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| Foto: KEVIN D. LILES/NYT

Os painéis solares – 3.852 ao todo – cintilavam sobre quatro hectares de terra que Jimmy Carter usava para cultivar amendoim e soja. Os painéis se movem de forma quase imperceptível acompanhando o sol. E poderiam gerar eletricidade para mais da metade de sua pequena cidade, de onde Carter surgiu da obscuridade para a presidência dos Estados Unidos.

Quase 38 anos depois de ter instalado painéis solares na Casa Branca, para vê-los removidos durante o governo de Ronald Reagan, Carter está emprestando parte das terras agrícolas de sua família para um projeto que é ao mesmo tempo simples e inovador. Segundo ele e especialistas em energia, é uma iniciativa em pequena escala que poderia servir de exemplo para outros bolsões rurais norte-americanos em um instante de mudança climática e rancor político.

Mas o projeto de Carter, gerado durante anos, entrou em operação num momento complicado para os defensores da energia renovável. Embora o consumo de energia solar tenha mais do que dobrado nos EUA desde 2013, o presidente Donald Trump expressou ceticismo quando ao custo desse tipo de energia e prometeu recuperar a minguante indústria carvoeira do país. Ainda assim, em algumas áreas rurais onde Trump desfruta de grande apoio, projetos de energia renovável surgiram como forças econômicas importantes.

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“Espero que possamos ver a compreensão por parte do novo governo de que uma das melhores maneiras de gerar novos empregos – e empregos inovadores, produtivos e com bons salários – é por meio da busca por fontes de energia renovável. Ainda não vi isso acontecer, mas tenho esperanças de que ocorra”, afirmou Carter, de 92 anos, durante entrevista.

Embora o ex-presidente, décadas após a noite, em fevereiro de 1977, quando falou ao país sobre o “problema da energia”, continue sendo um estudante dedicado da política energética, o projeto solar também é uma extensão de seu legado aqui.

Há muito tempo Carter dá fama a Plains, onde é conhecido como “Sr. Jimmy”, e seu sorriso de professor de escola dominical – em retratos, em pinturas, na caricatura de enfeites natalinos e em uma estátua de amendoim de quatro metros – dificilmente passa despercebido. O selo presidencial enfeita placas de boas-vindas, iluminadas, adequadamente, por eletricidade solar, e o Centro Histórico Nacional Jimmy Carter atraiu mais de 1,6 milhão de visitantes desde 1988.

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O projeto nas terras de Carter, que alimenta a rede elétrica da Geórgia e gera à família do ex-presidente quase US$ 7 mil anuais, não precisava ser grande para atender boa parte da cidade de Plains, com população de cerca de 683 habitantes. Tudo começou quando uma empresa solar, a SolAmerica, procurou Jason Carter, neto de Carter, para discutir a possibilidade de instalar painéis aqui.

O ex-presidente, que tinha 11 anos quando sua casa passou a contar com água encanada depois que o pai instalou um moinho de vento, não precisou ser convencido e se envolveu profundamente com o projeto, escrevendo observações no contrato de arrendamento e visitando o local regularmente.

Jason Carter conta que o av|ô costuma enviar fotografias da instalação na fazenda, pela qual costuma passar durante caminhadas com a esposa, Rosalynn.

“Quando contei às pessoas que iríamos instalar painéis solares, elas perguntavam: ‘Em Plains?’”, conta Jan Williams, que administra a Plains Historic Inn e ajuda a organizar as aulas de Carter na escola dominical, que continuam atraindo turistas. “Eles dizem: ‘Bem, é por causa de Jimmy Carter’. É por causa de Jimmy Carter. Plains é toda centrada em Jimmy Carter.”

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O projeto de Plains, limitado em tamanho, segundo Carter e a SolAmerica, por conta do que a infraestrutura existente poderia suportar, não é a primeira do gênero na Geórgia, mas é um dos mais famosos no estado em que, após anos de relutância, os órgãos reguladores exigiram que a principal fornecedora de eletricidade dedicase maior ênfase à energia solar.

Neste estado, e em outras partes do país onde muitos moradores não estão convencidos da mudança climática, os defensores da energia renovável adaptaram seus argumentos para se concentrar nos benefícios econômicos. Segundo o Departamento de Energia, boa parte da geração de empregos no setor elétrico da Geórgia está na área solar.

“Os velhos argumentos politizados sobre energia renovável ser coisa de liberais do litoral não funcionam mais em partes do país onde as pessoas observam em primeira mão os benefícios econômicos do desenvolvimento da energia renovável e da criação de empregos”, diz Jodie Van Horn, diretora da campanha Pronta para os 100, do grupo ecológico Sierra Club, que incentiva cidades dos EUA a se comprometerem inteiramente com ofertas de energia renovável.

Porém, os defensores da energia renovável não precisam ignorar por completo os argumentos da mudança climática. Em 2014, no condado de Sumter, que inclui Plains, 62 por cento dos moradores acreditavam que o aquecimento global estava acontecendo, segundo estimativa do Programa sobre Comunicação da Mudança Climática de Yale. O total é pouca coisa acima daquele de alguns condados da região metropolitana de Atlanta.

Stan Wise, diretor da Comissão de Serviço Público da Geórgia, que não conta com membros do Partido Democrata, diz esperar que a energia solar continue, em parte porque “achou seu nicho”.

“Talvez ela não cresça tão rapidamente neste país sem o apoio do governo federal, mas acho que, se você deixar essas entidades sozinhas, quer seja carvão, gás natural ou solar, elas vão achar seu caminho se estiverem certas em seu estado”, afirma Wise, que observou que a fornecedora de energia estadual, após licitação, aceitou a proposta de Carter de participar de um programa de energia solar.

Mas a visão de Trump alarmou Carter.

“Eu temo – e espero estar errado – que Trump possa fazer a mesma coisa que Ronald Reagan fez e afirmar que podemos ser suficientes sem energia renovável. Mas espero que ele não faça isso”, declara Carter.

Recentemente, porém, as ambições energéticas de Carter eram decididamente mais locais quando, vestindo calça jeans com uma pequena mancha de barro, desceu de uma caminhonete Ford para ver novamente os painéis solares. Mas as lembranças de Carter e esposa não estavam muito distantes da presidência.

“É muito especial para mim porque fiquei muito desapontado quando os painéis foram removidos da Casa Branca, e agora é fantástico vê-los em Plains”, declarou Rosalynn Carter suavemente após a cerimônia de inauguração.

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