Atendimento hospitalar correspondeu a 15,8% dos gastos das famílias brasileiras com saúde| Foto: Arquivo/ Gazeta do Povo

Perpectivas

Pesquisadora diz que nada mudará

Agência O Globo

Para a professora do Laboratório de Economia da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ligia Bahia não houve mudança na estrutura dos gastos com saúde no país desde 2009. Ela também não vê uma tendência de crescimento das despesas da administração pública apesar da alta de participação verificada pela pesquisa. "No Brasil, o medicamento é comprado de forma totalmente separada da consulta e não é assim que acontece em um sistema integrado de saúde. A pesquisa mostra como é fragmentado nosso sistema de saúde e isso é preocupante tanto da lado da demanda, com pessoas em planos de saúde, quanto da oferta também. É um gasto muito pesado para as famílias e decepciona ainda não ver o impacto do programa Farmácia Popular nos números."

CARREGANDO :)

O sistema de saúde é universalizado, mas a realidade aponta para o desequilíbrio. A pesquisa Conta-Satélite de Saúde Brasil, publicada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Esta­tística (IBGE) e com dados referentes ao ano de 2009, revela que o brasileiro gasta 29,5% a mais do que o governo para ter acesso a bens e serviços de saúde. En­­quanto o Estado tem um dispêndio de R$ 645,27 por pessoa, o gasto per capita das famílias fica em R$ 835,65.

Em todo o território nacional, mais da metade das despesas são arcadas pelas famílias enquanto 43,7% são cobertos pela administração pública. Em números abso­­lutos, os gastos privados com saúde em 2009 somaram R$ 157,1 bilhões, 27% a mais que os R$ 123,5 bilhões pagos pelo setor público.

Publicidade

Apesar de as famílias gastarem mais, foi o governo que experimentou o maior crescimento de participação entre 2008 e 2009 e isso ocorreu com as despesas da administração pública em serviços de saúde, sobretudo, aquelas ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) que chegaram a 5,6% ante 5,4%, da pesquisa anterior. Os gastos da administração pública passaram de 3,5% para 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB), enquanto as das famílias subiram de 4,7% para 4,9%.

Situação ímpar

Também em 2009, todos os países da Organização para a Coope­ração e Desenvolvimento Econô­mico (OCDE), com exceção apenas do Chile, México e Estados Unidos, responderam, em média, por 72% das despesas com saúde. Ainda que na conta da OCDE entrem também os gastos com investimento (construção de hospitais e compra de equipamentos), os países da Organização contribuem mais para o custeio do setor que o Brasil. "Mantemos um padrão de sistema privatizado, mas que constitucionalmente é universalizado", afirma a professora Ligia Bahia, do Laboratório de Economia da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Para o gerente da Coorde­nação de Contas Nacionais do IBGE, Ricardo Montes Moraes, a dis­­paridade de gastos entre famílias e governo é atípica. "Isso [o fato de as famílias gastarem mais que o governo] é algo que não é comum e se deve ao fato de a saúde no Brasil ser tão privatizada", considera.

No ano em que a economia brasileira encolheu 0,3%, os gastos de famílias e da administração pública com saúde como proporção do PIB subiram. A parcela de despesas com medicamentos, exames, consultas e os custos da administração pública com salários e serviços subiram de 8,3% do PIB, em 2008, para 8,8% do PIB em 2009. Moraes explica que os gastos com consumo tendem a variar menos que a economia em geral e que o movimento é comum em países que enfrentam recessões. "O aumento dos gastos não ocorre só no Brasil, mas em vários países que passaram por crises. A tendência tem a ver com o aumento da renda, o envelhecimento da população e não necessariamente com a introdução de novas tecnologias, que ainda é um tema bastante controverso", pondera.

Publicidade

Setor gera menos postos, mas paga melhor

Tanto os governos quanto as famílias aumentaram as despesas com saúde em 2009, mas, na geração de emprego, os setores público e o privado seguiram caminhos opostos. Em comparação com 2008, houve redução de 58.961 postos de trabalho em saúde pública, enquanto as atividades privadas tiveram aumento de 58.840 vagas. Com isso, o total de ocupações em atividades relacionadas à saúde ficou estagnado em 4,326 milhões de vagas, com uma pequena redução de 121 empregos. Os números referem-se a postos de trabalho e não número de trabalhadores. No setor, é comum que um profissional tenha mais de um emprego.

Para os técnicos do IBGE, a queda nos postos de trabalho em saúde pública é pontual e pode ser explicada por grande número de aposentadorias sem reposição imediata dos servidores ou contratação de serviços terceirizados, que não são contabilizados na conta de empregos em saúde.

"Retração na oferta de emprego em saúde é uma catástrofe. O emprego em saúde tende a crescer. É um setor com muita inovação tecnológica o que, ao contrário de outras áreas, requer novos empregos, novos profissionais. Esses números podem explicar por que você vai em um posto de saúde e faltam médicos, enfermeiros", afirma a médica e professora da UFRJ Ligia Bahia.

O mercado de trabalho na saúde tem profissionais mais qualificados e maior grau de formalidade, o que contribui para a remuneração no setor ser bem mais alta que a média de todas as atividades. Em 2009, a renda média anual de uma vaga de trabalho em saúde foi de R$ 22.395 (R$ 1.866,25 mensais), enquanto o valor para todos os setores foi de R$ 14.222,04 (R$ 1.185,17 mensais). No total das atividades, há 47% de trabalhadores com carteira assinada. Na área de saúde, a proporção sobe para 71%.

Publicidade