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Luciana Bechara, dona da Be Little: perdeu para a Ásia | Arquivo/ Gazeta do Povo
Luciana Bechara, dona da Be Little: perdeu para a Ásia| Foto: Arquivo/ Gazeta do Povo

Câmbio nocauteia vestuário

Exportar para os Estados Unidos foi o passo mais ambicioso da fabricante de roupas infantis Be Little desde que foi fundada, há 11 anos. Mas o sonho de ganhar o pequeno consumidor norte-americano durou pouco. Foram apenas dois anos, em 2005 e 2006, quando o dólar batia os R$ 3,50. Quando a moeda americana perdeu fôlego, o jogo virou e os produtos tupiniquins não conseguiram mais ser competitivos. "Naquela época, uma peça de roupa infantil chegava aos atacadistas nos Estados Unidos com preço entre US$ 6 e US$ 8. Se fosse exportar hoje, teria de vendê-las com valor entre US$ 13 e US$ 14, quase três vezes mais caro que os concorrentes chineses", diz a proprietária, Luciana Bechara.

Custos

Segundo ela, além do câmbio desfavorável, o aumento médio de 8% na matéria-prima e mais um reajuste de 10% ao ano na mão de obra nos últimos três anos tornaram a linha de produção, localizada em Pinhais, pouco competitiva. "É frustrante porque tínhamos potencial para aprender muito no mercado externo". A produção, de 25 mil peças por mês, hoje é 100% destinada ao mercado interno. "Não queremos barreiras aos produtos importados. Queremos ter condição de competir", diz.

  • Eloir Leal manda 20% das duchas Enerbras para o exterior

Há seis anos, com o dólar a R$ 3,50, a fabricante de roupas infantis Be Little vendia 8% da produção da sua fábrica, em Pinhais, na região de Curitiba, para os Estados Unidos. Mas sem a ajuda do câmbio nos últimos anos, a microempresa não conseguiu competir com os rivais asiáticos e teve de abandonar as exportações. "Hoje meu produto chegaria ao atacado nos Estados Unidos custando o preço cobrado pelas lojas ao consumidor, é inviável.", diz a proprietária, Luciana Bechara.

A Be Little engrossa a fila de empresas que vêm simplesmente desistindo de atuar no mercado internacional. Entre 2006 e 2012 o número de exportadoras no Brasil caiu de 24,6 mil para 18,6 mil, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC). Baixos índices de produtividade e inovação, altos custos e burocracia têm feito as exportações se concentrarem em um número cada vez menor de empresas, em geral de grande porte.

Cerca de mil empresas res­pondem hoje por 85% dos embarques brasileiros. No Paraná, apenas 2% do total de exportadoras são responsáveis por mais de 70% das vendas externas do esta­do. "Produzir no Brasil ficou muito caro", diz Julio Su­zuki, diretor de pesquisa do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico Social (Ipardes).

Conjuntura

Embora as exportações do país tenham crescido no período – de US$137,5 bilhões, em 2007, para US$ 242,6 bilhões no ano passado – elas também estão cada vez mais concentradas em produtos primários, de menor valor agregado. A indústria, que chegou a representar 71% das exportações brasileiras em 2007, hoje representa 61% do total. No Paraná, das exportações de US$ 17,7 bilhões em 2012, apenas 50,8% vieram de produtos industrializados. "As pequenas empresas são as que mais sentem esse ambiente pouco favorável para exportar. E no Sul a maioria das indústrias são de pequeno e médio porte", explica Maurílio Schmitt, coordenador do departamento econômico da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep).

O desinteresse pelas exportações pode ser medido por um ranking do Banco Mundial com 45 países que mostra o Brasil com o pior índice de empresas estreantes no comércio internacional. O levantamento levou em conta o período de 2002 a 2008. A pontuação brasileira foi de 22%, contra 38% da média. Trata-se de um cenário ruim para o médio prazo, porque empresas que exportam e enfrentam a concorrência internacional se tornam mais competitivas e mais inovadoras, com benefícios que chegam também ao mercado interno, alerta Suzuki. "Há uma deterioração qualitativa do comércio exterior brasileiro em um cenário internacional de concorrência acirrada, onde o grande destaque é a China", diz.

Tecnologia nacional garante vendas na América Latina

Se boa parte dos pequenos exportadores não tem muito o que comemorar, a Enerbras caminha na direção contrária. A fabricante de materiais elétricos de Campo Largo começou a exportar há dois anos e hoje embarca 20% da produção de duchas para 11 países. Nesse ano, a lista de destinos deve ganhar mais seis, entre eles México e Colômbia.

"O chuveiro elétrico é uma invenção genuinamente brasileira e ganha, a cada ano, espaço em países principalmente da América Latina. Identificamos esse potencial e investimos nas exportações", diz Eloir Leal, diretor comercial. Os embarques já representam 10% do faturamento, de R$ 60 milhões. Lá fora, os concorrentes são empresas nacionais, como Lorenzetti e Corona. "Quando se investe em um produto em que você tem tecnologia, o câmbio não tem um peso relevante. Hoje até temos um concorrente chinês, mas ele é tão ruim que, mesmo barato, não consegue mercado. Já somos o segundo maior exportador de chuveiros do Brasil", diz ele.

Apesar da posição confortável, Leal diz que no mercado internacional não há espaço para acomodação. A empresa investe para driblar a cultura do modelo a gás e a resistência em relação aos níveis de segurança do modelo elétrico. "É um trabalho para convencimento e informação".

O objetivo da empresa, com 250 funcionários, é elevar as exportações de 30% a 40% neste ano. Para fazer frente ao aumento da demanda, a área de expedição de mercadorias será ampliada. Segundo Leal, a decisão de exportar veio também para compensar importações. A empresa importa componentes. "Assim o efeito do câmbio tem um impacto menor nas contas", diz.

FuturoBrasil deve perder mais espaço no cenário internacional

A queda de exportadores nos últimos seis anos não refletiu na redução dos volumes embarcados pelo Brasil, mas pode vir a tê-lo no longo prazo. "A pauta está mais pobre em termos de conteúdo, ao mesmo tempo em que depende mais de commodities", diz Julio Suzuki, do Ipardes. Hoje, para ser competitiva, a indústria teria de ter um dólar a R$ 2,80. Para complicar, Estados Unidos e União Europeia costuram um acordo de livre comércio que deverá ditar as regras de cerca de um terço das transações mundiais. "E um mercado perdido não se recupera no estalar de dedos", diz Maurílio Schmitt, da Fiep.

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