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O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, vive o conflito o entre ajuste fiscal e o estímulo à economia. | Marcelo Camargo/ABr
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, vive o conflito o entre ajuste fiscal e o estímulo à economia.| Foto: Marcelo Camargo/ABr

A denúncia que pode levar ao impeachment de Dilma Rousseff se baseia nos truques contábeis que o governo usou para mascarar a deterioração das contas públicas, mas hoje elas estão bem longe do centro das atenções. Enquanto a maioria só tem olhos para o embate político, a situação das finanças do governo continua piorando, e as notícias que vêm dessa área apontam para um futuro sombrio.

A renegociação das dívidas dos estados, a proposta do governo para afrouxar controles fiscais, o boicote do PT a medidas de ajuste e até decisões do Supremo Tribunal Federal (STF): tudo conspira para rombos cada vez maiores nos cofres públicos, que são custeados pelo contribuinte.

Nem Dilma nem Temer mexem em subsídios ao setor privado

Não está nos planos de Dilma Rousseff nem nos de Michel Temer mexer nos bilionários subsídios e desonerações ao setor privado que ajudaram a arruinar as contas públicas nos últimos anos.

O total de benefícios fiscais, financeiros e creditícios saltou de 4,2% do PIB em 2008 para 6,5% do PIB em 2015, segundo estimativa dos economistas José Roberto Afonso e Vilma da Conceição Pinto, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV).

“Esses benefícios custam demais para o país e têm resultados muito duvidosos. É fundamental que se mexa nisso, talvez antes de outras reformas”, diz o economista Pedro Nery. “É muito difícil pedir sacrifícios para a população enquanto grandes indústrias continuam com subsídios e desonerações.”

“Nesse clima de salve-se quem puder, a situação fiscal está mudando para pior muito rápido. A necessidade de ajuste será cada vez maior lá na frente. As decisões serão mais complicadas e os impactos, mais duros”, diz Wagner Salaverry, sócio-diretor da gestora de recursos Quantitas.

Faz muito tempo que os analistas chamam atenção para a erosão das contas do governo, mas ela ficou mais evidente a partir de 2015, com a queda brutal das receitas. “O problema das despesas é estrutural, e vem de antes deste governo. O que a queda na arrecadação fez foi desnudá-lo”, diz o economista Pedro Nery, consultor legislativo do Senado.

Boicotes

O governo tem razão quando diz que o Congresso boicotou medidas de austeridade propostas no ano passado pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Mas também é fato que o PT, partido da presidente, atua contra iniciativas do gênero. E o atual titular da Fazenda, Nelson Barbosa, mesmo admitindo a necessidade de reformas, defende um alívio na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Barbosa propôs em março o Regime Especial de Contingenciamento, que diminui as metas de superávit da União, estados e municípios sempre que o PIB crescer menos de 1%. Na prática, o REC permite gastar mais no curto prazo e deixar a contenção para depois.

A bancada petista, por sua vez, tenta eliminar as condicionantes do projeto que renegocia a dívida dos estados, também formulado por Barbosa. Ao alongar o pagamento dos débitos em 20 anos e abater 40% das parcelas mensais por dois anos, a União deixará de arrecadar R$ 18 bilhões apenas em 2017. Em compensação, os governadores terão limitações, como não contrair dívidas por alguns anos . O que o PT quer é que as condições sejam discutidas só após o alívio das dívidas.

O ministro da Fazenda também viu naufragar sua tentativa de reformar a Previdência, com a definição de idade mínima para a aposentadoria. A ideia foi engavetada assim que Dilma chamou o ex-presidente Lula para a articulação política.

O maior golpe às contas da União veio do Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte concedeu liminares que permitem a alguns estados pagar juros simples na dívida com o governo federal. Se as decisões forem mantidas, a União pode perder até R$ 313 bilhões, o que elevará a dívida líquida do Tesouro em quase 6% do PIB.

NO LIMITE

O governo quer mudar a meta fiscal deste ano, permitindo um déficit primário de até R$ 96,7 bilhões. Se ela não for aprovada até 22 de maio, o governo terá de “encaixar” os gastos na meta em vigor, de superávit de R$ 30,5 bilhões. A diferença entre as metas (R$ 127,2 bilhões) mostra que não seria um corte simples.

Gastos obrigatórios dificultam ajuste

No primeiro bimestre, a receita líquida do governo central (Tesouro, INSS e Banco Central) caiu 1,4%, já descontada a inflação. As despesas seguem crescendo, pressionadas por gastos obrigatórios, que são definidos por lei ou vinculações constitucionais e não podem ser reduzidos. É por causa deles que, embora o governo tenha reduzido investimentos em 23% e gastos com pessoal em quase 3%, a despesa total aumentou cerca de 6% no início do ano.

Ainda que um eventual governo Temer busque algum tipo de ajuste, não estancará a sangria tão cedo. O resultado antes do pagamento de juros da dívida está no vermelho desde 2014 e, segundo estimativa da consultoria Rosenberg Associados, mesmo que Dilma deixe o governo até meados do ano, o setor público só vai zerar o déficit primário em 2018, após saldos negativos de 2% do PIB neste ano e 1,2% em 2017.

Orçamento engessado

O maior obstáculo ao controle de gastos é a “rigidez orçamentária”. Segundo o Ministério da Fazenda, 91,5% dos gastos primários (não relacionados à dívida) são obrigatórios. A rigidez tende a aumentar, patrocinada por parlamentares de situação e oposição.

No mês passado, por 402 votos a favor e um contra, a Câmara aprovou em primeiro turno uma medida que aumenta o porcentual da receita que deve ser obrigatoriamente destinado à saúde. Antes fixada em 15% a partir de 2020, tal fatia chegará a 19,4% dentro de sete anos. O que não se sabe é quais áreas perderão a verba que passará à saúde.

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