• Carregando...
Concessionária da GM: Brasil manteve resultados positivos, apesar da queda do último ano | Mauricio Lima/AFP
Concessionária da GM: Brasil manteve resultados positivos, apesar da queda do último ano| Foto: Mauricio Lima/AFP

Opinião

A conta da ineficiência

João Paulo Pimentel, editor

Se a General Motors fosse uma pessoa doente, a crise econômica mundial seria a retirada brusca de remédios que camuflavam alguns sintomas. Não se pode negar que a crise e a concordata da GM estão interligadas, mas é equivocado pensar que a primeira é a única responsável pelo estrago.

A indústria automobilística norte-americana em geral está pagando a conta de anos e anos de ineficiência. Enquanto as marcas japonesas e coreanas investiram em tecnologia, modernizaram suas fábricas e lançaram produtos adaptados ao século 21, GM, Chrysler e Ford continuaram colocando nas concessionárias carros grandes, beberrões e poluentes.

E, como se a estratégia de alienar futuros consumidores não bastasse, as gigantes de Detroit mantiveram uma estrutura extremamente cara. Estima-se que seus funcionários ganham três vezes mais que aqueles de montadoras instaladas no Brasil e 80% mais que trabalhadores de Honda e Toyota. Além disso, as empresas ficaram reféns de acordos trabalhistas antigos, por meio dos quais são responsáveis por financiar planos de saúde, aposentadorias e pensões para os operários e suas famílias.

Em tempos de bonança e crescimento, esse sistema arcaico e deficitário era um incômodo, mas compensado pela exuberância dos mercados emergentes, como Brasil, China e Rússia. O estouro da bolha financeira precipitou a insustentabilidade dos negócios.

Na verdade, a Ford foi a única das "três irmãs" que fez um esforço parcial para ajustar sua operação e, por isso, se safou de maiores complicações. A Chrysler, concordatária desde abril, estava em dificuldades desde a primeira crise do petróleo – há mais de 30 anos! – como bem lembra o colega de editoria e colunista da Gazeta do Povo, Franco Iacomini.

Nesse cenário, tinha-se a impressão de que a GM era uma daquelas empresas "grandes demais para quebrar". A turbulência financeira e o estrangulamento do crédito colocaram essa premissa por terra. Por maiores que sejam, companhias que têm dívidas que somam o dobro de seu patrimônio – como é o caso da controladora da Chevrolet – podem muito bem ir ao chão. A única diferença é que, quando elas caem, fazem a terra tremer com mais força – e por muito mais tempo.

  • Veja a situação econômica da General Motors
  • Confira a cronologia das marcas que formaram a GM dos EUA

São Paulo e Nova Iorque - O presidente da General Motors do Brasil, Jaime Ardila, marcou para hoje uma entrevista coletiva na fábrica de São Caetano do Sul (SP) para falar da situação da empresa no país. Uma coisa é tida como certa: A GM local terá de buscar novas formas de financiamento e recorrer mais aos fundos governamentais, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para garantir projetos por aqui. Sem o apoio da matriz norte-americana, que na prática passa a ser uma empresa estatal, os desafios de manutenção da subsidiária serão maiores.

O mesmo deve ocorrer com filiais como a da China e de outras regiões não incluídas na concordata anunciada ontem. "Todas terão de se virar para sobreviver, pois talvez não haverá mais matriz para socorrê-las", disse Paulo Cardamone, responsável no Brasil pelo escritório da consultoria americana CSM Worldwide.

Apesar de nos últimos anos ter mais enviado dividendos do que recebido aportes, a GM brasileira sempre contou com apoio da matriz nos seguidos períodos de prejuízos que registrou antes de 2004, quando passou a ter resultados positivos. "Certamente a partir de agora ela terá menos suporte financeiro", afirma Cardamone.

O analista acredita que, por ter mais afinidades com os produtos desenvolvidos na Europa, pela Opel, a GM do Brasil terá condições de manter acordos com a canadense Magna, que junto com um grupo de investimentos russo será a nova controladora da subsidiária. Ele ressalta que 35% das ações da Opel ainda ficarão sob controle da GM, o que afasta riscos de não fornecimento de plataformas. Hoje, apenas os modelos Celta e Montana foram totalmente desenvolvidos no Brasil. Todos os demais vieram da divisão europeia.

Nos cinco primeiros meses do ano, as vendas da GM no mercado brasileiro caíram 10% em relação ao mesmo período do ano passado, para 211,8 mil unidades. O mercado como um todo cresceu 5,8% no mesmo intervalo. No grupo das quatro maiores montadoras, a Fiat também caiu, mas apenas 0,9% e segue como líder no segmento de automóveis e comerciais leves, enquanto a Volkswagen cresceu 8,2% e a Ford, 17,2%.

Mesmo nocauteada nos EUA, a GM manteve resultados positivos no Brasil no ano passado. O país liderou as vendas do único bloco da companhia a registrar lucro no período. A região, que engloba África, América Latina e Oriente Médio, teve um resultado positivo de US$ 1,3 bilhão, com 1,3 milhão de veículos vendidos.

Há algumas semanas, Ardila disse que a GM do Brasil poderia anunciar um novo investimento no país, de mais de US$ 500 milhões no segundo trimestre.

A GM é a terceira maior fabricante de veículos do país, depois de Fiat e Volkswagen. Possui três fábricas de automóveis – com capacidade para 750 mil veículos ao ano –, uma de motores e uma de componentes, além de um centro tecnológico e campo de provas. A montadora tem ainda dois projetos em andamento, que representam aportes de mais de US$ 2 bilhões para o desenvolvimento de novas famílias de veículos.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]