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Sem crédito na praça

Recentemente a presidente Dilma Rousseff incorporou a política fiscal em seu discurso, afirmando com veemência que as contas públicas estão sob controle. O mercado discorda, por uma série de razões:

Nos últimos dias de 2012, o governo recorreu a uma série de truques contábeis para cumprir a meta de superávit primário (economia feita para pagar os juros da dívida). A chamada "contabilidade criativa" corroeu boa parte da credibilidade da política fiscal.

Os gastos do governo crescem mais rápido que o PIB. Além de limitar o superávit, essa prática dá mais combustível para a inflação.

As desonerações de impostos, concedidas para estimular a economia, enfraquecem o caixa do governo. E ainda não deram grande resultado em termos de crescimento econômico.

O Tesouro está captando dinheiro no mercado, pagando juros próximos à Selic, e repassando a bancos públicos por taxas mais baixas. Em outras palavras, está perdendo dinheiro. Os recursos do Tesouro são usados subsidiar crédito a empresas e consumidores, a fim de incentivar o consumo e o investimento. Mas, assim como as desonerações, até agora não deram grande impulso ao PIB.

Essas operações do Tesouro elevam a dívida bruta do governo. Desde janeiro de 2001, ela subiu de 54,1% para 59,2% do PIB. Nesse período, a dívida líquida – que desconta os valores que o governo tem a receber – caiu de 38,8% para 35,4% do PIB. O problema é que, quando o Tesouro receber de volta o que emprestou de forma subsidiada, a dívida líquida tende a subir.

O crédito subsidiado também dificulta a ação do Banco Central no controle da inflação, porque as altas da taxa Selic só afetam os financiamentos "convencionais".

Em vez de perseguir as metas centrais de inflação e superávit primário, o governo dá a entender que trabalha com intervalos bastante amplos, o que também é visto com descrédito.

Embora o centro da meta de inflação seja de 4,5%, o IPCA acumulado em 12 meses está acima de 6% desde o início do ano. No caso do superávit, a cada ano o governo recorre a deduções que lhe permitem economizar menos que o prometido.

A mudança de humor dos mercados globais pegou o Brasil de calças curtas. A piora do cenário para os países emergentes teve efeito amplificado por aqui, onde a economia dá vários sinais de desequilíbrio e o governo já não conta com a confiança dos investidores.

INFOGRÁFICO: Veja a dívida bruta do governo federal

Com os indícios de recuperação nos Estados Unidos, o banco central norte-americano estuda diminuir o estímulo à atividade econômica ainda neste ano, o que enxugaria a oferta de dólares no mundo. Essa possibilidade – que já provoca uma forte migração de capitais de mercados emergentes em direção aos EUA – foi a deixa para investidores daqui e de fora extravasarem seu desgosto com os rumos da economia brasileira. Em um mês, a bolsa caiu 16% e o dólar subiu 10%.

"Sozinha, a retirada dos estímulos nos EUA já causaria um efeito no Brasil. A questão interna do país também já dava motivos para um certo nervosismo. Juntando uma coisa com a outra, o efeito foi maior", diz o doutor em Economia Rodolfo Coelho Prates, professor do mestrado e doutorado em Administração da Universidade Positivo.

O que mais incomoda o mercado é o aparente desleixo do governo com a política fiscal. No início do mês, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s avisou que pode rebaixar a nota de crédito do país, entre outras coisas por "alguma perda da credibilidade da política fiscal".

É fato que as próprias agências de risco perderam credibilidade nos últimos anos, e que o mercado financeiro tem lá seus faniquitos – muita gente gabaritada vê exagero nos movimentos recentes. Mas também está claro que a situação brasileira não é das mais confortáveis. O país passa por uma fase de baixo crescimento, inflação bem acima do centro da meta, piora no balanço de pagamentos e deterioração nas contas do governo.

Chegou a fatura

Para alguns economistas, o Brasil pode estar começando a pagar a fatura da "nova matriz econômica" implantada por Dilma Rousseff, que deixou de lado o "tripé macroeconômico" seguido desde os tempos de FHC.

Na avaliação dos críticos do governo, o tal tripé – formado por câmbio flutuante, superávit primário e metas de inflação – foi trocado por balizas mais frouxas, que resultaram em inflação mais alta e persistente e em descontrole dos gastos públicos.

O Planalto argumenta que teve de adotar uma política anticíclica, de estímulo à atividade econômica, de modo a compensar a estagnação global. A nova matriz teve seus êxitos: derrubou a taxa de juros e manteve o desemprego em níveis historicamente baixos. Por outro lado, fez pouco em termos de PIB. O crescimento médio da economia foi de apenas 1,8% nos últimos dois anos, o pior desde o biênio 1998-1999.

BEM-ME-QUER, MAL-ME-QUER

O governo tem uma relação controversa com o câmbio. Quando o Fed (banco central dos EUA) começou a jogar dólares no mercado, para dar gás à economia norte-americana, a equipe de Dilma Rousseff disse que o Brasil era vítima de uma "guerra cambial" que, ao desvalorizar o câmbio, prejudicava as exportações do país. Agora, que o Fed indica que pode retirar os estímulos até meados de 2014, o câmbio disparou – e o governo se vê preocupado com seus efeitos sobre a inflação.

20 centavos

Em um mês, o dólar comercial subiu 20 centavos, chegando a R$ 2,24 na sexta-feira. A alta agrada aos exportadores, mas dificulta o combate à inflação. Também tende a ter reflexos no caixa da Petrobras, por aumentar a defasagem entre o preço que ela paga para importar gasolina e diesel e o valor de revenda desses combustíveis no mercado doméstico.

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