De café a cabelo, muda o bairro, muda o preço

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Você já tomou um café e teve a sensação de ter pago por ele muito mais que em outras vezes? Antes de culpar a inflação, repare se você sentou no banco da padaria de sempre ou se foi a um bairro vizinho. Se a resposta foi a segunda opção, não é sensação, é constatação: ao trocar de bairro, a mesma xícara de café pode passar de R$ 1 para R$ 6,80 em Curitiba, uma variação de 580%. O mesmo vale para outros serviços, como salão de beleza, restaurante e estacionamento.

INFOGRÁFICO: Veja as diferenças de preços de produtos e serviços

Para comparar como andam os serviços na capital, a Gazeta do Povo levantou o preço de mais de 200 estabelecimentos de seis bairros de Curitiba com perfis semelhantes: Centro, Centro Cívico, Batel, Água Verde, Bigorrilho e Juvevê. O Batel tem sete de 11 produtos e serviços mais caros, e o Centro é o mais barato em nove categorias – por outro lado, é o campeão do preço alto quando o assunto é estacionamento.

Os serviços de beleza e os lanches evidenciam a diferença entre os dois bairros. O custo de cortar o cabelo, fazer a mão e o pé pode variar até 600% entre o Centro e o Batel. Tomar um café, comer um pão de queijo e um salgado também pode dar um susto no esfomeado: a diferença no valor do pão de queijo, que no Centro pode sair por R$ 0,30, e que chega a até R$ 3,70 no Batel, é de 1.133%.

O perfil de cada bairro é o que influencia nos preços. No Centro, os frequentadores dos estabelecimentos geralmente são pessoas que transitam pela região, mas não moram nela. No Batel boa parte dos serviços oferecidos é absorvida pelos próprios moradores, com renda maior.

"Jeitinho"

Quem não mora nos bairros avaliados mas trabalha neles é que precisa dar seu "jeitinho" para não ficar com a conta. A designer Aline Lourenço mora no São Braz e trabalha no Centro. Pelo menos duas vezes por semana vai de carro ao trabalho e deixa seu veículo em um estacionamento cuja diária custa R$ 12, uma das mais baratas que encontrou. Também almoça diariamente no Centro, onde gasta R$ 250, em média, por mês.

"Ainda é barato almoçar no Centro, mas temos de pesquisar muito. Já em relação a estacionamento não tem muito o que fazer: são poucos e os preços, altos. Quando dá tempo sempre vou ao salão no Centro, porque os preços também são bons", conta Aline.

No bairro com as médias mais caras, o Batel, Kamilla Fernandes, coordenadora de um site, aproveita o tempo que tem para fazer tudo o que pode na região. Fre­quentemente almoça em um restaurante por quilo, onde paga cerca de R$ 13. Vai ao salão semanalmente e paga R$ 14 para fazer a mão e R$ 20 pelo pé. "O vale-alimentação da empresa já é pensado para o perfil da região, que é mais caro. Por isso, vou a um restaurante mais simples para uma vez por semana poder ir a um melhor, em que o almoço sai por uns R$ 40", explica.

Brechas

Essa é uma das dicas do consultor em finanças pessoais Altemir Farinhas: visualizar brechas dentro do orçamento para poder, de vez em quando, poder se dar ao luxo de gastar um pouco mais. "Há uma diferença entre preço e valor. Quando almoçamos e pagamos R$ 10, optamos pelo preço; quando pagamos R$ 50, estamos vendo o valor. Se é uma vontade da pessoa, é preciso analisar bem as contas para poder, por exemplo, uma vez ao mês fazer uma escolha pelo valor", ressalta.

"Somos responsáveis por nossa inflação"

"Nós somos responsáveis pela nossa inflação". É com essa carga de responsabilidade que os consumidores devem agir na hora de pesquisar e escolher onde vão comprar produtos ou encomendar serviços, afirma o consultor de finanças pessoais Altemir Farinhas. Ele explica que as pessoas, em geral, ao realizar o caminho entre a casa e o trabalho, acabam identificando os pontos de comércio e lembrando apenas deles na hora de fazer compras, em vez de procurar outros.

Ele também recomenda que se tire da cabeça a ideia de que produto ou serviço mais barato é necessariamente pior. "Uma boa dica, que coloco em prática inclusive com minha família, é fazer um test-drive. Vou uma vez ao restaurante que aparenta ser mais simples ou ao salão que é mais barato, e experimento. Se for ruim, não volto mais; se for bom, passo a economizar", conta Farinhas.

Outra sugestão para quem trabalha em bairros em que o preço do almoço é elevado é levar a própria comida de casa. "Nesse caso, é preciso que a empresa disponha de uma cozinha para esquentar o almoço. Pode não ser a solução mais prática, mas ajuda a diminuir os custos. Acabamos nos acomodando muitas vezes e por isso não abrimos os olhos para opções que podem ser mais baratas", diz o consultor.

Perfil do consumidor influencia cobrança

Quando o assunto é beleza, é preciso preparo financeiro para ficar com tudo em cima. Um corte masculino varia de R$ 10 no Centro a R$ 70 no Batel, segundo o levantamento informal da Gazeta do Povo. O preço do corte feminino oscilou entre R$ 15 no Centro e R$ 100 no Batel. Manicure e pedicure podem dobrar de preço entre os dois bairros.

O lanche da tarde também pode pesar mais do que se imagina. Um simples pão de queijo pode subir 1.133% entre o Centro e o Batel, passando de R$ 0,30 a R$ 3,70 – cabe ressaltar que não se está comparando qualidade nem o tamanho, apenas o preço da unidade. O salgado também pode pesar no bolso entre os bairros vizinhos, variando de R$ 1,20 a R$ 4,50.

Para Rodrigo Kremer, economista do Instituto Superior de Administração e Economia (Isae/FGV) e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o perfil dos dois bairros dita a diferença entre os preços. "Quem procura um corte de cabelo ou um lanche no Centro está mais suscetível aos preços que quem está no Batel, onde não é o preço que define a procura, mas a qualidade, a infraestrutura. É da característica do bairro, com uma das rendas per capita mais altas de Curitiba", diz. O grande público do Centro e a concorrência e diversidade de restaurantes fazem com que os preços na região central sejam mais convidativos, avalia. "É um público que está de passagem, não reside no bairro e por isso busca o melhor preço."

O que define o preço mais alto dos estacionamentos do Centro e do Centro Cívico é a localização e a pouca oferta de vagas, somadas à demanda cada vez maior pelo serviço. Ambos os bairros ficaram empatados no levantamento, com a hora podendo chegar a R$ 10. No caso das mensalidades, o Centro dispara, com valores que chegam a R$ 300 por mês. Na outra ponta, no Água Verde, é possível encontrar estacionamentos com o valor da hora a R$ 2, devido, principalmente, à maior oferta de vagas de estacionamento regulamentado, o EstaR. "Os serviços não são homogêneos e por isso a comparação é mais difícil. Mas a dica para o consumidor é pesquisar sempre", alerta Kremer.