no exterior, e a alta do dólar eleva os custos de produção, efeito que em algum momento pode chegar ao preço final", explica Otto Nogami, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper).

O momento, pelo jeito, chegou. Fabricantes planejam para este mês um aumento médio de 4% nos preços de produtos como computadores, tablets e smartphones, segundo a Abinee, que representa o setor.

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