Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, vai reeditar portaria que exige convenção coletiva para trabalho do comércio em feriados. Frentes parlamentares se opõem e querem lei que dispense aval dos sindicatos.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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A reedição da portaria com novas regras para o trabalho no comércio em feriados, anunciada na quarta-feira (24) pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho, desagradou às frentes parlamentares ligadas ao setor, que vão insistir na votação de projeto de lei sobre o tema.

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O novo texto, segundo o ministro, definirá setores essenciais que poderão funcionar normalmente, como farmácias e postos de gasolina. As exceções não constavam da Portaria 3.665/2023, editada em novembro, que determinava o trabalho aos feriados apenas após aprovação de convenção coletiva de trabalho para toda a categoria de trabalhadores.

Mesmo com a alteração, discutida entre governo, representantes de trabalhadores e patrões, nove frentes parlamentares decidiram apresentar ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), um requerimento solicitando urgência na votação do projeto 5.552/2023. O documento será entregue em 6 de fevereiro, no início dos trabalhos legislativos.

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De autoria do deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPA), o projeto permite o trabalho de funcionários do comércio aos domingos e feriados sem intermediação de sindicados.

"É forma de garantir direito constitucional à livre iniciativa, como prevê a Lei da Liberdade Econômica, e não ficar a mercê de portarias que criam insegurança jurídica", diz Rodrigo Marinho, diretor-executivo da Frente Parlamentar do Livre Mercado.

Portaria foi negociada com setor e trará mais de 200 exceções, diz governo

Com a Portaria 3.665/2023, o ministro Luiz Marinho revogou as normas de outra portaria, a 671/2021, editada no governo de Jair Bolsonaro (PL), que dava permissão permanente para o trabalho aos feriados, desde que respeitada a jornada estabelecida na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A repercussão negativa do empresariado, entidades civis e Congresso fez o ministro recuar. No fim de novembro, Marinho modificou a portaria, editando outra, a 3.708/2023, que adiava a entrada em vigor das regras para março deste ano. Ele instalou então uma mesa de negociações com trabalhadores e empregadores do comércio para chegar a um acordo sobre o tema.

Na última quarta-feira, após reunião com entidades, Marinho anunciou a inclusão de exceções, mas manteve a exigência da participação dos sindicatos nas demais categorias.

"Fizemos o ajuste em todo o texto da portaria, que será republicada. Há uma bancada de relatores alterando o texto, que não apresentará hoje a versão final. A portaria anterior teve o único objetivo de provocar essa conversa nacional, com uma mesa permanente para discutir o tema, inclusive daqui para frente", afirmou Marinho.

Segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC), que representou as empresas na negociação, a lei abrange apenas o comércio de produtos. Serão mais de 200 setores ligados aos serviços, como bares, restaurantes e hotéis, que continuarão sem a necessidade de convenção.

"A lei não contempla bares e restaurantes, que são do grupo de turismo e hospitalidade. A portaria vai deixar claro as categorias que poderão funcionar sete dias da semana, como hotéis, assim como outras atividades. A lei diz respeito a parte do comércio que cuida do atacado e varejo, comércio de mercadorias, compra e vendas. Por isso, a gente trata a excepcionalidade com cuidado para que todos tenham tratamento isonômico", afirmou Ivo Dall'Acqua, da CNC, após a reunião.

Supermercados ficam de fora e precisarão de convenções

Supermercados, no entanto, vão precisar de negociação coletiva. Em novembro, na primeira edição da portaria, a Associação Brasileira de Supermercado (Abras) foi uma das mais críticas à medida, alegando consequências como aumento dos custos de mão de obra e redução da oferta de emprego.

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O setor é responsável pela comercialização de 93%% de gêneros de largo consumo e emprega 3,2 milhões de trabalhadores, direta e indiretamente. São 28 milhões de consumidores atendidos diariamente em 94.706 mil lojas no país.

Na sexta-feira (26), a Abras endossou a nota conjunta de cinco frentes parlamentares apoiando a votação do Projeto de Lei 5.552/2023. O comunicado afirma que a nova portaria é um "retrocesso e não atende às reivindicações do setor produtivo e da liberdade do empreendedor".

Segundo as frentes, apesar das exceções apresentadas, o texto "pouco avançou no sentido de reduzir a interferência sindical nos acordos estabelecidos entre trabalhador e empregador nas atividades essenciais para a população, conforme estabelecido pela reforma trabalhista".

"Além disso, a mesa de diálogo estabelecida, em uma outra portaria, não contou com a participação dos representantes das entidades empresariais de livre adesão, que não foram consultadas para o firmamento do novo texto. Outros segmentos como o varejo alimentar (supermercados e atacadistas) vão precisar de acordos coletivos para funcionar. Tal obrigação acarreta o aumento do Custo Brasil e da burocratização dos negócios, o que pode dificultar a empregabilidade e a liberdade econômica", completa a nota.

Portaria do governo dá mais poder aos sindicatos via negociação coletiva

Para o ministro, a portaria vai "corrigir uma ilegalidade" da norma anterior, de 2021, que liberou o trabalho aos feriados sem a negociação coletiva.

Na prática, a medida do governo Lula dá mais poder aos sindicatos. Desde o início do mandato, Marinho tem se empenhado na agenda sindical, buscando formas de financiamento das entidades, que perderam recursos desde o fim do imposto sindical na reforma trabalhista de 2017.

"A portaria está dentro da estratégia declarada do governo de valorizar o instrumento da convecção coletiva e, consequentemente, das entidades", diz Mariana Siqueira, da área trabalhista do Madrona Fialho Advogados.

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Roberto, Lopes, da diretoria jurídica e sindical da Confederação Nacional do Comércio (CNC), lembra que a Lei 10.021, em vigor, já determina a necessidade de convenção coletiva. "A negociação coletiva é o fórum mais adequado dentro do ordenamento sindical, valorizado pelo Supremo [Tribunal Federal], que restaurou a contribuição assistencial", afirma.

Para Siqueira, no entanto, a obrigatoriedade deve criar muitos problemas operacionais para empresas e segmentos não sindicalizados, aumentando a burocracia. "Empresas menores terão problema com feriados que ocorram antes das novas negociações", diz.

A redação da nova portaria deve ser finalizada ainda nesta semana, e será submetida ao novamente aos representantes dos empregadores e trabalhadores. Deve vigorar a partir de sua publicação, prevista para 19 de fevereiro, segundo o Ministério do Trabalho.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]