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Combinação “alto custo de produção” e “preço baixo na bomba” prejudica usinas de etanol | Hugo Harada/ Gazeta do Povo
Combinação “alto custo de produção” e “preço baixo na bomba” prejudica usinas de etanol| Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo

Ascensão e queda

Em 10 anos, o mercado nacional de etanol passou por duas realidades distintas: crescimento e queda. A produção passou de 15,3 bilhões de litros na safra 2004/2005 para 27,5 bilhões de litros em 2008/09. Após esse período, os resultados ficaram mais tímidos, registrando o menor deles na safra 2012/2013 com 22,6 bilhões de litros. No Paraná, o setor também teve crescimento acelerado após 2004, atingindo 2 bilhões de litros do produto na safra 2008/2009. No entanto, a produção recuou nos anos seguintes, chegando a 1,4 bilhão de litros na safra de 2013/2014. Para este ano, a expectativa é fabricar 1,5 bilhão de litros.

Opinião

Uma crise mais política do que de mercado

Cassiano Ribeiro, editor de Agronegócio da Gazeta do Povo

Enquanto o Brasil não tiver uma política de bioenergia bem definida, clara e séria, muitas outras usinas de açúcar e etanol ainda podem fechar. A crise do biocombustível, especificamente, é consequência da falta de regulamentação, que há anos dificulta a execução de um planejamento sólido no campo e na indústria.

Promessa antiga do governo, o aumento da proporção de 25% para 27% de etanol anidro à gasolina era dado como certo ao setor produtivo e esperado para este mês. Nesta semana, porém, veio o balde de água fria. O ministro da Fazenda Guido Mantega rechaçou o plano e nem sequer estipulou um prazo para cumpri-lo.

Além de não executar a política que garantia aumento da demanda interna, o governo mantém a Petrobras isenta de pagar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). A desoneração, que começou em 2012, é o calcanhar de aquiles do biocombustível, que perde competitividade frente à gasolina.

Novas apostas no campo e nas usinas, portanto, dificilmente voltarão a ocorrer num ambiente de insegurança e até de incapacidade para tomada de crédito. Aliás, a dívida bilionária do setor, que cresce em torno de 10% ao ano e se arrasta há mais de uma década, é resultado de um sonho prometido no início de década de 2000 e que pelo jeito está longe de ser concretizado: o de que o Brasil seria para o etanol o que a Oriente Médio é para o petróleo. Mas, com preços subsidiados para conter a inflação em ano de eleições, a gasolina vai mesmo continuar sendo o carro-chefe.

O setor de etanol entra na sexta safra consecutiva de crise, com congelamento de investimentos e produção longe do pico atingido em 2008, quando 27,5 bilhões de litros foram fabricados. Nos últimos cinco anos, das 384 empresas instaladas no país, 44 abandonaram o negócio. De janeiro para cá, seis usinas que operavam no vermelho pediram recuperação judicial, conforme a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única). No Paraná, seis projetos de construção de novas usinas que eram cogitados pela indústria em 2008 foram engavetados. Outras duas unidades fecharam as portas.

A crise da indústria de etanol é resultado da combinação de preço baixo, em grande medida provocado pelo controle do preço da gasolina, e custos em alta. Sem fechar as contas, o setor passou a acumular dívidas. O endividamento já passa dos R$ 60 bilhões, segundo levantamento da consultoria MBF Agribusiness.

"Em vez de crescimento, como esperávamos até 2008, tivemos um saldo negativo de menos duas usinas funcionando no estado", lamenta o presidente da Associação de Produtores de Bioenergia do Paraná, Miguel Rubens Tranin. Ele argumenta que, ao segurar o reajuste da gasolina, o governo federal criou um efeito em cascata que prejudicou quem apostou no futuro do etanol.

Margem apertada

O preço da gasolina é um balizador para a cotação do etanol, que só é competitivo quando custa até 70% do valor do combustível fóssil. Com o reajuste da gasolina represado, os usineiros não têm espaço para repassar a elevação nos custos de produção, que saiu da casa dos R$ 0,70 por litro em 2009 para R$ 1,30 atualmente. Em contrapartida, a cotação do etanol nas usinas chegou a ficar abaixo deste valor em 2014.

O governo federal tentou incentivar o setor com crédito subsidiado, com juros que chegam a 5,5% ao ano. Isso não foi suficiente para reverter o problema de caixa das usinas porque muitas delas nem se qualificam para a linha de crédito. Enquanto isso, a crise já provoca protestos, principalmente no interior de São Paulo, onde se concentram as usinas fechadas e boa parte das 80 mil pessoas que já perderam o emprego no setor, segundo cálculos da Única.

O diretor da MBF Agribusiness, Marcos Antonio Françóia, sugere duas soluções para ao menos refrescar a crise do setor: o aumento da mistura de etanol anidro na gasolina, dos atuais 25% para 27,5%, e uma política voltada para reduzir o endividamento do setor. No entanto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, descartou nesta semana qualquer acréscimo de etanol anidro na gasolina além dos 25%.

Produto de 2ª geração é aposta da indústria

Há 10 anos, quando as pesquisas para o desenvolvimento do etanol de segunda geração, feitos a partir do bagaço e da palha da cana, ainda estavam no papel, as ambições eram grandes. Mas a expectativa para realizá-las ainda era incerta. Agora, o cenário é de otimismo. De acordo com a Granbio Investimentos S/A, a Bioflex, primeira usina de etanol de segunda geração do país, deve ficar pronta até junho deste ano, em São Miguel dos Campos, Alagoas.

A unidade terá capacidade para produzir 82 milhões de litros do produto por ano. Um investimento de cerca R$ 350 milhões. A intenção, segundo a Granbio, é seguir com o projeto e investir R$ 4 bilhões em outras quatro usinas nos próximos anos.

Com a previsão do novo etanol chegar ao mercado já no ano que vem, o consultor internacional da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única), Alfred Szwarc, diz que, pelo menos a curto prazo, o produto não deve refrescar a crise do setor. Porém, ressalta, deve abrir novas portas para o mercado. "Existe interesse no produto. Quando lidamos com novas tecnologias existe um misto de curiosidade, ceticismo, otimismo e alguém que puxa a fila. A largada foi dada, agora precisamos de apostadores."

Conforme o consultor, se a tecnologia se mostrar efetivamente robusta em termos operacionais, não há motivos para não ganhar o mercado. "Acredito que, em 10 anos, teremos um setor bem diferente do atual", prevê.

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