Curitiba A última onda de elevação dos juros foi acompanhada de diversas críticas à meta de inflação perseguida pelo Banco Central. A taxa Selic subiu para controlar um desvio no curso do IPCA, índice de preços adotado para o cálculo do alvo a ser alcançado pela autoridade monetária. Na análise de diversos economistas, o aperto foi mais intenso do que o necessário de setembro de 2004 a maio de 2005, os juros básicos subiram de 16% para 19,75% ao ano. Uma das razões para que o remédio tenha ficado tão amargo seria a influência de mudanças bruscas de preços sobre o IPCA. E uma das soluções para que a meta seja mais facilmente atingida seria a retirada dessas variações do índice.
O índice de inflação que estabelece a meta perseguida pelo BC é chamado de "cheio". Ele reflete as principais mudanças nos preços praticados ao consumidor. A lista inclui itens corrigidos por contratos, como a conta de telefone e de luz, e outros que oscilam muito devido a fatores externos, como combustíveis e alimentos. A causa dos aumentos, nesses casos, não está na elevação da demanda, mas sim em fatores ligados à oferta dos produtos. "O problema é que quando os preços sobem por causa da oferta eles não são controlados pelo aumento dos juros", afirma o economista Marcelo Curado, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
A idéia de quem defende uma revisão na meta de inflação é que ela deveria ser controlada por um outro índice, chamado de "núcleo". A diferença para a inflação cheia é que os núcleos são calculados com a exclusão de itens ou com cortes nas maiores variações para cima e para baixo. Assim, a autoridade monetária estaria perseguindo um alvo que não sofreria tantas oscilações, sendo composto por preços que são diretamente influenciados pelo nível da Selic.
"A escolha do núcleo levaria a uma ação mais precisa das taxas de juros", explica o economista Hélder Luiz de Mendonça, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). "Não acho que o sistema de metas seja ruim, mas muitos países têm tido resultados melhores sem olhar a inflação cheia."
Entre as vantagens da adoção do núcleo está sua menor volatilidade (ou variação) diante de eventos pontuais. "No começo do ano, o aumento na passagem de ônibus contaminou a inflação em todo o país e pesou na decisão do Copom para aumentar os juros", lembra o economista Alexandre Fischer, diretor da consultoria GRC Visão. Para ele, o núcleo do índice ficaria livre desse tipo de variação e mostraria melhor a tendência que precisa ser observada pelo BC. Segundo o economista, o mercado e a autoridade monetária já fazem a análise dos dois tipos de índices, mas o martelo dos juros é batido com base no comportamento da inflação cheia.
Apesar dessa vantagem, a adoção do núcleo não é unanimidade. A economista Zeina Latif, do HSBC, avalia que a alteração seria arriscada demais para ganhos duvidosos para a política monetária. "A inflação no Brasil varia muito e por isso a medida do núcleo não mostra tendências claras. Não acho que haveria um parâmetro confiável para uma mudança desse tipo", argumenta. Além disso, haveria o risco de surgir dúvidas e especulações no mercado financeiro a respeito do compromisso do BC em atingir a meta. "Há outros ajustes mais importantes para a política monetária, como a geração de bons diagnósticos sobre a economia", sugere Zeina.
O economista Sérgio Vale, analista da consultoria MB Associados, também assinala que poderia haver um questionamento forte sobre a credibilidade da adoção do núcleo. "É verdade que o índice cheio não capta tão bem os efeitos da política do BC. Mas só o desgaste de se fazer uma escolha já afasta a idéia neste momento", pondera. "Haveria muito questionamento sobre que tipo de choque seria retirado do índice."
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