| Foto: Viktor Koen NYT

Pense por um instante no dióxido de carbono como uma forma de lixo, um subproduto da queima dos combustíveis fósseis. Assim como outras formas de lixo, quase todo o CO2 é jogado fora – dispensado na atmosfera, onde contribui para o aquecimento global. Uma pequena parcela do lixo é capturada e armazenada debaixo da terra para que não corra risco de entrar em contato com o ar.

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Porém, cada vez mais os cientistas se perguntam se, ao invés de jogar fora ou de armazenar o dióxido de carbono, seria possível reciclar pelo menos parte dele.

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Em laboratórios de todo o planeta, pesquisadores buscam formas de fazer exatamente isso. A X Prize Foundation criou um incentivo, um prêmio de US$ 20 milhões para equipes que consigam desenvolver até 2020 uma tecnologia capaz de transformar em produtos úteis o dióxido de carbono extraído da queima de carvão mineral ou de usinas de gás natural.

Mas o objetivo final dos pesquisadores da área é transformar o subproduto em um novo combustível. Em teoria, se isso pudesse ser feito em larga escala utilizando energias renováveis ou até mesmo a luz solar, não haveria aumento nas emissões – as mesmas moléculas de dióxido de carbono seriam emitidas, capturadas, transformadas em novos combustíveis e emitidas novamente, em um ciclo constante.

“O grande prêmio é descobrir como tornar o CO2 reciclável, uma fonte renovável de energia. Esse seria um avanço milenar para nossa sociedade”, afirmou Harry A. Atwater, cientista de materiais do Instituto de Tecnologia da Califórnia, o Caltech.

O dióxido de carbono é utilizado na fabricação de alguns produtos básicos como fertilizantes de ureia e determinados plásticos. Mas os processos não são energeticamente eficientes e praticamente todos utilizam CO2 retirado de reservatórios subterrâneos naturais. Mesmo que as empresas começassem a utilizar o dióxido de carbono capturado, o volume seria de menos de 0,5% dos cerca de 32 bilhões de toneladas métricas de CO2 emitidos anualmente em consequência de atividades humanas.

O que Atwater e outros pesquisadores imaginam são aparelhos que, em escala industrial, poderiam reciclar uma parcela significativa do dióxido de carbono capturado por usinas elétricas, durante a fabricação de cimento ou mesmo diretamente da atmosfera.

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Entretanto, desenvolver aparelhos capazes de converter de forma eficaz e lucrativa grandes quantidades de dióxido de carbono exige a superação de muitos obstáculos, como por exemplo, a geração de toda a energia necessária para separar as moléculas.

“O grande desafio é passar de miligramas para megatoneladas. Como vamos diminuir as emissões se, neste momento, as pessoas ainda estão na fase dos tubos de ensaio?”, disse Dick T. Co, professor da Universidade Northwestern e diretor-executivo do Instituto dos Combustíveis Solares, grupo que encoraja a colaboração entre pesquisadores da área.

Experimento

No setor de pesquisa do Laboratório Lawrence Berkeley, Atwater lidera uma equipe de cientistas que tentam imitar o que as plantas fazem por meio da fotossíntese. Eles querem utilizar dióxido de carbono e água e, com a ajuda da luz solar, transformar a mistura em combustível.

O centro, criado em 2010 por meio de um financiamento do Ministério de Energia, dedicou seus primeiros cinco anos à exploração de um dos aspectos da fotossíntese: a quebra da água em seus componentes: o hidrogênio e o oxigênio.

Atwater, Frances A. Houle, um dos vice-diretores, e Karl Walczak, cientista do projeto, demonstraram alguns dos frutos do trabalho – um sanduíche de materiais semicondutores, catalisadores e membranas no interior de um invólucro transparente com uma solução à base de água. Quando o chip é exposto à luz, bolhas de gás – hidrogênio de um lado, oxigênio do outro – se formam, subindo ao topo da solução.

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Segundo os cálculos da equipe, o chip é cerca de 10 vezes mais eficiente que uma planta comum, que utiliza cerca de um por cento da luz solar que chega até ela.

O centro está trabalhando agora na parte da equação fotossintética que depende do dióxido de carbono. O objetivo é integrar os dois processos em um aparelho que será bastante similar a um painel solar. Mas ao invés de gerar eletricidade, ele produziria combustível – talvez metanol, que poderia ser utilizado diretamente ou transformado em gasolina.

Entretanto, é muito mais difícil quebrar as moléculas de dióxido de carbono do que as de água. O processo envolve seis etapas que exigem o uso de energia e de um catalisador. A natureza parece fazer isso sem esforço, mas ela teve milhões de anos de evolução para melhorar o processo. “O grande desafio do CO2 é que ele gera diversos produtos possíveis. A natureza desenvolveu mecanismos muito refinados capazes de gerar um produto específico”, afirmou Atwater.

Boa parte do trabalho no centro envolve o estudo de catalisadores, por meio da análise teórica e do teste de possíveis combinações entre óxidos de metal com o objetivo de ver como funcionam. O método testado é similar a um aplicado para a descoberta de medicamentos, com equipamentos capazes de analisar de uma só vez grandes quantidades de amostras muito pequenas.

O objetivo é criar um aparelho que produza uma única substância, como no caso da fotossíntese natural, mas de forma mais eficiente. Ao mesmo tempo, o aparelho precisa durar muitos anos, assim como os painéis solares. Isso representa mais desafios de engenharia e projeto.

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Desafio dos cientistas é criar tecnologia que permita ganhos de escala

Existem outros grupos de pesquisa e algumas startups e empresas bem estabelecidas que também trabalham na conversão de CO2. A Sunfire, empresa com sede em Dresden, na Alemanha, construiu um protótipo que produz petróleo cru sintético a partir de dióxido de carbono e água. Parte do petróleo vira diesel, e em 2015, a Audi utilizou o diesel produzido pela Sunfire como combustível em um de seus automóveis.

O processo da Sunfire utiliza eletricidade, não luz solar, o que significa que a energia precisaria vir de fontes renováveis para que o resultado fosse significativo em termos de redução de emissões de dióxido de carbono. Em vista da quantidade de eletricidade necessária, um grande desafio é produzir um combustível capaz de competir em preço com combustíveis fósseis convencionais, afirmou Christian von Olshausen, CTO da Sunfire.

Conversores de CO2

Em Berkeley, em um laboratório que fica próximo ao Centro Conjunto de Fotossíntese Artificial, três jovens cientistas abriram uma empresa, a Opus 12, com o objetivo de desenvolver seu próprio aparelho de conversão de dióxido de carbono, movido a energia elétrica. Sua ideia consiste em explorar o fato de que o dióxido de carbono pode ser convertido em muitos produtos diferentes, por meio do desenvolvimento de catalisadores feitos sob medida para cada produto. “Nosso objetivo é criar um reator que funcione como uma espécie de plataforma”, afirmou Nicholas Flanders, fundador da Opus 12.

De acordo com Flanders, no próximo ano e meio a empresa planeja aumentar o reator para o tamanho de uma máquina de lavar louça. Isso seria o bastante para começar a gerar faturamento através da produção de substâncias específicas para mercados de nicho, que pagam preços relativamente mais altos. Em função da eletricidade necessária, todos os aparelhos feitos pela empresa devem utilizar alguma fonte de energia renovável para maximizar os benefícios em termos de redução de dióxido de carbono.

Além disso, Flanders prevê a fabricação de aparelhos ainda maiores, capazes de converter milhões de toneladas de dióxido de carbono em combustíveis e outras substâncias. Isso ainda não é muito, em vista das bilhões de toneladas de CO2 liberadas na atmosfera a cada dia, mas eles estão de olho no futuro. O Centro Conjunto de Fotossíntese Artificial também tem os olhos voltados para o futuro, ainda que Atwater seja realista em relação aos desafios da conversão direta de luz solar e dióxido de carbono em combustíveis. “Pode ter certeza de que os problemas com a falta de energia e catalisadores não serão resolvidos nos próximos cinco anos”, afirmou.