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Em julho de 2006, o construtor Maurício Zandonai foi à praia com a família. Mas ele não sabe quando terá a próxima folga. "Certamente não agora, porque o mercado está bastante aquecido", diz. Em seus trabalho com relações humanas em empresas, a consultora Dumia Dequech de Oliveira percebe que esse tipo de comportamento é comum para a maioria das pessoas em ambientes corporativos. Férias? Só se for com laptop e celular ligados. "Isso se tornou um padrão, como levar trabalho para casa, mesmo que a empresa não peça."

Como conseqüência, o estresse atinge aspectos biológicos, psicológicos e sociais da vida da pessoa. "Chega a bagunçar tudo, incluindo a circulação e a respiração", alerta Dumia. Férias curtas também não são o melhor caminho porque, segundo os consultores, em geral é apenas na metade do tempo de folga que a pessoa estará realmente descansando. "Na primeira e na última semana, ela se mantém ligada ao trabalho", diz o professor de psicologia da Pontifícia Univeridade Católica do Paraná (PUC PR), Ulisses Natal.

Se antes o problema afetava mais os homens, hoje atinge também mulheres – para quem trabalhar demais costuma gerar mais sentimento de culpa para com a família. "Eu trabalhava no Rio de Janeiro num ambiente em que as pessoas tinham medo de perder o lugar. A situação era tão grave que alguns decidiam nem ter filhos", conta a assessora da Universidade da Indústria (Unindus, ligada ao Sistema Fiep), Lúcia Padilha. Quem dirá tirar férias.

O consultor organizacional Dante Quadros percebe esse comportamento mais comumente entre pessoas que ocupam cargos da área administrativa e financeira – e o considera um desajuste, reforçado pela concorrência interna. "A pessoa se vê ameaçada pelos colegas e acredita que suas chances de sucesso estarão comprometidas em sua ausência", diz. "E realmente acontece de pessoas se valerem da saída de outras para se beneficiar, por falta de senso ético."

Quando se mudou para Curitiba, há quatro anos, Lúcia deixou para trás o ambiente de medo, mas percebeu que continuava com dificuldades em conciliar a vida particular com o trabalho. "Eu voltava tarde para casa, trabalhava sem parar, e percebi que isso estava fazendo mal para mim e minha família. Foi quando decidi mudar. Agora já tenho férias de um mês marcadas para julho", comemora.

Para quem é dono do próprio negócio, como o construtor Maurício Zandonai, a necessidade de acompanhar cada projeto torna ainda mais difícil a tarefa de planejar uma folga. "Embora considere importante repor as energias e manter o equilíbrio, prefiro estar presente para garantir a saúde da obra e o resultado final." Nas raras ocasiões em que consegue sair, ele mantém o celular sempre ligado. "Fico preocupado. Mas tendo uma boa equipe é possível administrar isso."

O arquiteto Luiz Maganhoto é mais uma vítima do próprio trabalho. A busca pela satisfação do cliente dificulta que ele se desligue. "Minha intenção é chegar à perfeição. Por isso dificilmente tiro férias, fora a semana entre o Natal e o Ano Novo."

Como muita gente faz reformas em janeiro, é ainda mais difícil para ele se afastar da cidade nesse período. "E nos feriados ao longo do ano, prefiro não me ausentar. Tudo passa pela minha mão e as pessoas ligam para falar comigo." Estar sempre disponível é o preço que ele decidiu pagar para se diferenciar.

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