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Caminhão de entreega do FedEx, nos EUA: entregas rápidas consomem mais recursos ambientais. | DAVID MCNEW/AFP
Caminhão de entreega do FedEx, nos EUA: entregas rápidas consomem mais recursos ambientais.| Foto: DAVID MCNEW/AFP

Ruchit Garg, empresário do Vale do Silício, confessa algo estranho no seu hábito de compras pela internet: a cada nova entrega, e muitas vezes são várias ao dia, tem que enfrentar a fonte de seu remorso e frustração: mais uma caixa de papelão. Em seguida, ao abrir a encomenda, quase sempre dá de cara com uma versão moderna das matrioscas russas: caixas dentro de caixas para proteger eletrônicos, desodorantes, roupas, produtos comestíveis. Garg obviamente recicla tudo, mas, outro dia, levantou a questão no Twitter.

Vários cientistas e legisladores estão interessados no mesmo tema, tentando entender o efeito ambiental em longo prazo de uma economia que cada vez mais funciona na base da satisfação imediata. Esse ciclo leva o consumidor a esperar que até suas vontades mais modestas sejam satisfeitas como necessidades urgentes – e nem sempre se sentem bem com isso.

A nova arma dos comerciantes cibernéticos é a velocidade, que acabou transformando a antiga propaganda da Federal Express – “Quando é absolutamente, inegavelmente necessário chegar lá no dia seguinte” – em algo tão pitoresco como se seu serviço fosse feito à base de cavalo e carroça. O Amazon se gabou, em um comunicado à imprensa de dezembro, de sua “entrega mais rápida até hoje”: um cliente de Miami que queria quatro copos de frappuccino do Starbucks foi atendido em dez minutos.

Em dez grandes regiões metropolitanas, o Google Express entrega os pedidos de dezenas de lojas em pouco menos de duas horas, incluindo brinquedos, remédios, ferramentas e comida de cachorro. A startup Postmates, de San Francisco, promete o serviço em menos de uma hora – e, com isso, entregou um milhão de encomendas em dezembro.

Em termos gerais, o setor de comércio eletrônico dobrou nos últimos cinco anos, chegando a US$350 bilhões, com o Amazon ditando o ritmo. Seu serviço Prime tem mais de 50 milhões de inscritos, segundo uma estimativa. (E o novo serviço, o Prime Now, ainda mais rápido, “leva qualquer coisa ao cliente em questão de minutos”, alardeia o site.)

O Uber chama seu serviço UberRush de “sua frota de entrega por demanda”; a Jet Delivery oferece a opção “luva branca” em menos de duas horas; a Instacart leva as compras do supermercado à sua casa em menos de uma hora.

O custo ambiental inclui o papelão adicional – 35,4 milhões de toneladas produzidas nos EUA, em 2014, com as empresas de comércio eletrônico entre os usuários que mais crescem – e as emissões dos serviços de entrega cada vez mais personalizados.

“Há uma verdadeira frota de caminhões circulando sem parar pelos bairros”, afirma Dan Sperling, diretor fundador do Instituto de Estudo de Transporte da Universidade da Califórnia em Davis e especialista da Diretoria de Recursos Aéreos da Califórnia. É também supervisor de uma nova força-tarefa estadual de que fazem parte empresas de transporte e autoridades com o objetivo de reduzir as emissões gerais das entregas, incluindo as do comércio eletrônico.

Para ele, o consumidor tem tanta responsabilidade pelo custo ambiental das entregas quanto as empresas que fornecem o serviço. “Do ponto de vista da sustentabilidade, estamos na direção errada”, lamenta. Entretanto, avaliar os efeitos da “economia de papelão” é mais difícil.

Há algumas compensações: por exemplo, ao comprar mais on-line, as pessoas usam menos o carro. E os serviços de entrega têm incentivos imensos para descobrir rotas mais eficientes para manter os custos com combustível e as emissões no nível mais baixo possível. No que lhe diz respeito, o Amazon revela que a entrega feita a partir de seus galpões gigantescos elimina a necessidade de distribuição a milhares de lojas.

Só que, até agora, o público que está fazendo compras pela internet continua indo para as lojas físicas tanto quanto antes, pelo menos para Sperling e outros especialistas. Um estudo recente que analisou o efeito ambiental do comércio eletrônico em Newark, Delaware, descobriu que a ascensão do comércio virtual dos últimos anos corresponde a um maior número de caminhões na rua e um aumento na emissão dos gases estufa.

Para Ardeshi Faghri, professor de Engenharia Civil da Universidade de Delaware, esse crescimento, que calcula ter sido de 20% de 2001 a 2011, pode ter sido ocasionado por vários fatores, mas as compras on-line e o grande número de caminhões são mesmo os grandes vilões.

“O comércio eletrônico não ajudou o meio ambiente; só piorou as coisas”, sentencia.

Outros estudiosos dizem que, pelo menos por enquanto, as compras on-line parecem só complementar a versão física, e não substituí-la.

“O pessoal que compra pelo computador também gosta de ver, sentir as coisas. Sem contar que há devoluções”, explica Cara Wang, professora associada do Instituto Politécnico Rensselaer que estuda questões de transporte e escreveu uma dissertação sobre os hábitos do consumidor on-line.

Não só ela como outros pesquisadores dizem que principalmente a demanda pela entrega instantânea vem criando desafios para as empresas de transportes que tentam ser eficientes, pois, em vez de levar cargas maiores a um único comerciante, agora têm que fazer viagens aleatórias e esporádicas.

Muitas vezes a entrega é de um único item – como é quase sempre o caso da Postmates, que tem uma frota de 15 mil motoristas independentes para fazer entregas de qualquer coisa que o cliente compre –, semelhante ao serviço oferecido pelo Uber. O custo geralmente começa em US$5, com uma taxa de serviço de nove por cento sobre cada item. (A empresa informa que conta com cerca de cinco mil entregadores independentes que trabalham a pé ou de bicicleta em áreas urbanas mais densas.)

Embora a reciclagem leve o consumidor a acreditar que está ajudando o meio ambiente, o processo não deixa de ter seus próprios custos, incluindo as emissões do envio do material aos centros que, por sua vez, usam muita energia e água. Para Don Fullerton, professor de Finanças e especialista em economia e meio ambiente da Universidade de Illinois, uma solução seria deixar os comerciantes responsáveis pelo recolhimento das caixas, o que acabaria se tornando um incentivo para a criação de soluções de empacotamento mais enxuto.

“E, quem sabe, acabar com essa história de pôr caixa dentro de caixa”, completa.

Robert Reed, porta-voz da Recology, empresa de reciclagem de San Francisco que coleta cem toneladas de papelão todos os dias, tem uma solução mais simples: “É só reduzir o consumo. É o que basta.”

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