Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Crise

Capital, trabalho e nenhum diálogo

Perda intensa de vagas obriga organizações a retomar debate sobre a flexibilização das leis trabalhistas. Difícil é encontrar algum consenso

 |
Veja a posição de cada um dos lados sobre a flexibilização das leis trabalhistas |

1 de 2

Veja a posição de cada um dos lados sobre a flexibilização das leis trabalhistas

Conheça as alternativas que a legislação prevê para driblar a crise |

2 de 2

Conheça as alternativas que a legislação prevê para driblar a crise

O corte de 654 mil vagas formais em dezembro no país – o maior dos últimos dez anos – e a perspectiva de aumento do desemprego nos próximos meses ressuscitaram discussões que há tempos não frequentavam a mesa de negociação entre patrões e empregados: a redução de jornada e de salários, a suspensão de contratos e até mesmo a flexibilização das leis trabalhistas.

Indústria e entidades sindicais vêm travando, nos últimos dias, uma queda-de-braço em relação a medidas para conter uma eventual enxurrada de cortes nos próximos meses. De um lado, empresários dizem que não há como estancar o ritmo de demissões de não forem adotadas medidas alternativas, com redução da jornada e corte de salários. De outro, as centrais sindicais, representadas principalmente pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e pela Força Sindical, não aceitam negociar sem garantia de manutenção dos empregos.

"Não queremos que o trabalhador pague a conta da crise. Não dá para negociar redução de salário", diz Roni Anderson Barbosa, presidente da CUT no Paraná. A CUT e a Força Sindical, apesar de baterem na tecla da garantia de empregos, divergem quando o assunto é redução de salários. A Força Sindical já aceita cortar salários e jornada para evitar mais demissões. "A renda do trabalhador sustentou o crescimento econômico nos últimos anos. Não vamos abrir mão desse ganho", rebate Barbosa.

Para o coordenador do conselho temático de relações do trabalho da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), Amilton Stival, as empresas não têm como garantir empregos em uma época de crise. "Uma empresa exportadora, por exemplo, não pode manter vagas se o ritmo de encomendas lá fora diminuir. O que precisamos é negociar um acordo que contemple governo, empregados e trabalhadores para evitar um agravamento do quadro de desemprego", afirma.

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), ligado ao Ministério do Planejamento, mostra que, no pior cenário – de um crescimento econômico de apenas 1% – 1,126 milhão de trabalhadores podem ficar sem trabalho em 2009. Nessa simulação, o desemprego pularia de 7,9% para 8,6%.

"A questão da manutenção do emprego vai centralizar as discussões em 2009. Se nos últimos anos o embate se dava no campo dos repasses reais de salários, esse ano o foco está na manutenção das vagas", prevê José Dario Krein, especialista em economia do trabalho e pesquisador da Unicamp. Embora não seja uma discussão nova, a flexibilização das leis trabalhistas perdeu força nos últimos cinco anos em função principalmente do avanço do emprego formal e do aumento da renda.

Mas, para a maior parte dos analistas, não é hora de se discutir mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). "Mudar alguma coisa agora é temerário, porque uma das pontas desse jogo, o trabalhador, está vulnerável", afirma o advogado Aramis de Souza Silveira, especializado em direito do trabalho. De acordo com o professor de direito do trabalho da PUC-PR e da Estação Business School Hélio Gomes Coelho Júnior, não há o que ser "flexibilizado". "O que é necessário, sim, é o repensar do tributo cobrado pelo Estado no negócio particular emprego. O que é fundamental é uma clara política de investimentos e projetos públicos. O que é inadiável é boa alocação dos recursos transferidos ao Estado pela iniciativa privada", afirma.

A lei trabalhista brasileira não é das mais rígidas, segundo o professor do departamento de economia da Universidade Federal do Paraná, Luiz Alberto Esteves. "Em países da Europa, por exemplo, não há a possibilidade de demissão sem justa causa", diz. Para o economista, porém, a rápida deterioração do nível de emprego vai forçar mudanças. "Alguns setores terão que ceder mais que outros e a redução de salário é uma possibilidade. Essa crise não vai passar tão cedo", afirma ele, que prevê o crescimento da informalidade e do número de pessoas que terá que apelar para o empreendedorismo para driblar o desemprego. "Muita gente vai abrir barraquinha de cachorro-quente", diz.

Suspensão de contratos

Enquanto o debate sobre flexibilização dos direitos trabalhistas ganha corpo, a redução da jornada, o adiamento de reajustes e o "layoff" – suspensão do trabalho com manutenção do vínculo empregatício – já estão sendo discutidos por empresas e sindicatos. Companhias como Renault, Philips e ArcelorMittal suspenderam recentemente contratos de trabalho de funcionários. Na semana passada, a Vale anunciou aos sindicatos de mineração de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul proposta de licença remunerada com redução de 50% no valor do salário-base para garantir empregos na empresa até 31 de maio deste ano. "O problema é que muita empresa que está demitindo e suspendendo contratos recebeu ajuda e incentivos do governo", diz Barbosa, da CUT.

Para o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, algumas empresas estão exagerando na dose de demissões e terão que recontratar em março. Para evitar mais dispensas, o governo federal já anunciou que condicionará os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à manutenção de empregos. O governo também prepara um pacote de políticas públicas de emprego. Entre as medidas pode estar a prorrogação do prazo do seguro-desemprego, hoje de até cinco meses.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.