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A hidrelétrica de Belo Monte, no Pará: um dos maiores empreendimentos do PAC, usina ficou marcada por atrasos na construção e controvérsias por impacto no meio ambiente e em comunidades indígenas.
A hidrelétrica de Belo Monte, no Pará: um dos maiores empreendimentos do PAC, usina ficou marcada por atrasos na construção e controvérsias por impacto no meio ambiente e em comunidades indígenas.| Foto: Divulgação/Norte Energia

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer lançar a nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) até o fim de maio. A informação foi confirmada à Gazeta do Povo pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa.

A ideia inicial era fazer o lançamento por ocasião dos 100 dias de governo ou então no fim de abril, mas o pacote não ficou pronto a tempo. Até poucos dias atrás havia ministério coletando empreendimentos para juntar ao plano.

O programa de investimentos em infraestrutura foi citado genericamente no programa de governo entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições de 2022 e também constava das propostas elencadas na "Carta para o Brasil do Amanhã", espécie de carta de intenções apresentada por Lula a apenas três dias do segundo turno de votação.

Trata-se de mais um antigo programa do PT relançado neste mandato, a exemplo de Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Mais Médicos, Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci).

Em discurso no feriado de 1.º de Maio, o presidente disse que o plano vai ajudar a "trazer de volta a geração do emprego". "Nós estamos convidando empresários estrangeiros para fazerem investimentos no Brasil e estamos mostrando para eles os grandes projetos que nós vamos apresentar no terceiro PAC. Vai ser o maior projeto de obras de infraestrutura deste país", afirmou Lula.

A primeira edição foi lançada por ele em 2007 e a segunda em 2011, no governo de Dilma Rousseff (PT). Além de prever investimentos públicos em centenas de projetos, o PAC também continha medidas de desoneração fiscal e estímulo ao crédito para atrair capital privado. Responsável direta pela primeira edição do programa, quando chefiava a Casa Civil, Dilma era chamada por Lula de "mãe do PAC", e cultivou uma fama de "gerentona" de projetos que depois seria usada para alçá-la candidata a presidente.

A ideia do governo é viabilizar parte das obras do novo PAC por meio de parcerias público-privadas (PPPs). No mês passado, o Ministério da Fazenda apresentou duas medidas para estimular esse tipo de arranjo. Uma delas é a concessão de garantias do Tesouro Nacional para viabilizar parcerias de estados e municípios.

Outra iniciativa é a permissão para emissão de debêntures (títulos de dívida) com isenção de Imposto de Renda para investimentos em PPPs nas áreas de educação, saúde, segurança pública e sistema prisional, parques urbanos e unidades de conservação, equipamentos culturais e esportivos, habitação social e requalificação urbana.

O governo deve criar um conselho gestor para o novo PAC, formado pela Casa Civil e os ministérios da Fazenda, Planejamento e Gestão. A função desse conselho será aprovar ou reprovar a carteira de obras do programas e definir os recursos que serão enviados para cada área do programa, que a princípio serão seis:

  • transportes;
  • energia;
  • infraestrutura urbana;
  • comunicações;
  • equipamentos sociais; e
  • água para todos.

Ministros de Lula ainda estão coletando projetos para compor a carteira do PAC. Na última semana de abril, por exemplo, a Petrobras informou que o Ministério de Minas e Energia solicitou informações sobre projetos da companhia para subsidiar a elaboração do programa.

A estatal disse ter repassado dados de sua carteira de projetos em fase de implantação e também outros que estão em etapa "exploratória" – como a busca por petróleo na Margem Equatorial, tida como um "novo pré-sal" e alvo de controvérsia com o Ministério do Meio Ambiente – ou então em fase de planejamento, como biorrefino. Embora possam compor o novo PAC, todos os projetos listados pela petroleira já estavam previstos em seu plano estratégico para o período 2023-2027, divulgado no fim de novembro, ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL).

O Planalto também consultou governadores sobre projetos prioritários e no mês passado lançou uma plataforma de monitoramento de obras paradas chamada "Mãos À Obra", onde gestores estaduais e municipais podem atualizar a situação de empreendimentos realizados em parceria com o governo federal.

TCU constatou que 21% das obras do PAC foram paralisadas

Lula tem ressaltado em seu discurso a necessidade de retomar obras paradas que diz ter herdado de antecessores. O próprio PAC, porém, deixou para trás um longo rastro de projetos interrompidos.

Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) realizada em 2019 constatou que 2.914 obras do PAC estavam paradas, o equivalente a 21% de todos os contratos fechados desde 2007. Segundo o levantamento, de R$ 663 bilhões inicialmente previstos para serem investidos no PAC, R$ 127 bilhões estavam atrelados a obras paralisadas.

Conforme uma publicação da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), 47% das obras interrompidas pararam por questões técnicas, ou seja, "falhas, erros e omissões dos projetos básicos". Em outros 23%, a interrupção foi causada por abandono da empresa contratada.

A economista Carla Beni, professora de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que as primeiras edições do PAC ficaram marcadas por projetos mal formulados, falhas de gestão, custos elevados e prazos de entrega equivocados. "Tudo gerou um descasamento entre aquilo que foi prometido no início desses programas e a quantidade realizada até o encerramento desses programas", aponta.

Segundo ela, o PAC 1 foi uma etapa de "início de grandes construções" e a segunda edição falhou ao apostar mais em novos projetos do que na conclusão de empreendimentos em andamento. "Aí entra uma crítica a respeito desse modelo, onde o excesso de gasto público pode ter aprofundado o nosso problema fiscal e produzido um processo inflacionário", avalia.

Boa parte dos projetos foi entregue com grande atraso em relação ao prazo inicial. Foi o caso de três grandes hidrelétricas na Amazônia, as usinas de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte. Esta última, além de começar a entregar energia muito depois do prometido, alcançando a plena operação apenas no fim de 2019, também foi envolvida em grande controvérsia por causa dos impactos sobre o meio ambiente e comunidades indígenas.

Além de contar com recursos de fundos de pensão de estatais, convocados pelo governo para ajudar a financiar projetos, o PAC também grande teve participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Cálculo relativo a 2011 mostra que, do total de R$ 327 bilhões em investimentos estimados em uma carteira de 503 projetos até então, o banco estatal tinha financiado cerca de R$ 179 bilhões, ou 55% do total.

Outra marca do PAC foi a tentativa frustrada de viabilizar obras de grande porte. Um exemplo foi o projeto do trem-bala entre São Paulo e Rio de Janeiro, que teoricamente ficaria pronto para os Jogos Olímpicos de 2016, mas acabou abandonado após revisões de custos e leilões vazios.

Também ficaram pelo caminho projetos da Petrobras como a refinaria Premium 1, no Maranhão, que custaria R$ 41 bilhões e tinha a ambição de ser a maior do mundo. Após gastos de R$ 2,1 bilhões, acabou cancelada pela estatal, que a considerou inviável.

O estímulo às PPPs nesta nova edição do PAC pode ajudar a atrair um bom volume de dinheiro privado e poupar despesas federais, diz o advogado e operador de mercado Felipe Sant'Anna, que ministra cursos de finanças. Mas ele tem dúvidas sobre a viabilidade dessa iniciativa em um governo do PT.

"A grande dúvida está justamente no debate interno do governo e da coligação que elegeu Lula, pois o discurso sempre foi de fortalecer o setor estatal, colocando a máquina pública como motor principal do desenvolvimento, sem entregar essa missão ao capital privado", diz.

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