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“Pela internet, as pessoas podem acompanhar as vidas umas das outras. Está se tornando difícil esconder se você é uma pessoa má, pois tudo o que você fizer virá à tona, seja por você mesmo ou pelos outros”, Ivo Gormley, cineasta | Arquivo pessoal/Divulgação
“Pela internet, as pessoas podem acompanhar as vidas umas das outras. Está se tornando difícil esconder se você é uma pessoa má, pois tudo o que você fizer virá à tona, seja por você mesmo ou pelos outros”, Ivo Gormley, cineasta| Foto: Arquivo pessoal/Divulgação

Filme: Será o fim das instituições?

O título "Us Now" (em português, "Nós Agora") já entrega o questionamento: se, colaborativamente, já conseguimos, construir a maior enciclopédia do mundo, a Wikipedia, e temos software gratuito e com cada vez mais qualidade, o software livre, já adotado inclusive pelo Google, porque não podemos usar essa mesma filosofia para gerir nossa sociedade e as instituições que dela participam?

O documentário coloca em xeque duas situações: em rede, cada vez mais as pessoas confiam umas nas outras, pois há filtros. Só que as instituições nem confiam na participação das pessoas nem querem trocar informações em rede. Uma mãe, por exemplo, se sente mais segura ao perguntar para outra mãe sobre como resolver situações cotidianas na educação de seu filho. Mas um governo – ou mesmo uma empresa – não se sente à vontade em questionar os cidadãos sobre suas prioridades.

"Us Now" tem a cara da internet. É para ser assistido na telinha do tamanho do YouTube (a versão disponível no site www.usnowfilm.com tem legendas em português). Em entrevistas e casos reais, o filme faz pensar: será que as instituições vão mudar? E, se não mudarem, elas irão acabar?

São Paulo - As fronteiras entre cidadãos, go­­vernos e empresas estão prestes a cair. A era em que governantes e mar­­cas famosas empurravam o que queriam – e escondiam o que também queriam – chega ao fim. Da mesma forma em que, na in­­ter­­net, qualquer banda pode concorrer cada vez mais de igual para igual com ar­­tistas de grandes gravadoras, a voz de pessoas comuns interligadas em rede coloca instituições antes ina­­tingíveis no mesmo patamar de qualquer um. Com informações correndo livremente, fica fácil acompanhar os passos dos podero­sos, sejam eles eleitos ou magnatas do mercado. E, a partir daí, participar das suas decisões.

A teoria é do jovem cineasta Ivo Gormley. Ele nasceu e mora em Lon­­­dres e tem apenas 27 anos. Há dois meses, ofereceu de graça na rede um documentário sobre co­­mo as pessoas podem e devem in­­fluen­­ciar as decisões de instituições públicas e privadas e como es­­­­tas devem ouvir os internautas, sob risco de sumirem do mapa. O do­­­­cumentário – seu primeiro lon­­­­ga metragem – foi rodado em 2008, antes da eleição de Barack Obama, ou seja, se antecipando à consolidação da tendência mundial de se discutir a presença dos governos na internet, que já levou até o presidente Lula a anunciar pa­­­­ra breve o lançamento de um blog.

Confiança

O documentário tem o sugestivo nome de "Us Now" (em português, "Nós Agora"), e está disponível no site www.usnowfilm com. A justificativa de Gormley para essa mudança nas relações entre cidadãos e instituições é que, na era da internet, onde cada vez mais as pessoas publicam informações sobre si, as relações virtuais ba­­seiam-se em índices de confiabilidade, os quais são medidos em sites como o Ebay, por exemplo, em que o vendedor é julgado pelo comprador. Quanto mais avaliações positivas o primeiro tiver, maior a sua reputação. E isso, co­­mo Gormley mostra em entrevistas e ca­­sos interessantes, também migra para o mundo real.

"Pela internet, as pessoas po­­dem acompanhar as vidas umas das outras. Está se tornando difícil esconder se você é uma pessoa má, pois tudo o que você fizer virá à tona, seja por você mesmo ou pelos outros", disse. "Com governo e em­­­presas é a mesma coisa. As informações estão na rede. Se houver corrupção, tentativa de enganar, os cidadãos irão saber. Se antes em­­presas, por exemplo, conseguiam controlar o que saía sobre elas, hoje não podem mais. Se for ruim, as pessoas vão começar a publicar isso."

Embora essas possibilidades estejam cada vez mais evidentes, Gormley diz que elas ainda não estão em prática como deveriam. Ele, inclusive, afirma que a democracia não funciona como deveria. "As possibilidades da internet ainda são ignoradas", constata.

Mesmo assim, Gormley acredita numa pressão da sociedade. Ain­­da que estejamos numa época em que as pessoas não sejam muito engajadas politicamente, já há si­­nais de que isso está mudando. As últimas manifestações no Irã neste ano, por exemplo, em que internautas se mostraram contrários ao presidente eleito, são sinais de que "a internet é um grande entrave à ditadura". Manifestações contra leis que querem punir com a perda da internet quem baixa conteúdo ilegal, como a França queria instituir, também mostram a força dessa mobilização, diz. "Ninguém consegue calar a internet. As pessoas acham uma forma."

Nova estrutura

Para o cineasta, as pessoas hoje se in­­­­teressam, sim, por política. Só não querem saber da estrutura ve­­lha, de partidos. "As pessoas acham que os partidos estão muito distantes. Mas se importam com coisas que afetam diretamente a elas, co­­mo melhorias num parque", diz. No documentário, há casos como o de uma cidade em que os investimentos públicos são discutidos com os cidadãos na praça da cidade. E há um time de futebol em que os torcedores, pela web, escolhem a escalação nos jogos. "Acredito que, como têm voz e acesso à informação, as pessoas irão começar a questionar as prioridades dos governos e instituições, começar a fiscalizar, ver os erros deles. E exigirão participação."

O filme de Ivo Gormley é um alerta a isso. Foi por essa questão, por tratar justamente de compartilhamento, que foi disponibilizado gratuitamente.

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