Manoel e Laira (acima) vivem a mesma angústia de uma época de recessão e falta de emprego: 24,1% dos jovens entre 18 e 24 anos estão à procura de trabalho no país.| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Para quem cresceu acostumado com a estabilidade do Plano Real, a crise atual tem um quê de novidade. Inflação alta, falta de empregos e alto endividamento são anomalias econômicas que o país tinha superado – com alguns tropeços no meio do caminho, é verdade. Justamente esses jovens que cresceram na calmaria econômica é que mais têm sofrido com os solavancos do país.

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Dados do IBGE mostram que no primeiro trimestre de 2016, 24,1% dos jovens entre 18 e 24 anos estavam desempregados, um crescimento de 6,5% em relação ao mesmo período do ano passado. Para a população geral, a taxa de desocupação no início deste ano foi de 10,9%.

Não consigo pagar o cartão porque não tenho emprego e não consigo emprego porque as empresas não contratam negativados.

Laira Caroline Pereira,20 anos, que está desempregada há um ano.
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Manoel Pereira, de 19 anos, e sua namorada Laira Caroline Pereira, 20, sentem o impacto destes dados no dia a dia. Ele está desempregado há três meses e ela há um ano. Na manhã da última quinta-feira (2), ambos enfrentaram seis horas de fila para pleitear uma das 350 vagas anunciadas pelo supermercado Festval, em Curitiba. Laira, que é técnica em meio ambiente, conta que nunca tinha sido tão difícil encontrar um emprego. “Nunca tinha ficado tanto tempo desempregada. Apesar da minha formação, estou tentando a vaga no supermercado. A gente tem que optar pelo que tem”, diz.

Manoel, que começou a trabalhar aos 13 anos fabricando cadeiras de vime, já trabalhou em oito empresas diferentes, apesar da pouca idade. Ele conta que em outros momentos chegou a pedir demissão por não vislumbrar possibilidades de crescimento dentro da empresa, atitude que hoje não repetiria.

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Eline Kullock, presidente do grupo Foco e especialista no estudo de gerações, conta que a troca frequente de empregos é uma das características da geração atual. “Esses jovens foram criados com uma resistência baixa à frustração. Então, quando as coisas não estavam boas, pediam demissão e conseguiam emprego na empresa ao lado”, afirma.

A dificuldade em conseguir emprego também atinge jovens com formação superior. Quando Lanaha Gapski entrou no curso de engenharia civil, a promessa era de que a demanda do país por engenheiros era enorme e uma colocação no mercado de trabalho era certa. Seis meses depois de formada e sem conseguir uma colocação em Curitiba, a jovem voltou a morar com a família, em Guarapuava, e hoje trabalha na empresa do pai. “Achei que o mercado estaria melhor. Estou tentando concursos públicos no Paraná e pretendo fazer uma especialização”, diz.

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Poder de compra

Desempregados e enfrentado uma inflação de 10% ao ano, os jovens veem seu poder de compra desabar. Para uma geração incentivada a consumir e a “viver o momento”, como diz Eline Kullock, esse fato é gerador de muitas frustrações e mudanças de hábito. Quem passou por momentos de hiperinflação entende a importância do planejamento do orçamento doméstico e sabe adaptar seu perfil de consumo às possibilidades de compra. Para os jovens isso é novidade. “Se esta crise tem um único efeito positivo, é fazer com que as pessoas aprendam a se planejar. Oxalá pudéssemos aprender sem passar por isso”, diz a consultora.

Endividamento cresce mais entre os jovens

Outro retrato do impacto da crise na juventude brasileira é o indicador de endividamento da população. Atualmente, existem 9,4 milhões de jovens inadimplentes no país, de acordo com pesquisa da Serasa Experian. A faixa etária entre 18 e 24 anos não lidera neste quesito, mas é a que mais cresce. Em março de 2015, os jovens representavam 14,7% da população inadimplente, um ano depois essa taxa é de 15,7%.

Laira Caroline Pereira é uma dessas jovens endividadas. Desempregada há um ano, ela recorreu ao cartão de crédito para conseguir fazer compras para casa. Sem fonte de renda, ela não conseguiu honrar as parcelas do cartão, que seguem crescendo a taxas médias de 448% ao ano. A jovem se queixa de estar em uma bola de neve. “Não consigo pagar o cartão porque não tenho emprego e não consigo emprego porque as empresas não contratam negativados”, afirma.

Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, diz que as principais portas de entrada para a inadimplência de jovens são o cartão de crédito e o cheque especial. Para o economista, a falta de planejamento financeiro também pesa contra. “A maturidade em lidar com as finanças e o crédito em geral se aprende com o tempo. Além disso, jovens normalmente têm renda menor que os adultos, por isso não têm poupança ou algum ativo do qual possam se desfazer em momentos de dificuldade”, avalia.