Enquanto no La Santa, mesmo havendo mesas, os clientes preferem comer na calçada...| Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo

Artigo

Almoço grátis: o brasileiro ainda acredita que existe!

A história do almoço grátis começou nos Estados Unidos do século 19, quando restaurantes inteligentemente ofereciam almoço grátis para quem consumisse bebidas alcoólicas durante a refeição. Todos os dias, milhares de trabalhadores enchiam esses lugares para tomar uma boa cerveja. Pagavam por suas bebidas e o almoço era por conta da casa.

Não precisa ser economista para perceber que de alguma forma, ou melhor, na forma de cerveja, os restaurantes cobravam o almoço dos clientes. Aparentemente ótimo para quem pretendesse comer e beber – pagava a bebida e ganhava o almoço. Na verdade, ruim para quase todos, e péssimo mesmo para aqueles que não pretendiam almoçar, mas apenas desfrutar uma boa cerveja; afinal, pagavam mais caro, pois no preço da cerveja estava embutido o almoço grátis do seu colega de trabalho. Ou seja, alguém sempre paga a conta.

No Brasil moderno, um bom exemplo de almoço grátis é o desconto para meia entrada de estudantes. Nunca entendi por que ser estudante deve favorecer alguém para ir ao cinema, ao teatro ou ao jogo de futebol, entre outras dezenas de "favores".

Para o leitor entender onde está o problema, vamos considerar que 40% dos usuários desses serviços sejam estudantes. Se você tem um teatro com 100 lugares e quer ganhar um lucro de R$ 100 por noite, considerando uma margem de 10% sobre a venda de cada ingresso, basta cobrar R$ 10 por pessoa.

Porém, se 40% deles forem estudantes e pagarem apenas R$ 5 pelo ingresso, os demais terão de pagar R$ 13,34 para que o dono do teatro tenha o mesmo lucro de R$ 100. Como o dono do teatro não vai "pagar a conta", todos os que não forem estudantes vão arcar com um aumento de 33% no preço dos ingressos.

É por isso que a Fifa fez o Congresso aprovar uma lei abolindo a meia entrada nos jogos da Copa. Estima-se que as 3,3 milhões de entradas no torneio arrecadem US$ 500 milhões ou R$ 1,1 bilhão ao câmbio de R$ 2,25 por dólar. Imaginando que "apenas" 40% dos ingressos acabassem nas mãos de estudantes, a perda de receita seria de R$ 450 milhões, um almoço meio indigesto para Fifa.

A conta é alta e não para de crescer. Quem comemorou a queda das passagens de ônibus – após os maiores protestos desde o governo Collor – talvez não tenha se dado conta da conta (desculpe o pleonasmo). Apenas com a queda das tarifas do transporte público, o custo para São Paulo, cidade e estado, será próximo de R$ 1,5 bilhão por ano. Para o Rio será de algo entre R$ 400 milhões e R$ 500 milhões e, para Curitiba, ao redor de R$ 60 milhões. O problema é que governo é uma ficção. O que existe e paga a conta é a sociedade. A conta sempre cai no nosso bolso, de uma forma (mais impostos) ou de outra (piores serviços).

E na fila de votações, novos e velhos projetos de almoço grátis! Passagem aéreas grátis para idosos, passagens interestaduais grátis para estudantes, pedágio grátis para estudantes. Há ainda, o "pequeno" custo estimado em R$ 97,7 bilhões que arcaremos nos próximos dez anos para que pessoas possam se aposentar a partir dos 50 anos se o fim do fator previdenciário for aprovado.

Mas, como disse um aluno meu que foi aos protestos, o problema do Brasil é que os impostos são altos e o Estado é ineficiente e corrupto. Tenho de concordar com ele. Mas não custa acrescentar: no Brasil tem muita gente que não gosta de pagar pelo almoço!

Fábio Tadeu Araújo, economista e mestre em Organizações e Desenvolvimento. É professor da PUCPR e sócio da Brain – Bureau de Inteligência Corporativa.

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350 pedaços de pizza são consumidas todas as noites nas ruas do São Francisco, desde o início do Pizza. Cada pedaço custa R$ 4 para aqueles que comem nas calçadas

...o Rock’a Burguer teve de se adaptar para atender os consumidores que queriam comer ali fora...
...junto com aqueles que, desde a abertura do Pizza, preferem comer os pedaços de massa ao ar livre

Três restaurantes oferecem um tipo diferente de alimentação para consumidores do bairro São Francisco, em Curitiba: comidas para serem consumidas na rua. Basta passar pela região da Rua Trajano Reis durante a noite para notar as calçadas cheias de gente, de pé ou até sentadas no meio-fio, comendo hambúrgueres, pizzas ou tacos.

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Um desses estabelecimentos é o Pizza, aberto há um ano. O estabelecimento já nasceu com a proposta de servir comidas na calçada e não tem nenhuma mesa. "Eu morei na Itália e várias lanchonetes lá funcionam assim, servem para o pessoal comer na rua mesmo. Quando voltei, resolvi aplicar o conceito por aqui e escolhi um ponto em que o pessoal já tinha o hábito de ficar pela rua, o Largo da Ordem", comenta Lucas Cintra, que, com o sócio Rafael Fusco, já prepara a abertura de uma filial na Vicente Machado.

Por ter surgido com a proposta de servir clientes que vão comer em pé, Cintra não sabe o quanto economiza por não ter garçons ou mesas. Lá, três funcionários servem cerca de 350 pedaços de pizza por noite a R$ 4 cada um, em um espaço de 14 metros quadrados. Para efeito de comparação, o piso da categoria de garçons estabelecido pelo Sindehotéis é de R$ 798 – dois funcionários custariam R$ 1.596 mensais.

Fazendo o caminho contrário, o Rock’a Burguer nasceu como um restaurante "normal" e se adaptou para atender aàdemanda dos clientes que queriam consumir do lado de fora. O espaço é para oito mesas, e o quadro de funcionários foi aumentado para atender o crescente consumo de sanduíches, que custam a partir de R$ 8.

O restaurante atende de 300 a 400 pessoas nas noites de sexta-feira e sábado. Débora Braga Schwarz, sócia do espaço, atribui o grande movimento ao estilo dos consumidores da região. "Sem dúvida, ficar na calçada é uma característica dos frequentadores do São Francisco. Começou com o Torto [bar da região]. É uma quadra de vários bares e o pessoal vai migrando entre eles. Os clientes acabam comendo na rua, já que todo mundo se encontra na calçada".

O La Santa, aberto há dois meses e meio, serve tacos e burritos (a partir de R$ 4). Lá há algumas mesas no térreo e um mezanino, que é uma espécie de sala de estar. Mesmo assim, os clientes optam pela rua.

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"A maior parte do público acaba indo para a calçada. É uma maneira de as pessoas interagirem. Além disso, com a nova legislação dos fumantes, muita gente acaba escolhendo comer do lado de fora para poder fumar", comenta Felipe Mazzarotto, um dos sócios do restaurante.

No La Santa, o pedido é feito no balcão e levado para o cliente em qualquer um dos ambientes. "Oferecemos atendimento mesmo para quem está de pé, não precisa estar formalmente sentado. A demanda de atendimento acaba sendo a mesma, mesmo com o pessoal na rua", diz Mazzarotto.

Vantagens para cliente são preço e comodidade Entre os clientes dos restaurantes de comida de rua, as vantagens vão desde o preço até a possibilidade de comer do lado de fora. Carol Reine, publicitária e moradora da região, frequenta cerca de duas vezes por semana esses estabelecimentos. Para ela, um dos maiores atrativos é justamente poder ficar ao ar livre. "É legal ali no São Francisco porque você não precisa ficar preso a um estabelecimento. Como a concentração de gente é grande, dá para encontrar mais pessoas do lado de fora", conta.

Luciana Kimi, também consumidora da região, destaca o ambiente que esses estabelecimentos proporcionam: "Gosto da ideia de encontrar as pessoas e ficar na rua. Acho que é uma atmosfera diferente dos restaurantes convencionais, em que você é recepcionado e levado até a sua mesa, senta confortavelmente e pede comida para o garçom".

Para a advogada e cozinheira Paola Pizzano, os pontos positivos desses estabelecimentos são a praticidade, a rapidez e o preço. "Aqueles dias em que a fome bate e o cotidiano não nos permite ter muito tempo livre, a facilidade de pedir uma comida que fica pronta em instantes sem a necessidade de sentar, comer, pagar, torna esses lugares muito interessantes", pontua.

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Mudança de Hábitos

Mais segurança – e mais lixo – são consequências do consumo nas ruas

Entre os vizinhos, os restaurantes são responsáveis por duas mudanças: mais segurança e mais lixo na rua. Segundo Felipe Mazzarotto, sócio do La Santa, o movimento de pessoas acaba criando uma espécie de segurança na região, até para os moradores. "Nosso vizinho de cima diz que prefere agora que estamos aqui e tem mais gente na rua, que ele acaba se sentindo mais seguro", ressalta.

Ainda assim, Carol Reine, publicitária que mora na região, comenta que existem pontos negativos para os moradores também: "A maioria dos restaurantes limpa a rua quando fecha, mas o problema fica em quem sai de perto e acaba largando as coisas por onde vai andando".

Os três restaurantes afirmam fazer a limpeza da calçada em frente ao estabelecimento, mas nem sempre isso basta para resolver a situação. Para Débora Braga Schwarz, do Rock’a Burger, a região precisa de mais apoio da prefeitura.

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"Nós tentamos fazer duas coisas quando o pessoal começou a ir para fora: ter uma lata de lixo grande na calçada para comportar o material e juntar as garrafas de vidro da região próxima do restaurante. Para melhorar, precisaríamos de um suporte maior da prefeitura com a limpeza e segurança", diz.